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Conheça 9 curiosidades dos escorpiões; a da espécie amazônica surpreende

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Fotos: José Felipe Batista e Denise Cândido

Os escorpiões não são exatamente bonitos. Eles podem até mesmo causar uma certa repulsa, já que muitas espécies representam um perigo à vida humana por serem venenosos. Mas esses animais também precisam ser respeitados: primeiro, porque eles desempenham um papel importante no equilíbrio ecológico como predadores de outros bichos e, segundo, porque são os aracnídeos mais antigos do planeta Terra. Isso mesmo: os escorpiões habitam nossa superfície há mais de 450 milhões de anos.

O Brasil abriga quatro espécies de escorpiões que são consideradas de interesse médico e registram a maior quantidade de acidentes. O escorpião-preto-da-Amazônia (Tityus obscurus), que ocorre na região Norte e no estado do Mato Grosso; o escorpião-amarelo-do-Nordeste (Tityus stigmurus), que também tem aparecido nos estados de São Paulo, Paraná, Santa Catarina e Tocantins; o escorpião-marrom (Tityus bahiensis), frequente nas regiões do Centro-Oeste, Sudeste e Sul; e o escorpião-amarelo (Tityus serrulatus), com ocorrência em todas as regiões do país, mas na região Norte, ainda restrito em Tocantins.

Para além da importância em saúde, os escorpiões – assim como qualquer animal – possuem características interessantes, inusitadas e até mesmo arrepiantes. Mas mais importante do que qualquer curiosidade é entender os hábitos desses aracnídeos, para que você possa não só evitar os mais perigosos, mas também entender os motivos que podem fazê-los se sentirem ameaçados.

A bióloga e assistente técnica de pesquisa científica e tecnológica do Biotério de Artrópodes do Instituto Butantan, Denise Maria Candido, identifica nove curiosidades dos escorpiões que talvez você nem imagine!

Fotos: José Felipe Batista e Denise Cândido

1. Os escorpiões podem ficar fluorescentes

Esses pequenos aracnídeos carregam em sua cutícula substâncias que são chamadas de metabólitos secundários. Por isso, eles parecem fluorescentes sob a luz ultravioleta. Esse tipo de iluminação ajuda os especialistas a fazerem o controle e coleta dos escorpiões, o que precisa acontecer à noite, já que é nesse período que eles saem para caçar.

“Como eles ficam escondidos, é muito difícil achá-los. A luz os deixa brilhantes e nós conseguimos identificar a presença deles no meio de muros e no mato, por exemplo”, explica Denise.

2. Eles picam pela cauda e não pelas pinças

O veneno do escorpião é armazenado no interior do órgão conhecido popularmente como cauda. Na verdade, o nome real dessa parte do corpo é metassoma: ela ajuda a dar equilíbrio ao animal, além de servir como forma de defesa. As pinças, por sua vez, têm outras funções e são usadas para segurar presas, alimentar-se e acasalar.

3 . Soltar a “cauda” para se defender

Os escorpiões do gênero Ananteris, encontrados em todo o Brasil e em regiões das Américas do Sul e Central, têm uma capacidade bem diferente: conseguem se desprender de sua “cauda” para escapar de predadores. Esse fenômeno (que pode ser visto também nos lagartos) é considerado uma automutilação: quando o órgão é destacado do corpo do animal, seu intestino e ânus param de funcionar corretamente e as fezes ficam acumuladas, causando uma intoxicação e, posteriormente, a morte.

“Essa capacidade é vantajosa porque ele consegue fugir de situações de perigo, mas depois o escorpião passa a ter uma vida mais curta”, explica Denise.

Então qual o benefício? Na natureza, a função dos bichos é reproduzir. Se o Ananteris consegue fugir do predador e, no tempo que lhe resta de vida, acasalar, sua meta no mundo terá sido cumprida.

4. Um poderoso sistema sensorial

Apesar de possuírem até 12 olhos, a visão não é o forte dos escorpiões. O grande diferencial desses bichos é seu sistema sensorial: os pelos espalhados por seu corpo levam mensagens sobre o meio ambiente ao sistema nervoso, e os pentes que ficam no ventre são usados para sentir as vibrações, a temperatura e a umidade do ar. O resultado é que se eles notarem um pequeno barulho, fogem imediatamente.

Esses recursos foram sendo desenvolvidos ao longo de milhares e milhares de anos: é justamente por estarem há bastante tempo no planeta e terem sobrevivido a diversas revoluções ecológicas que os escorpiões adquiriram habilidades que os tornaram bastante resistentes – o sistema sensorial é uma dessas habilidades, e considerada bem efetiva pelos biólogos.

Veja no vídeo abaixo a movimentação dos pentes do escorpião, que ficam na parte de baixo do seu corpo:

5. Dança nupcial: um convite para o acasalamento

Algumas espécies, como o escorpião-preto-da-Amazônia (Tityus obscurus) e o escorpião-marrom (Tityus bahiensis), acasalam para se reproduzir. O primeiro passo do romance é a escolha do local adequado, feita pelo macho. Depois, ele sai em busca de uma fêmea disposta a curtir o momento. É preciso encantar a pretendente, porque ela pode se negar e causar uma briga fatal para um deles.

Depois do aceite, o macho “dá as mãos” (na verdade, as pinças) à fêmea e começa a levá-la para o ambiente escolhido. Esses movimentos, antes do ato, são chamados de dança nupcial.

6. Partenogênese, uma forma de reprodução sem acasalamento

É isso mesmo. De acordo com Denise, cerca de 5% das espécies de escorpiões tem a capacidade de ter filhotes sozinhas, sem precisar de um parceiro. Esse tipo de reprodução é chamado de partenogênese, que é o desenvolvimento de embriões sem a necessidade de fecundação de espermatozoides.

“O que chama atenção nas Américas do Sul e Central é que as duas principais espécies do bicho, o escorpião-amarelo-do-Nordeste e o escorpião-amarelo, têm a capacidade de se reproduzir por partenogênese, aumentando a população dos escorpiões no meio ambiente”, diz a bióloga.

7. Assim como as cobras e cigarras, os escorpiões trocam de pele

Com apenas uma semana de vida, os filhotes já trocam de pele. Depois disso, eles trocam mais quatro vezes, até se tornarem adultos. Como eles são animais invertebrados, ou seja, não possuem coluna vertebral para sustentar o corpo, a sustentação é feita pela carapaça externa – e quando ela fica muito pequena para acomodar o animal, precisa ser abandonada.

