Preparem o café: é tempo de pupunha!

Se a Mandioca é a Rainha da Mesa Brasileira, como disse Câmara Cascudo em sua obra clássica “A história da alimentação no Brasil”, a pupunha (Bactris gasipaes) é, com justiça, sua Princesa Consorte.

Esta palmeira, pertencente ao gênero botânico Bactris, é parente de frutos regionais (muitos deles esquecidos) como o tucum (Bactris setosa) e o marajá (Bactris maraja) e há tempos invade nossas mesas, onde geralmente a vemos cozida em água e sal e comida com café preto, num desjejum tipicamente amazônida.

A pupunha é uma palmeira de grande porte, alcançando aproximadamente 3m a 4m de comprimento. Possui entre suas características físicas um caule espinhoso e frutos em cacho. Sua origem, apesar de controvertida, é reconhecidamente amazônida. A pupunheira, atualmente domesticada, é o resultado do cruzamento entre pelo menos duas espécies selvagens, que são endêmicas em nossa região. Cabe destacar que este processo historicamente foi efetivado pelos nativos indígenas, até que tornasse a pupunheira a árvore tão disponível que conhecemos hoje.

Foto: Fernando Sette/Reprodução

Desde o século XVI, há registros históricos, principalmente entre os chamados Viajantes, pesquisadores europeus que vieram para a Amazônia catalogar nossa fauna, flora, patrimônio mineral e costumes, como por exemplo, Henry Norman Bates, que em “Um naturalista no Rio Amazonas”, relata seu reconhecimento destas palmeiras em nossa terra:

“[…]. O sub-bosque, nesta parte da floresta, era formado de plantas mais novas, das mesmas espécies que seus gigantescos vizinhos e de palmeiras de muitas espécies, algumas com vinte a trinta pés de altura, outras pequenas e delicadas, com estipes que não eram mais grossas que um dedo. Estas últimas, várias espécies de Bactris produzem pequenos cachos de frutos negros ou vermelhos, providos, às vezes, de um suco doce, lembrando o da uva.”

Foi também objeto destes registros o consumo de pupunha pelos povos tradicionais da Amazônia. Um deles, surpreendente, é uma bebida chamada caiçuma, feita a partir da mastigação da polpa da pupunha, cuja tecnologia é semelhante ao cauim, feito com mandioca, no qual o agente fermentativo utilizado é uma proteína, chamada ptialina, presente na saliva humana. 

Da pupunha, temos o uso de sua polpa, que domina 82% do fruto. Dela podemos extrair ainda vinho, licores, sorvetes, doces em pasta ou em calda, farinha, etc. Os frutos são ricos em proteínas, carboidratos, minerais (como cálcio, ferro, fósforo, entre outros), vitamina A.

Há um costume familiar presente nas práticas culturais da região, que envolve o caroço da pupunha: quem o comesse ficaria rude, ou seja, burro. Antigamente, crianças eram proibidas de comer a amêndoa presente dentro do caroço. A bem da verdade, apesar de significar apenas 8% do total do fruto e por isso não possuir importância gastronômica, há experiências de extração do óleo da amêndoa da pupunha, reconhecido como de relevante valor nutricional e energético.

Outro produto muito procurado é o palmito pupunha. Sua extração possui um aspecto ambiental significativo: para extrai-lo não é necessário derrubar a palmeira inteira, ao contrário do que acontece com o açaí. Pratos refinados podem ser feitos de maneira simples, utilizando o palmito pupunha. Uma sugestão: basta grelhá-lho na brasa, servindo-o com azeite, sal e chicória picada. É possível encontra-lo também disponível em conserva para saladas. Cabe somente observar o cuidado com a quantidade de sódio presente nestas salmouras industriais. 

A safra da pupunha inicia em novembro e estende-se até junho do ano seguinte. Entre os meses de março e maio, a safra está no clímax.

Por fim, é válido deixar um aviso: ninguém come pupunha sozinho. Isto fere a tradição amazônica da comensalidade. Pupunha, café preto quentinho e pessoas é uma combinação excelente para grandes momentos nesta vida. Aproveite!

PARA SABER MAIS:

https://agazetadoacre.com/a-origem-da-pupunha-domesticada/. Acessado em Abril de 2019.

BATES, Henry Walter. Um naturalista no Rio Amazonas. São Paulo, SP: Editora Itatitaia, 1979

CAVALCANTE, P. B. Frutas comestíveis da Amazônia. 6. ed. Belém, PA: Museu Paraense Emílio Goeldi: CNPq, 1996.

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