Foto: Divulgação/ Gavião Kyikatejê
O Gavião Kyikatejê é um marco histórico no futebol brasileiro. Criado dentro de uma aldeia no sudeste do Pará, o clube tornou-se o primeiro time indígena a competir em torneios profissionais reconhecidos pela Confederação Brasileira de Futebol (CBF). Sua trajetória une esporte, cultura e resistência, e simboliza a força de um povo que encontrou nos gramados uma nova forma de expressão e afirmação de identidade.
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A equipe representa o povo Gavião Kyikatejê, pertencente ao tronco linguístico Timbira, que vive na Terra Indígena Mãe Maria, localizada entre os municípios de Bom Jesus do Tocantins e Marabá, no interior do Pará. A ideia de formar o time surgiu como um projeto social, com o objetivo de fortalecer a juventude indígena e criar oportunidades dentro da comunidade.
O clube foi fundado oficialmente em 2009, sob a liderança do cacique e ex-jogador de futebol Pepkrakte Jakukrekaperi, conhecido como “Zeca Gaveão”. O projeto nasceu de forma simples, com jogos amistosos entre os jovens da aldeia, mas rapidamente ganhou força e atenção nacional. Pouco tempo depois, o Gavião Kyikatejê se filiou à Federação Paraense de Futebol (FPF) e começou a disputar competições oficiais.
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Já em 2014, o Gavião Kyikatejê alcançou um feito inédito: participar da primeira divisão do Campeonato Paraense, tornando-se assim o primeiro clube indígena a competir em um torneio profissional estadual. A conquista foi um marco não apenas para o povo Gavião, mas também para todas as comunidades indígenas do Brasil.
A cultura do povo Gavião Kyikatejê dentro e fora de campo
O futebol, no contexto do Gavião Kyikatejê, é mais do que uma prática esportiva: é uma extensão da cultura e da organização comunitária. Antes das partidas, por exemplo, é comum que os jogadores realizem rituais tradicionais, como pinturas corporais e cantos em língua indígena. Esses elementos reafirmam a ligação entre o esporte e as tradições do povo.
O uniforme do clube também carrega símbolos da cultura Gavião. As cores vermelho e preto representam, respectivamente, a força e a resistência. O escudo traz o desenho de um gavião, animal sagrado e símbolo de coragem.
Além disso, os jogos do time são acompanhados por torcedores da aldeia e das comunidades vizinhas, que levam para as arquibancadas maracás e cantos típicos, transformando os estádios em verdadeiros espaços de celebração cultural.
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A presença do Gavião Kyikatejê nos campeonatos também tem um papel educacional. O clube incentiva o estudo e o respeito às tradições, mostrando aos mais jovens que é possível conciliar o esporte com a preservação da identidade indígena. Muitos dos atletas que já vestiram a camisa do time vivem na aldeia e se dividem entre os treinos e as atividades comunitárias, como a caça, o plantio e as assembleias tradicionais.
A direção do Gavião Kyikatejê também adota práticas de gestão inspiradas na coletividade indígena. As decisões importantes são tomadas em conjunto, com participação da comunidade e do cacique. O projeto, além de promover o futebol, estimula o orgulho étnico e reforça o senso de pertencimento dos Kyikatejê.
Desafios e conquistas no futebol profissional
Apesar do simbolismo e da visibilidade, o caminho do Gavião Kyikatejê no futebol profissional não tem sido fácil. O clube enfrenta dificuldades financeiras, desafios logísticos e limitações de infraestrutura. A aldeia Mãe Maria fica a mais de 500 quilômetros de Belém, o que encarece o deslocamento para jogos e compromissos oficiais.
Ainda assim, o Gavião Kyikatejê conquistou respeito dentro do futebol paraense. Entre os anos de 2014 e 2020, o time disputou diversas edições do Campeonato Paraense, enfrentando clubes tradicionais como Remo, Paysandu e Águia de Marabá. Mesmo com orçamentos modestos, conseguiu manter um elenco competitivo e atrair atenção da mídia nacional e internacional.
O clube também se tornou tema de documentários e estudos acadêmicos sobre a relação entre esporte e identidade indígena. Em 2015, o Gavião Kyikatejê foi retratado no curta-metragem “Gavião Kyikatejê Futebol Clube”, que destacou o cotidiano dos jogadores e a importância do projeto para o fortalecimento cultural da aldeia.
Mais do que os resultados em campo, o maior legado do Gavião Kyikatejê é a inspiração. O time mostrou que o futebol pode ser uma ferramenta de integração social, de valorização da diversidade e de reafirmação da presença indígena em espaços onde antes havia pouco reconhecimento.