8. O primeiro lar dos escorpiões são as costas da mãe

Assim que nascem, os pequenos escorpiões sobem logo para as costas da mãe e lá ficam por 15 dias. Esse comportamento acontece por segurança e proteção. A fêmea cuida da ninhada, é verdade, mas ai dos que caírem pelo caminho: eles podem virar comida da própria mãe!

O contrário não acontece: por todo o tempo que ficam em cima da mãe, os filhotes não se alimentam. É que, após nascerem, eles possuem uma espécie de reserva alimentar – como se fosse o vitelo dos mamíferos (material nutritivo contido no óvulo).

Outro aspecto curioso é que, depois dessa quinzena nas costas maternas, cada um segue sua vida solitariamente sem grandes problemas. “Depois da primeira troca de pele, quando já estão formados, eles ficam mais uma semana e então saem para desbravar o mundo”, detalha Denise.

9. Escorpiões cometem suicídio? É mentira!

Não acredite em tudo o que lê na internet. Há relatos de que se o escorpião fica no meio de uma roda de fogo, ele prefere se matar antes de morrer queimado. Mas a história não é bem assim.

“Na realidade, ele sente que tem o perigo, então tenta se defender. O que acontece é que, por vezes, ao se movimentar muito em momentos de estresse, ele mexe a cauda e encaixa o ferrão em seu próprio corpo”, explica Denise.

Mas como qualquer animal peçonhento, o escorpião é imune ao seu próprio veneno. Em uma situação como a da fogueira, ele morreria queimado ao se desidratar.

Atenção

Em caso de acidente com um animal peçonhento, procure o serviço médico mais próximo. Mantenha a calma: não faça torniquetes, não corte e não tente “sugar” o veneno, nem aplique nenhum produto sobre a ferida, pois essas práticas podem piorar o quadro.

*Com informações do Instituto Butantan

Como as hidrelétricas estão acabando com os peixes no Rio Madeira

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Foto: Bruno Kelly

Ao amanhecer, vinte pescadores receberam a informação de que peixes matrinxãs estavam descendo o rio Aripuanã em direção ao Madeira, o maior afluente da Bacia Amazônica. Era a oportunidade de interromper uma semana de pesca improdutiva em Novo Aripuanã, município do sul do Amazonas, para se dividirem em três canoas de madeira e irem para o rio. Deveria ser simples: só esperar o cardume, que nada na superfície, e lançar a rede.

Às 11 horas da manhã, sem sinal dos matrinxãs (Brycon melanopterus), metade dos pescadores desistiu e, na canoa maior, retornaram à cidade. Um pescador observava tudo desde as margens daquele encontro de águas brancas e pretas no Médio Madeira, ao mesmo tempo em que, logo à sua frente, vários botos cor-de-rosa (Inia geoffrensis) e tucuxis (Sotalia fluviatilis) surgiam para respirar enquanto caçavam peixes. “Talvez o cardume nem chegue aqui, porque o rio está muito seco”, diz Raimundo Dias.

No final de abril, a bacia do Madeira estava em transição da estação chuvosa para a vazante. Com o nível da água ainda alto, os peixes se agrupam em cardumes e migram dos lagos, afluentes e igarapés para se alimentar de frutos, sementes e invertebrados terrestres que caem nos igapós e nas várzeas do Madeira.

No entanto, há uma década, mudanças abruptas e frequentes nos níveis dos rios têm desorientado os padrões migratórios. Cientistas e pescadores atribuem esses picos irregulares às usinas hidrelétricas do Madeira, duas grandes unidades instaladas no estado vizinho de Rondônia.

Leia também: Rio Madeira continua batendo mínimas históricas mesmo com chuvas em Rondônia

 Foto: Bruno Kelly

Nascido e criado em Novo Aripuanã, Dias tem 50 anos e sempre viveu da pesca, mas diz ele que manter a atividade tem sido cada vez mais difícil devido à redução das capturas no Madeira, o rio mais diversificado da Amazônia, com 1.406 espécies de peixes catalogadas. “Havia muita fartura, não tinha como não pegar peixe aqui. De 10 anos para cá, a pesca diminuiu. Essa hidrelétrica acabou com a gente”, diz o pescador.

A usina de Santo Antônio, em Porto Velho, entrou em operação em março de 2012 e tem a quinta maior capacidade energética do Brasil, e a de Jirau, instalada 115 quilômetros rio acima, opera desde setembro de 2013; é a quarta maior do país.

De acordo com Dias, as espécies mais afetadas pelas hidrelétricas são as mais consumidas localmente: pacu (Mylossoma), aracu (Leporinus fasciatus), sardinha (Triportheus auritus, T. angulatus), matrinxã (Brycon) e jaraqui (Semaprochilodus insignis, S. taeniurus). Espécies de peixes de alto valor comercializadas para as grandes cidades, como os bagres migratórios dourada (Brachyplatystoma rousseauxii) e piramutaba (B. vaillantii), também desapareceram.

Essa escassez tem impacto não só no comércio, mas também na alimentação dos moradores de Novo Aripuanã. O peixe, principal fonte de proteína da população ribeirinha da Amazônia, encareceu nos mercados e restaurantes. “A gente vendia um punhado de matrinxãs por cinco reais. Agora, custa até 40 reais”, diz Dias.

Vídeo: Reprodução/YouTube – Mongabay Brasil

Um rio imprevisível

Em Humaitá, município na divisa com Rondônia, a produtividade pesqueira é fortemente influenciada pela sazonalidade. Quando o rio seca, muitas espécies vêm do Baixo Amazonas, entram no Madeira pela foz e nadam rio acima até o rio de águas brancas, onde se reproduzem.

No entanto, o pescador José Pessoa, de 58 anos, diz que essa migração foi prejudicada porque o rio perdeu a correnteza após as barragens. “O peixe precisa de corredeiras para fazer a piracema”, explica, referindo-se ao período de reprodução. “Se não encontra no Madeira, ele pega o Amazonas, nada até o Solimões e vai embora. Aqui, a gente acaba não tendo nada.”

A pesca artesanal é também afetada pela crise climática, que intensifica os fenômenos meteorológicos. Em outubro de 2023, o Madeira sofreu a pior seca da história, quando atingiu 1,10 metro de profundidade, influenciado pelo El Niño e pelo aquecimento do Oceano Atlântico Norte. O Madeira baixou quase três metros em 15 dias, em junho de 2024, e Rondônia decretou estado de alerta para a seca.

