Foto: Reprodução/Iphan-TO
Em meio à vegetação da Serra do Lajeado, a poucos quilômetros do centro de Palmas, no Tocantins, um paredão de arenito de 60 metros de comprimento por 10 de largura guarda vestígios silenciosos, porém eloquentes, da presença humana no território tocantinense há milênios. Conhecido como ‘Abrigo do Jon’, o sítio arqueológico revela um verdadeiro painel de arte rupestre, com pinturas e gravuras que indicam ocupações humanas com mais de 8 mil anos.
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Descoberto entre 2010 e 2012 pelo arqueólogo Lucas Bueno durante prospecções na região, o ‘Abrigo do Jon’ é hoje considerado um dos mais importantes registros pré-históricos do estado. As pinturas, que alcançam até três metros de altura, foram feitas com pigmentos minerais extraídos da própria região, como óxidos de ferro e caulim, e apresentam uma impressionante paleta de vermelhos, pretos, brancos e amarelos.
Segundo o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) no Tocantins, o abrigo sob rocha oferece condições ideais para a preservação desse tipo de manifestação. Com sombra permanente e proteção natural contra a chuva, o local serviu como abrigo para diversos grupos ao longo dos séculos, ou até milênios.
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Pinturas revelam representações
O painel rupestre abriga uma ampla diversidade de figuras: representações humanas e animais, cenas de caça, formas geométricas, sinais espiralados e traços abstratos. Entre os registros mais intrigantes estão as chamadas cúpules, cavidades circulares entalhadas na rocha que, em alguns casos, ainda conservam traços de pigmentação.
Embora seu significado ainda seja debatido, essas formas sugerem usos simbólicos ou rituais, revelando uma complexidade cultural que vai além da simples sobrevivência.
Para estimar a antiguidade das ocupações, pesquisadores se basearam na presença de carvões vegetais encontrados em fogueiras e áreas de preparo alimentar. Esses materiais permitiram a aplicação do método do Carbono-14, que apontou para ocupações humanas com quase 9 mil anos.
Apesar das pinturas não terem sido datadas diretamente, sua sobreposição em diferentes camadas indica que foram produzidas em momentos distintos, desde a Pré-História até épocas mais recentes. Isso sugere uma ocupação longa e multicultural, refletindo transformações culturais, influências externas e mudanças no uso do abrigo ao longo do tempo.

Patrimônio em silêncio
Atualmente, o ‘Abrigo do Jon’ não está aberto à visitação pública. O acesso é restrito a pesquisadores e técnicos autorizados pelo Iphan-TO. A Prefeitura de Palmas já demonstrou interesse em transformar o sítio em um ponto turístico-cultural, mas especialistas alertam que isso só será possível com a implantação de medidas rigorosas de proteção e controle de visitação.
“Preservar o Abrigo do Jon é proteger não apenas vestígios físicos, mas também a memória de povos que habitaram o território muito antes da fundação de Palmas”, ressalta Danilo Curado, superintendente do Iphan-TO. “Essas pinturas são uma forma de escrita simbólica. Elas revelam práticas sociais, crenças e formas de interação com o ambiente. São testemunhos de que esses povos não eram meros sobreviventes, mas criadores de arte e de cultura”.
Para Curado, em tempos de avanço urbano e de degradação ambiental, sítios como o ‘Abrigo do Jon’ são lembretes poderosos da profunda relação entre o ser humano e a paisagem natural. São provas de que a história do Tocantins, e do Brasil, vai muito além da colonização recente, alcançando tempos em que grupos humanos, adaptados ao Cerrado, deixaram nas pedras suas marcas, seus mitos e suas memórias.
A expectativa da comunidade científica é que, com investimento e cuidado, o sítio possa futuramente ser integrado a um roteiro de turismo educativo e de valorização do patrimônio cultural.
“Quando conhecemos essas histórias, passamos a entender que o passado não é distante. Ele está ali, gravado na pedra, esperando para ser lido. E cabe a nós proteger essas páginas da história antes que se apaguem“, disse Curado.
