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Segunda, 06 Mai 2024

Dois sambaquis são descobertos na região do Salgado, no Pará

Dois sambaquis, até então desconhecidos por expedições arqueológicas realizadas na região do Salgado, zona nordeste do Pará, foram localizados no município de Magalhães Barata, em levantamento arqueológico iniciado no mês de agosto do ano passado, por pesquisadores do Projeto de Pesquisa Avaliação do Patrimônio Arqueológico nas Áreas de Reservas Extrativistas Marinhas da Zona Costeira do Estado do Pará, da Universidade Federal do Pará (UFPA), Campus de Castanhal.

Os Sambaquis São Marcos e Manicorera foram localizados em borda de manguezal, por equipe coordenada pelo arqueólogo Paulo Roberto do Canto Lopes e cocoordenada pelo pesquisador e bolsista produtividade do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) José Guilherme Fernandes, do Programa de Pós-Graduação em Estudos Antrópicos na Amazônia (PPGEAA).

Foto: Reprodução/Acervo da pesquisa

A equipe desenvolve expedições na região do Salgado paraense desde 2018, como parte das atividades do Grupo de Pesquisas Colins – Colaboratório de Interculturalidades, Inclusão de Saberes e Inovação Social, que conta com apoio da Secretaria de Estado de Cultura do Pará (Secult) e do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio).

Grupo já havia identificado 11 possíveis sítios arqueológicos 

Os pesquisadores destacam a importância dos sambaquis para os estudos arqueológicos e de colonização da Amazônia em função das sedimentações que atestam a ancestralidade do território. São importantes registros para a compreensão dos aspectos transformadores no meio ambiente e das relações entre comunidades ao longo da história, desde a chegada de grupos caçadores-coletores à região, ainda no Período Pré-Colonial.

Os registros são dados por meio de construções, como as cavidades encontradas na serra do Piriá, no município de Viseu, e por modificações no uso regular do solo, de que é exemplo a terra preta arqueológica (TPA) ali encontrada, sendo usada na agricultura. Segundo os pesquisadores, a fixação no território e as relações socioculturais dos grupos pré-coloniais foram construídas superando a diversidade dos ecossistemas, o que lhes possibilitou a exploração de bacias hidrográficas, baías, mar costeiro, cerrados, ilhas, campos salinos, campos naturais, entre outros.

Paulo Canto, coordenador da pesquisa, informa que os sambaquis da região do Salgado são formados por "montículos com estratigrafia complexa, constituídos por conchas de moluscos (trituradas, inteiras e fechadas); bolsões de conchas, cinzas, restos de fauna, sepultamentos; lentes de carvão e cinzas; quelíceras de crustáceos; vestígios de vertebrados; lateritas; fragmentos cerâmicos etc". Ele explica que essas construções são: 

"provavelmente, marcadores do território ocupado na região, localizados, na maioria, em borda do mangue, junto ao campo salino e a tabuleiros, tendo um solo que varia entre arenoso, areno-argiloso ou argilo-arenoso".

Entre 2019 e 2021, um levantamento de potencialidades arqueológicas realizado no município de São Caetano de Odivelas identificou 11 potenciais sítios arqueológicos, em áreas insulares, em bordas de manguezais e em terra firme, o que demonstra a enorme antropização do território e a presença de assentamentos humanos desde antes da colonização, há mais de 2 mil anos, pela presença de fragmentos cerâmicos coloniais e pré-coloniais. Este estudo inicial foi publicado em 2020, na Revista Espaço Ameríndio, da UFRGS.

Investimentos

A pesquisa recebe apoio da Prefeitura Municipal de Magalhães Barata, além de recursos do Projeto Procad Amazônia, da Coordenação de Aperfeiçoamento do Pessoal de Nível Superior (Capes), ainda assim faltam recursos financeiros e materiais para maiores inserções de pesquisa em campo. Segundo os coordenadores, "há necessidade de prospecção nos locais, com deslocamento de equipamentos e pessoal, com a presença de maior equipe multidisciplinar, por mais que haja recursos de pessoal no PPGEAA". Entre as demandas, incluem-se a questão da guarda do material coletado em campo, que deve ser acondicionado em reserva técnica adequada aos parâmetros do IPHAN, a instalação de reserva técnica e de laboratórios, além da adequação das salas e da compra de equipamentos.

Conclusões preliminares 

A equipe de pesquisadores da UFPA regressou ao sítio arqueológico de Magalhães Barata em janeiro de 2023. Nesta nova expedição, os pesquisadores chegaram a importantes conclusões, entre as quais, a que desconstrói a noção de que a área onde se localiza o município é de ocupação humana recente. Para o grupo, a ocorrência de antropização do território, ou a ação do ser humano sobre o ambiente, data de 5 mil anos, posto que a presença de sambaqui remonta aos pescadores-coletores. A impressão se confirma pela existência acentuada de toponímias de origem indígena, a exemplo de nomes de cursos d'água da bacia do rio Cuinarana, entre os quais, Igarapé-Açu, Tatapari, Suruteua, Piquiateua e Quaquariquarana. Outras pistas:

- O território do município está inserido em grande rede de movências indígenas entre as etnias que habitaram o litoral do Pará e da Amazônia antes da instalação dos europeus, populações estas que desenvolveram práticas de antropização e instrumentos de navegabilidade que possibilitaram trocas e ocupações dessa região;

- A região é marcada por abundância de águas para colonização e produção agrícola há muitos anos, com farta herança agrícola e cultural de povos ameríndios e originários existentes antes da chegada de colonizadores europeus, o que pode ser notado pela grande presença de materialidades arqueológicas históricas e pré-colombianas, a exemplo de fragmentos de faianças e cerâmicas ameríndias frequentemente encontrados em nível de solo, nos sítios visitados;

- A realidade ambiental e antrópica, levantada em campo, atesta que o território do município tem enorme potencial histórico-cultural e socioambiental para o desenvolvimento local, mas de base sustentável, posto que existe boa distribuição de TPA, provavelmente por acentuada ocupação no passado pré-colombiano. Esta herança autóctone ambiental proporciona boa fertilidade para a região, mas deve haver planejamento de desenvolvimento de economia circular e sustentável a fim de que não haja depredação dessa herança e esgotamento dos recursos naturais.

 *O conteúdo foi originalmente publicado pelo Jornal Beira do Rio/UFPA, edição 167, e escrito por Walter Pinto.

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