Na comunidade de Paraisinho, localizada 10 km ao norte de Humaitá, a pesca se tornou ‘quase inexistente’, segundo João Mendonça, presidente da associação de agricultores locais, que também representa os pescadores. A comunidade se sustenta graças à agricultura de várzea, cuja produção é adquirida por programas governamentais de alimentação.

As barragens adotam o modelo a fio d’água, que retém menos água em seu reservatório, mas ainda assim afeta a hidrologia do Madeira. Depois de analisar os dados de descarga de três estações hidrológicas, os cientistas descobriram que “as operações da barragem aumentaram significativamente a variabilidade do fluxo diário e subdiário”.

Os cientistas mediram isso monitorando mudanças repentinas no fluxo do rio — ou eventos de ‘reversão’, as mudanças repentinas de um período de aumento para um período de queda dos níveis, ou vice-versa, em dois dias consecutivos. Esse evento quase dobrou (94%) na estação de Porto Velho, 5 km a jusante da barragem de Santo Antônio. Em Humaitá, a 255 km dessa usina, o aumento foi atenuado (13%), mas ainda significativo, segundo os pesquisadores, que atribuem os números às oscilações na demanda de energia.

O peixe sabe que precisa sair das planícies de inundação, florestas e lagos alagados e nadar até o rio principal quando o nível da água começa a subir diária e gradualmente, diz Doria. “Se essa cheia e seca acontecer, o peixe nem sai do afluente. Ele se perde. Fisiologicamente, há um descontrole.”

Barreiras para a obtenção de peixes saudáveis

Os moradores de Humaitá estavam acostumados com períodos bem definidos para a pesca. “Os peixes que a gente mais esperava na cheia eram o jaraqui e a matrinxã. Na seca, era o pintado, o pacu e o curimatã”, diz Mendonça. “A gente pegava em grande quantidade. Hoje, não dá para contar com isso”.

A dinâmica dos peixes está intimamente ligada à disponibilidade de água na bacia, segundo Marcelo dos Anjos, coordenador do Laboratório de Ictiologia e Ordenamento Pesqueiro do Vale do Rio Madeira, da Universidade Federal do Amazonas (Ufam).

Segundo ele, essa perda de conectividade está ligada a um conjunto de fatores: hidrelétricas, desmatamento, assoreamento dos rios, mineração de ouro, assentamentos e expansão do agronegócio.

Samuel de Moraes, presidente da associação de pescadores de Humaitá, observou que os ribeirinhos do Madeira não podem mais se planejar de acordo com a dinâmica natural do ambiente. 

Além das mudanças na vazão do rio, os peixes também sofrem com a má qualidade da água, que vem caindo no Madeira, de acordo com Adriano Nobre, biólogo da Universidade do Estado do Amazonas (UEA). “As alterações antrópicas [feitas pelo homem] afetam diretamente a qualidade da água”, diz Nobre. “As mudanças no regime hidrológico feitas por hidrelétricas, a presença de mineração, o desmatamento, entre outros fatores, têm influência sobre a manutenção da vida aquática.

Em abril, pesquisadores da UEA começaram a desenvolver o primeiro Índice de Qualidade da Água (IQA) para um rio de águas brancas na Amazônia, para entender a saúde do Madeira. Em março, o grupo lançou o primeiro IQA para a Bacia Amazônica, desenvolvido para rios de águas pretas.

Os investigadores da UEA navegaram quase 800 km no Rio Madeira para avaliar o seu WQI; os resultados ainda não foram divulgados.

Foto: Bruno Kelly

A pesca em crise

No mercado local de Humaitá, Osvaldo de Araújo limpava branquinhas em sua banca enquanto relembrava a época em que pescava no Lago de Três Casas, 45 km rio abaixo. “Era tanto peixe que não dava para aguentar”, diz Araújo, um peixeiro de 63 anos. “A gente pegava qualquer espécie que quisesse.”

Araújo costumava pegar até meia tonelada de peixe em cinco dias em sua canoa, mas diz que hoje um pescador pode levar pelo menos 10 dias para pegar 100 quilos. “Nesse mercado, se não fosse o peixe de viveiro, essas bancas estariam vazias”, diz ele.

Houve uma redução de 39%, de 267 para 163 toneladas, na média anual do desembarque de peixes em Humaitá, segundo estudo da Ufam, comparando os períodos antes (2002-10) e depois (2012-16) das barragens. As espécies mais impactadas foram branquinha (Curimata inornata), pirapitinga (Piaractus brachypomus), tucunaré (Cichia), curimatã (Prochilodus lineatus), jaraqui e pacu. 

“Essas espécies são muito utilizadas na culinária local, principalmente entre os ribeirinhos, e também representam grande parte do esforço de pesca dessa população para o comércio regional”, diz o biólogo Rogério Fonseca, coautor do artigo e coordenador do Laboratório de Interações Fauna e Floresta da Ufam.

No período analisado, os anos mais produtivos ocorreram antes da entrada em operação das hidrelétricas: 2002 (294 toneladas), 2006 (350) e 2011 (407). Já os piores desembarques de peixes aconteceram após as barragens: 2014 (158), 2015 (94) e 2017 (101). “Hoje, não estamos mais chegando a 100 toneladas”, diz Moraes.

A associação de Humaitá tem cerca de 3.700 pescadores. O impacto das barragens “representa uma perda de aproximadamente 1,8 milhão de reais por ano para a atividade pesqueira em Humaitá”, segundo os pesquisadores.

Outro estudo recente concluiu que cinco pontos de pesca tradicionais se tornaram improdutivos. Há também locais com forte declínio nas capturas. No Córrego Beem, antes o mais produtivo, a captura caiu 99%, de 164 toneladas para 1,3. No Lago Três Casas, a redução foi de um terço, de 4,2 para 2,8 toneladas. Os pescadores precisaram buscar lugares mais distantes e passaram a pescar em 25 novos locais, segundo os pesquisadores. Em cada viagem de pesca, os ribeirinhos adquirem combustível, gelo, contratam funcionários e compram alimentos para o tempo no rio. 

Em 2013, mais de 1.500 pescadores de Humaitá entraram na Justiça contra as empresas proprietárias das usinas, com base em estudos que atribuíam às barragens impactos sobre a pesca e o pescado. As ações pediam danos morais e patrimoniais.

No entanto, o juiz de Humaitá considerou que os transtornos aos pescadores começaram durante a construção das usinas, em 2007, e decidiu que as ações estavam prescritas porque o prazo já havia passado. Os pescadores recorreram da sentença, e os processos estão agora no Tribunal de Justiça do Amazonas.

Foto: Bruno Kelly

Uma tradição em risco

Numa tarde de sexta-feira, muitas caixas cheias de jaraquis chegam ao mercado local de Manicoré, um município 355 km a jusante de Humaitá. “Este ano, esperávamos uma produção melhor, mas só agora esse peixe está chegando”, diz Ancelmo de Menezes, um pescador de 59 anos. Antes das barragens, ele conta que costumava capturar peixes em maior quantidade e diversidade. “Era matrinxã, era tudo. Agora, como vocês podem ver, só tem esse peixe aqui.”

“As espécies de peixes mais abundantes ficaram muito escassas”, diz Antônio Veiga, presidente da associação de pescadores de Manicoré. Para ele, o declínio só não foi maior porque Manicoré é cercada por cinco grandes afluentes do Rio Madeira, onde os lagos têm boa produtividade.

Segundo Veiga, que está à frente da associação há 25 anos, não houve nenhuma audiência ou consulta pública sobre as usinas hidrelétricas na região. “Não tínhamos conhecimento de nada de bom ou ruim que ela poderia trazer para o nosso município. Elas foram instaladas em Rondônia, mas o impacto veio para o Amazonas”, diz.

Em Manicoré, os transtornos no rio e nos peixes fizeram com que muitos pescadores desistissem e passassem a exercer outras atividades. Alguns começaram a garimpar ouro no curso principal do Madeira, o que também causa muitos danos ao rio, acrescentou Veiga, mas essa atividade ilegal está diminuindo após batidas da Polícia Federal.

Em setembro de 2023, os agentes destruíram 302 balsas e dragas de garimpo espalhadas entre Manicoré e Autazes. Em maio de 2023, 86 embarcações foram desativadas na região de Humaitá.

Um futuro crítico

No final de junho, os pescadores de Novo Aripuanã ainda estavam surpresos com a ausência de cardumes de matrinxã. “Até agora, eles não desceram”, diz Allan de Barros, presidente da associação de pescadores da cidade. Esse é um exemplo da incerteza da atividade pesqueira causada pelo desequilíbrio do Madeira.

“Consumíamos de 100 a 150 toneladas de peixe por ano no município e exportávamos mais de 500 toneladas para Porto Velho e Manaus”, diz Barros. “Hoje, não pegamos nem o suficiente para atender a demanda da cidade. É um fenômeno fora do normal”.

Em Novo Aripuanã, a piramutaba subia o Madeira até três vezes por ano, mas, desde a instalação das barragens, “nunca mais vimos um cardume em nosso rio”, diz Barros. Ele também observa que as espécies de bagres diminuíram de tamanho: o filhote (Brachyplatystoma filamentosum) chegava a 80 kg e a dourada, a 40 kg, mas hoje não passam, respectivamente, de 10 kg e 6 kg.

Em meio a esse contexto, o número de pescadores ativos na associação caiu quase pela metade. “Os peixes estão longe e a despesa é enorme”, diz Barros. “A cidade não tem fábrica de gelo ou subsídios para diesel e gasolina. Não temos uma câmara fria para armazenar o peixe, assim poderíamos vendê-lo mais barato na baixa temporada. Como o pescador irá tão longe para pegar esse peixe e vendê-lo por um preço justo?”

Os pescadores de Novo Aripuanã ainda não entraram na Justiça para serem reconhecidos como atingidos pelas barragens. Mas Barros diz que a melhor compensação seria um repasse contínuo de recursos, por exemplo, via royalties ou fundo de apoio, para que o município pudesse investir na piscicultura artesanal, a fim de atender às demandas dos cidadãos e ter recursos emergenciais para mitigar eventos extremos.

No encontro dos rios Madeira e Aripuanã, Raimundo Dias diz à Mongabay que a seca histórica de 2023 também contribuiu para o ano de pesca improdutiva na bacia do Madeira. Como resultado, os preços de outros tipos de alimentos também subiram. Com o rio secando rapidamente outra vez, dias espera outra época difícil. “Se continuar secando assim até agosto ou setembro, teremos uma crise muito grande aqui”.

Kevin Damasio e Bruno Kelly juntaram-se à expedição ao Rio Madeira com o apoio da Mongabay e da Ambiental Media.

*O conteúdo foi originalmente publicado pela Mongabay, escrito por Kevin Damasio, com fotos de Bruno Kelly.

Você sabia que o primeiro time indígena de futebol do Brasil é paraense?

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Foto: Magno Barros/Oficial Gaviões Kyikatêjê

Fundado na década de 1980 no estado do Pará, o Futebol Clube Gavião Kyikatêjê foi o primeiro time profissional de futebol registrado entre os indígenas no Brasil. O time representa a etnia Kyikatejê que, na língua Timbira Oriental, significa “povo do rio acima”.

O clube fica localizado no município de Bom Jesus do Tocantins, a pouco mais de 450 quilômetros de Belém, capital do Pará. A iniciativa chamou atenção por sua principal característica: a raiz indígena, com destaque em ser o primeiro time de uma etnia tradicional a disputar a divisão principal de um campeonato profissional estadual no ano de 2014.

Seu ex-treinador, o cacique Jakure Pepkrakte, “Zeca Gavião”, além de ser presidente do time, tornou-se ainda o primeiro indígena a comandar um clube do país. Anteriormente, o grupo era formado totalmente por indígenas e, atualmente, é um time misto.

O Gavião Kyikatêjê chamou tanta atenção por sua diversidade cultural que, em 2017, a Federação Internacional de Futebol (Fifa), entidade máxima do futebol mundial, produziu um documentário sobre a história do clube indígena, como forma de homenagear os indígenas pela iniciativa. Assista AQUI.

Conquistas

O Gavião já participou de quatro temporadas disputando a segunda divisão do Campeonato Paraense. Em 2013 teve o primeiro acesso à elite estadual, tornando-se vice-campeonato. Seguiu por dois anos na Série A do Parazão, até ser rebaixado em 2015.

Voltou para a elite paraense somente em 2020, mas foi rebaixado novamente. O time continua o trabalho de permanecer no cenário do futebol, focado em buscar o acesso à primeira divisão mais uma vez e também ter as categorias sub (-15, -17 e -20) e feminino fortalecidas.

*Com informações da Funai e Globo Esporte

Liderança do povo Manchineri no Acre participa da COP 16 na Colômbia

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Wuriu Manchineri participa da Conferência das Nações Unidas sobre Biodiversidade em Cali na Colômbia. Foto: Wuriu Manchineri/Arquivo pessoal

Vice-diretor da Manxinerune Tsihi Pukte Hajene (Matpha), uma organização civil ligada ao povo Manchineri no Acre, o ativista Wuriu Manchineri, de 28 anos, está desde esta segunda-feira (21) em Cali na Colômbia, para participar da Conferência das Nações Unidas sobre Biodiversidade (COP 16).

Com o tema ‘Paz com a Natureza’, o evento, um dos mais importantes para discussão de questões ambientais, busca discutir e encontrar soluções sustentáveis para o planeta.

Wuriu participa do evento a convite da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab) como representante da Matpha. Se juntando a representantes de mais de 190 países e membros da sociedade civil organizada.

Segundo Wuriu, as COP’s só eram abertas para a população indígena como ouvintes e agora é possível ter voz nesses espaços e fazer parte da discussão. Ele ressalta ainda os apoios da Coiab, Greenpeace e Hivos, organização de cooperação internacional que presta apoio a organizações da sociedade civil, para ter voz nesses eventos.

“Segunda-feira eu participei de uma mesa que fala sobre a importância da biodiversidade, no caso como a demarcação dos territórios indígenas afeta diretamente a conservação da biodiversidade”, comentou ele.

Ele diz ainda que quer usar seu tempo no evento para reafirmar a necessidade das políticas indígenas de garantia de direitos e políticas coerentes para o cuidado da vida, segurança jurídica dos territórios indígenas e estratégias eficazes para políticas locais, nacionais e internacionais de combate às crises de biodiversidade e climática.

Quem é Wuriu Manchineri?

Além de vice-presidente de sua organização, o ativista indígena estuda Ciências Econômicas pela Universidade Federal do Acre (Ufac) e direito na União Educacional do Norte. É conselheiro no Conselho Nacional de Política Indigenista (CNPI) e bolsista pelo Programa de Educação Tutorial (PET) – Conexões de Saberes Comunidades Indígenas.

De acordo com a Matpha, desde 2007 o movimento Indígena luta contra o PL do Marco Temporal, que afeta diretamente o direito ao território dos povos indígenas, garantido no artigo 231 da Constituição Federal. O Projeto de Lei foi aprovado pela Câmara Federal, porém, a tese foi rejeitada pelo Supremo Tribunal Federal (STF). O movimento indígena segue lutando para impedir que a medida seja implementada no Brasil.

Povo Manchineri

O Povo Manchineri tem a maior concentração aldeada no município de Assis Brasil, nas Terras Indígenas do Riozinho do Iaco e Mamoadate (Assis Brasil e Sena Madureira). Também há Manchineris de contexto urbano que se concentram em Rio Branco.

Elcio Manchineri, pai de Wuriu, cresceu em contexto de aldeia Mamoadate e depois veio para o contexto urbano. Hoje ele é o coordenador da COIAB.

COP 16

Durante o evento, o Brasil terá papel importante nas discussões sobre a implementação do Marco Global de Biodiversidade Kunming-Montreal (GBF, na sigla em inglês), adotado na última COP 15, no Canadá, reforçando sua posição como um dos países mais ricos em biodiversidade e com agenda ambiciosa voltada para o desenvolvimento sustentável e a proteção ambiental.

Foram definidas 23 metas para 2030 que objetivam deter e reverter a perda de biodiversidade para colocar a natureza em um caminho de recuperação para o benefício das pessoas e do planeta, conservando e usando de forma sustentável a biodiversidade e garantindo a distribuição justa e equitativa dos benefícios do uso de recursos genéticos.

O GBF inclui medidas específicas, incluindo a colocação de 30% do planeta e 30% dos ecossistemas degradados sob proteção até 2030. Ele também contém propostas para aumentar o financiamento aos países em desenvolvimento – um dos principais pontos de controvérsia durante as discussões.

*Por Hellen Monteiro, da Rede Amazônica AC

Como cura de Yanomami atacado por onça contribuiu para canonização de padre em Roraima

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Missionária Felicita Muthoni, com Sorino Yanomami, recuperado após ataque de onça em 1996. Foto: Reprodução/Diocese de Roraima

O que era para ser uma caçada comum na região do Catrimani, na Terra Yanomami, em fevereiro de 1996, ficou marcada na vida de Sorino Yanomami, então com cerca de 40 anos. Ele foi atacado por uma onça, que lhe arrancou parte da cabeça. Desacreditado pela equipe médica, sobreviveu após ser cuidado por missionárias, que pediram sua recuperação em orações ao padre José Allamano.

Sorino, hoje com cerca de 68 anos (o povo Yanomami não costuma contar idades e anos), vive sem sequelas do ataque e a recuperação foi reconhecida pela Igreja Católica como um milagre atribuído ao padre.

O padre Allamano foi canonizado pelo Papa Francisco no dia 20 de outubro por conta do reconhecimento deste milagre. Ele é fundador da congregação dos Missionários da Consolata, grupo que socorreu o indígena e o transportou para o Hospital de Boa Vista.

Ataque da onça

De acordo com a Diocese de Roraima, Sorino caçava na floresta quando se deparou com uma onça que estava com filhotes. O ataque aconteceu por trás, arrancou o couro cabeludo e abriu o crânio do indígena expondo “grande parte do cérebro”, segundo testemunhas.

O grupo de caçadores Yanomami tentou socorrê-lo e, devido à gravidade dos ferimentos, pediu ajuda às religiosas que viviam nas proximidades. Sorino foi socorrido pelas enfermeiras Felicita Muthoni, de origem do Quênia, Maria Silva e Rosáuria, que faziam parte da congregação de Missionários da Consolata, onde eram conhecidas como Irmãs Missionárias da Consolata.

Felicita notou que Sorino estava com parte da massa cerebral fora da cabeça – desprendida do restante. Ela chegou a lavar a parte que estava para fora e empurrou para dentro da cabeça novamente e enrolou com uma camisa.

Após os primeiros socorros, as enfermeiras ligaram solicitando ajuda e pedindo para levar o indígena ao hospital em Boa Vista, mas a Terra Yanomami é um local que só pode ser acessado de avião. O veículo foi enviado na tarde daquele dia.

Já em Boa Vista, o indígena foi atendido pela equipe médica, que chegou a avaliar não haver chances de sobrevivência sem graves sequelas devido ao dano no cérebro causado pelo ataque. Até disseram, segundo testemunhas, que a morte do paciente era iminente.

Sorino Yanomami, hoje com cerca de 68 anos, acompanhado de missionárias da Consolata em Boa Vista. Foto: Divulgação/Diocese de Roraima

De acordo com a diocese, em meio ao desespero, as missionárias pediram a intercessão de José Allamano por meio de preces e orações, acreditando que “apenas um milagre poderia proporcionar esperança”.

Sorino vive sem sequelas na comunidade Catrimani. Ele recebe até hoje visita das missionárias da Consolata que o ajudaram, principalmente de Maria Silva, que ainda atua na missão dentro da Terra Yanomami.

Para o médico neurocirurgião Mario Santacruz, que atendeu Sorino, não há explicação científica para esta recuperação do indígena.

“Considerando a perda da substância cerebral, ele teria um déficit muito grande com danos motores, paralisia e problemas intelectuais. Fizemos todos os exames e constatamos que ele voltou ao normal, sem sequelas”, disse o médico Mario Santacruz.

Canonização de José Allamano

O papa Francisco proclamou 14 novos santos no dia 20 de outubro, durante a Missa na Praça de São Pedro. Entre eles, está o italiano José Allamano. Nascido em 21 de janeiro de 1851 em Castelnuovo D’Asti, Itália, foi um notável sacerdote católico que dedicou a vida ao serviço religioso e à expansão do trabalho missionário.

Allamano era reconhecido pelo trabalho missionário e fundou o Instituto Missões Consolata dos padres e irmãos em 1900, seguido pelo Instituto das Irmãs Missionárias da Consolata em 1910. Essas iniciativas expandiram o trabalho para várias regiões africanas e outros países ao redor do mundo – como o território Yanomami. Allamano morreu em fevereiro de 1926.

Na apresentação da canonização de José Allamano no dia 19, na sala de imprensa do Vaticano, também estava presente Júlio Ye’kwana, presidente da Associação Wanasseduume Ye’kwana (Seduunme) e líder indígena do território Yanomami em Roraima.

Imagem do padre José Allamano, canonizado pela igreja católica. Foto: Divulgação/Diocese de Roraima

Missão na Terra Yanomami

A Missão Catrimani com os missionários de Consolata na Terra Yanomami, que leva o nome do rio brasileiro ao oeste do estado de Roraima, foi criada pelo Concílio Vaticano II durante a década de 1960.

O bispo de Roraima e presidente da rede Eclesial Pan-Amazônica, dom Evaristo Spengler — que está em Roma para acompanhar a canonização de Allamano — destacou a importância da missão na crise sanitária vivida pelos Yanomami causada pela invasão do garimpo ilegal.

“Especificamente na Terra Yanomami, a missão não é de anúncio explícito do evangelho. Foi criada para o diálogo, valorização da cultura e do respeito à forma religiosa que o povo indígena vive, sem fazer proselitismo”, afirmou.

Crise Yanomami sem precedentes

Com 9,6 milhões de hectares, a Terra Yanomami é o maior território indígena do Brasil em extensão territorial e enfrenta uma crise de saúde devido ao avanço do garimpo ilegal, com casos graves de indígenas com malária e desnutrição severa.

A Terra Yanomami está em emergência de saúde desde janeiro de 2023, quando o governo federal começou a criar ações para atender os indígenas, como o envio de profissionais de saúde e cestas básicas. Além de enviar forças de segurança a região para frear a atuação de garimpeiros.

Apesar das atividades de combate ao garimpo na região deflagradas em fevereiro de 2023, os invasores continuam em atividade. O Ministério dos Povos Indígenas estimou em março deste ano que 7 mil garimpeiros permanecem na região.

*Por Caíque Rodrigues, da Rede Amazônica RR

COP da Biodiversidade: entenda papel do evento que acontece na Colômbia em 2024

Abertura da plenária da COP16 da Biodiversidade, em Cali, na Colômbia. Foto: Divulgação/ONU Biodiversidade

A 16ª edição da Conferência das Partes da Convenção das Nações Unidas sobre Diversidade Biológica (COP-16) começou nesta segunda-feira (21) em Cali, na Colômbia. O encontro ocorre até o dia 1ª de novembro e traz como tema ‘Paz com a Natureza’.

É a primeira COP da Biodiversidade após a estruturação do Marco Global de Kunming-Montreal (GBF – Global Biodiversity Framework, em inglês), assinado por 196 países em dezembro de 2022, durante o último encontro liderado pelos chineses e ocorrido no Canadá. O documento reúne 23 metas globais a serem alcançadas até 2030 em busca da regeneração de todo o conjunto de vida na Terra.

Brasil

Nesta edição, são esperados debates sobre o alinhamento da Estratégia e Plano de Ação Nacional para a Biodiversidade (NBSAP – National Biodiversity Strategies and Action Plans, em inglês) pelos países ao GBF. A versão brasileira foi elaborada para o período de 2010 a 2020, publicada em 2017, e tratava das Metas de Aichi, aprovadas na COP-10, no Japão.

Segundo a secretária nacional de Biodiversidade do Ministério do Meio Ambiente, Rita Mesquita, embora as discussões sobre a atualização das EPANB no Brasil ainda não tenham sido esgotadas, a proposta está bastante avançada e as políticas públicas adotadas pelo governo federal já estão alinhadas ao compromisso internacional assumido pelo Brasil.

“Nesta COP-16, nós estamos levando uma série de iniciativas que a gente espera poder divulgar e a partir delas construir intercâmbios, interações, parcerias e inclusive novos entendimentos. E que esses entendimentos bebam da nossa experiência”, diz.

Segundo Rita, é o caso do Plano Nacional de Recuperação da Vegetação Nativa, parte central do Plano Clima, que por sua vez agrega ações para biodiversidade e de enfrentamento à mudança climática, em um movimento que tem sido defendido globalmente pelo Brasil.

De acordo com o secretário de Clima, Energia e Meio Ambiente do Ministério das Relações Exteriores, embaixador André Corrêa do Lago, já há uma movimentação internacional para que o Brasil lidere a união dos dois temas nos debates globais e que isso ocorra em 2025 na COP-30, em Belém, no Pará.

Financiamento

Assim como na COP-29, que debaterá o clima em novembro no Azerbaijão, o tema de financiamento também deverá ter destaque em Cali. O próprio Marco Global de Kunming-Montreal já prevê o valor de US$200 bilhões anuais para financiar os esforços globais de conservação da biodiversidade.

Há metas anuais estabelecidas, dentro desse valor total, que seriam a parte obrigatória de financiamento dos países desenvolvidos aos países em desenvolvimento, mas o relatório da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) aponta que apenas 23% dessas metas foram cumpridas no primeiro semestre deste ano, por exemplo.

Para diretora do Departamento de Meio Ambiente, Ministra Maria Angelica Ikeda, além do cumprimento das metas também será necessário um debate sobre a transparência na aplicação desses financiamentos. “Existem outros cálculos que estão sendo feitos por organizações, inclusive da sociedade civil, porque há uma percepção de que pode haver o que a gente chama de contabilidade dupla, que o que está sendo contabilizado pelo OCDE, na verdade, são outros projetos que acabam beneficiando também a biodiversidade, mas na verdade são projetos para clima ou para desenvolvimento social”, explica.

Fundo

O Brasil também deve participar da discussão sobre a eficiência do Fundo do Marco Global para a Biodiversidade (Global Biodiversity Framework Fund – GBFF, em inglês), gerido pelo Fundo Global para o Meio Ambiente (Global Environment Facility – GEF, em inglês), como forma de financiamento. De acordo com Maria Angélica, no primeiro semestre deste ano foram repassados apenas 1% do que estava previsto.

“Nós estamos abertos, na verdade, com uma visão um pouco até mais moderna sobre o financiamento ambiental. Aceitamos financiamento de diversas fontes e estamos muito engajados nesse diálogo, mas o que nós gostaríamos de ver é uma liderança maior dos países desenvolvidos”, destaca.

Recursos genéticos

A criação de um mecanismo multilateral que reúna os sequenciamentos genéticos de forma digital garantindo uma justa distribuição dos benefícios gerados em suas patentes, conforme o previsto na Convenção sobre Diversidade Biológica é outro debate em que o Brasil estará presente, segundo a diretora do Ministério das Relações Exteriores.

“A ideia é que ele [o mecanismo] também seja munido de um fundo, que os usuários de todos aqueles códigos genéticos, que estão espalhados em vários bancos de dados no mundo e que não se sabe nem a origem de uma grande parte deles, que o uso desses códigos, quando gerem benefícios, eles entram em um fundo que beneficiará também os países em desenvolvimento, os países megadiversos”, conclui.

*Com informações da Agência Brasil

Estudo aponta que espécies de vespas são maiores à medida que hábitats se aproximam do Equador

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Variação no tamanho corporal das vespas do gênero Polistes analisadas no estudo. Cada indivíduo na foto representa uma espécie distinta. Foto: Alexandre Somavilla

Um grupo brasileiro de pesquisadores conseguiu demonstrar a relação da latitude e de variáveis ecológicas no tamanho corporal das vespas. A conclusão é que, quanto mais próximo o hábitat do Equador, maiores são as espécies do gênero Polistes. Amplamente distribuído no mundo, o gênero serve como um modelo para analisar padrões mais gerais das vespas.

O resultado, publicado no Biological Journal of the Linnean Society, refuta para esses insetos uma teoria do século 19, segundo a qual os maiores animais estariam nas latitudes mais altas, ou regiões mais frias do planeta.

Os pesquisadores concluíram que espécies de locais mais próximos do Equador, portanto, com maiores temperaturas e menor sazonalidade, tendem a ser maiores do que as que estão em altas latitudes, ou seja, mais próximas do hemisfério Norte e mais frias. É o oposto do que diz a chamada regra de Bergmann.

Postulada em 1847 por Carl Bergmann, a hipótese prevê organismos maiores em altas latitudes ou climas mais frios. Isso se daria porque indivíduos com maior tamanho corporal teriam uma menor razão entre a área de superfície e o volume do corpo, o que reduziria a perda de calor. Portanto, um corpo maior seria uma vantagem quando em baixas temperaturas.

O estudo publicado agora, porém, chegou a um resultado oposto, se adequando ao que já havia sido postulado como o oposto da regra de Bergmann. Formulado no século 20 por autores que analisaram animais ectotérmicos, que dependem da temperatura do ambiente para regularem o calor do próprio corpo, o raciocínio define que seriam os animais menores que estariam mais ao norte, em climas frios e com baixa sazonalidade.

Enquanto nas regiões temperadas a estação favorável para as vespas dura de três a quatro meses, nas tropicais esse período tem cerca de nove meses. Por isso, na região haveria mais tempo para se alimentar e, portanto, crescer.

Coleções

Os pesquisadores tomaram as medidas de 429 exemplares de vespas em bom estado de conservação, pertencentes a 39 espécies que ocorrem do Canadá à Argentina, portanto, representando as Américas como um todo.

Os exemplares foram enviados ao Brasil de coleções presentes em diversos países ou analisados nas próprias instituições em que estão depositadas no exterior. Foram 37 espécies representadas por indivíduos fêmeas e 28 dessas espécies também representadas por indivíduos machos (em duas, só havia representantes machos, totalizando as 39 espécies investigadas). Os dados foram analisados por ferramentas estatísticas que mostraram uma relação direta entre latitude e tamanho do corpo.

A escolha das espécies americanas do gênero Polistes se deu por conta da bem resolvida filogenia do grupo nessa região. Isso significa que, no continente, todas descendem de um mesmo ancestral, algo que ainda não é sabido para outras regiões. Além disso, nas Américas se encontra a maior diversidade do gênero, com cerca de 90 espécies. Assim, foi possível ter uma amostra significativa para postular que o tamanho corporal é definido pelas condições ecológicas.

Em um trabalho anterior, Souza e outro grupo de colaboradores já haviam demonstrado que a regulação térmica não é o fator principal para determinar o tamanho, como a Regra de Bergmann postula, no caso das vespas.

Nesses animais, a latitude é determinante para definir a cor, já que espécies mais escuras estão presentes em áreas mais frias, provavelmente porque o tom ajuda a aquecer mais rápido o corpo do que cores mais claras.

Além disso, completa, os estudos mostram a importância da preservação das coleções entomológicas, que podem fornecer material para o estudo contínuo das espécies e das relações entre elas.

O trabalho tem ainda entre os autores pesquisadores das universidades federais do Triângulo Mineiro (UFTM) e de Viçosa (UFV), além do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa).

O artigo Interspecific variation in paper wasp body size supports the converse Bergmann’s rule pode ser lido em: https://academic.oup.com/biolinnean/advance-article-abstract/doi/10.1093/biolinnean/blae074/7738264.

*O conteúdo foi originalmente publicado pela Agência Fapesp, escrito por André Julião

Contagem de pirarucu em Santa Maria do Tapará, no Pará, revela impacto da seca na região

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Foto: Luan Robson/Sapopema

Manejadores da comunidade Santa Maria do Tapará, no Pará, e a Sapopema realizaram no dia 8 de outubro a contagem anual de pirarucus na região. A atividade, que é fundamental para o monitoramento e conservação da espécie, evidenciou a seca que está assolando a área este ano.

Considerada uma das piores dos últimos anos, a estiagem severa tem dificultado a vida das comunidades ribeirinhas e impactado diretamente a fauna aquática. Durante a contagem, os manejadores tiveram muita dificuldade para chegar ao lago, que ficou mais distante.

A contagem é uma ferramenta fundamental para avaliar as condições ambientais e adaptar as estratégias de manejo. Todos os anos, durante o período de águas baixas, os pescadores realizam contagens de pirarucus para avaliar os estoques pesqueiros e calcular a cota de captura de 30% a partir do resultado das contagens de pirarucus adultos, preservando os 70% restantes, como forma de assegurar a reprodução para fins de manutenção do seu estoque de forma sustentável. Os números servem também para indicar avanços da conservação e apontar estratégias para promover a renda dos pescadores.

Foto: Luan Robson/Sapopema

Os procedimentos utilizados para contagem de pirarucus seguem o método de Castello (2004), onde os pescadores demonstram sua habilidade de contar quando observam e escutam a boiada do pirarucu no momento em que ele vem à superfície da água realizar a sua respiração aérea.

Segundo a bióloga da Sapopema, Poliane Batista, cada pescador conta quantos pirarucus observou em uma unidade de área durante um intervalo de 20 minutos. Somente pirarucus maiores de 1 metro são contados, sendo classificados em duas categorias: juvenis (bodecos) (1-1,5 m) e adultos (>1,5 m). Os pescadores devem fazer as contagens de forma silenciosa para assegurar a acurácia das contagens e evitar que o comportamento do pirarucu seja alterado.

Nas comunidades que desenvolvem o manejo, além do cumprimento das regras de tamanho mínimo captura (1,5m) e período de defeso (IN 34/2004) estabelecidas pelo – IBAMA, os pescadores definem em seus territórios acordos de pesca que normatizam as regras válidas que restringem ainda mais o uso do recurso. Baseados nesses acordos, eles realizam vigilância dos ambientes aquáticos contra a ação de invasores.

O esforço dos comunitários para o manejo sustentável compreende diversas etapas, como a organização comunitária, respeito à legislação e estabelecimento de acordos de pesca, vigilância dos lagos, contagens, pesca sustentável e comercialização da produção. A iniciativa exige uma dedicação enorme, e muitas vezes o pescador não é devidamente valorizado.

Foto: Luan Robson/Sapopema

Feira do Pirarucu de Manejo do Pará

Em novembro, manejadores de Costa do Tapará, Santa Maria e Igarapé da Praia promoverão a 5ª edição da Feira do Pirarucu de manejo do Pará. Agora como patrimônio histórico, cultural e imaterial de Santarém, o evento deste ano será em 09 de novembro na Praça São Sebastião. Uma realização do Conselho Regional Tapará, Sapopema, Colônia de Pescadores Z-20, Mopebam, Sedap, Semap, Sebrae, e apoio da TNC.

*Com informações da Sapopema

Castanha do Brasil produzida pelos povos Mẽbêngôkre-Kayapó é exportada para a Inglaterra

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Foto: Reprodução/Cooba-y

Castanha do Brasil produzida pelos povos Mẽbêngôkre-Kayapó é exportada para a Inglaterra com apoio da Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (ApexBrasil). O manejo da oleaginosa é feito por cerca de 600 famílias indígenas da região da Bacia do Rio Xingu, que são associadas à Cooperativa Kayapó de Produtos da Floresta (COOBA-Y), cuja sede está localizada no município de Tucumã (PA).

O assessor técnico da COOBA-Y, Adriano Jerozolimski, conta que a cooperativa foi criada em 2012 com objetivo de fortalecer as cadeias produtivas voltadas para geração de renda e subsistência.

A produção gira em torno de 300 toneladas/ano de castanha in natura (com casca) e 33 toneladas/ano de castanha beneficiada (sem casca). Mas, segundo o assessor técnico, a cadeia dessa oleaginosa depende muito do desempenho da safra, por isso, a receita anual pode variar de R$ 200 mil a R$ 1 milhão gerados para os coletores de castanha do Brasil.

Outras duas cadeias produtivas da COOBA-Y são o cumaru e o artesanato tradicional indígena. 

Já o artesanato, por não ser sazonal, permite que as comunidades tenham renda ao longo de todo o ano. “A cooperativa tem conseguido proporcionar uma renda para as comunidades de cerca de R$ 150 mil. Talvez esse ano a gente tenha uma renda maior, mais próxima de R$ 200 mil, com um conjunto de produtos que vão desde produtos tradicionais, com materiais da floresta, até produtos que já passaram a ser tradicionais, mas que são feitos com matérias-primas de fora, com muita miçanga”, detalha.

Da Amazônia para o mundo

No ano passado, a COOBA-Y realizou a primeira exportação de seis toneladas de castanha do Brasil beneficiada para a Inglaterra e, este ano, outro contêiner com mais seis toneladas já está a caminho pelo Oceano Atlântico. Segundo Adriano Jerozolimski, o apoio da Apex tem sido fundamental para alcançar o mercado externo.

Além disso, em junho deste ano, a COOBA-Y participou da 12ª edição do LAC Flavors, um fórum de negócios de alimentos e bebidas realizado em parceria com a ApexBrasil. O evento proporcionou o encontro com compradores internacionais, workshops e seminários sobre sustentabilidade, tecnologia alimentar, certificações e técnicas de negociação.

Como resultado, hoje a COOBA-Y participa da Mesa Executiva de Exportação da Castanha do Brasil. O agrônomo da cooperativa Mattheus Costa detalha as vantagens dessa iniciativa.

Essas ações já resultaram em tratativas para a COOBA-Y expandir a exportação da castanha do Brasil para a França e alcançar ainda mais o mercado europeu.

*Com informações do Brasil 61

Silvero Pereira, estrela do filme ‘Maníaco do Parque’, visita pontos turísticos famosos no Amazonas

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Foto: Reprodução/Instagram – @silveropereira

O ator cearense Silvero Pereira, que se tornou conhecido por seus trabalhos no cinema e televisão e, recentemente, estrela o filme ‘Maníaco do parque’, baseado em fatos reais, é um dos que agora fazem parte do grupo que viveu uma verdadeira imersão pela cultura amazônica durante visita em Manaus (AM).

Vencedor de prêmios como ‘Grande Otelo’ e ‘Prêmio Guarani’, o ator esteve no último fim de semana na cidade e foi conferir até do show de Ludmilla.

Silvero destacou a visita aos botos, Paricatuba e também à aldeia Cipia.