O peixe é capaz de atingir uma voltagem de até 860 volts. Em conjunto, o ataque do poraquê pode alcançar até 8600 volts
A bacia amazônica concentra a maior diversidade de peixes de água doce do mundo. Até agora 3 mil espécies foram encontradas, cerca de 15% do total conhecido pela ciência sobre o hábitat de água doce em todo o mundo.
Dentre as espécies, existe o Poraquê (Electrophorus electricus), o peixe-elétrico da Amazônia. Também popularmente conhecido como enguia-elétrica e treme-treme, o poraquê possui um corpo alongado e cilíndrico, podendo chegar a mais de 2,5 metros de comprimento, sendo o único peixe-elétrico capaz de gerar voltagens acima de 500 volts.
Um estudo publicado em 2019, revelou que existem ao menos 3 espécies de poraquês catalogadas. Em uma dessas novas espécies encontradas, a voltagem do animal pode chegar a 860 volts, considerado o animal mais elétrico do mundo, entrando no Guiness Book, anteriormente o recorde era de 650 volts.
Essa espécie foi batizada de Electrophorus voltai em homenagem ao físico Alessandro Volta, criador da bateria elétrica. Essa espécie ocupa o chamado Escudo Brasileiro, no sul do Pará, Amazonas, Rondônia e norte do Mato Grosso, enquanto que a espécie mais antiga catalogada, a Electrophorus electricus, se restringe ao extremo norte amazônico, na região do Escudo da Guiana, que abrange o norte dos estados do Amapá, Amazonas e Roraima, além da Guiana Francesa e Suriname.
Mas afinal, como esses seres são capazes de produzir eletricidade? Esses peixes possuem 3 órgãos elétricos, que quando são necessários, seja para defesa ou caça, ele consegue descarregar os 3 órgãos ao mesmo tempo, e com isso, a voltagem que ele produz é capaz de paralisar a presa ou o predador.
O Poraquê pode ser comparado a uma pilha, já que a parte da frente de seu corpo tem carga positiva, enquanto a ponta de sua cauda é de carga negativa. Por isso, se uma pessoa pegar na cabeça e na extremidade final de seu corpo ao mesmo tempo, o choque terá o poder de “fritar” a vítima em questão de segundos.
Ele possui um comportamento de caça raro de ser encontrado em peixes, além de descarregarem uma alta voltagem, eles desenvolvem uma tática chamada de predação social. Os pesquisadores do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa), em Manaus, e da Smithsonian Institution, nos Estados Unidos, descreveram o comportamento em um lago da Estação Ecológica Terra do Meio, no Pará. Apesar de conhecidos por caçar solitariamente à noite, um grupo de cerca de 100 poraquês da espécie Electrophorus voltai, cada um com até 1,8 metro de comprimento, foi filmado caçando em grupo.
Ao amanhecer e no pôr do sol, os poraquês migram para uma parte mais rasa do lago, cercam cardumes de pequenos peixes, conhecidos como piabas ou lambaris, e emitem fortes descargas elétricas. As presas saltam para fora e são devoradas quando voltam atordoadas para a água.
Na maior parte do dia (entre 7h30 e 17h), e durante toda a noite (19h30 às 5h), os animais repousam na parte mais funda do lago (3 a 4 metros de profundidade). No alvorecer e no crepúsculo, porém, eles migram para uma área mais rasa, com menos de um metro de profundidade. Nesses horários, as piabas estão indo para o leito se alimentar ou voltando para a margem para descansar. É o momento em que os poraquês atacam, nadando em círculos em volta de um cardume, concentrando o maior número possível de piabas. Aos poucos, pequenos subgrupos de dois a 10 indivíduos separam parte do cardume e conduz as presas para a margem. Então, um ou mais poraquês desse subgrupo dispara uma forte descarga elétrica, fazendo com que as piabas saltem, atordoadas pelo choque. Os peixes-elétricos então abrem a boca e engolem o máximo de presas que conseguem. Outras espécies de peixes carnívoros, como o tucunaré (Cichla melaniae), podem se aproveitar das presas atordoadas. Após cinco a sete ataques em uma hora, o grupo inteiro retorna para o fundo do lago.
O pesquisador Douglas Bastos, observou o fenômeno pela primeira vez em 2012, quando registrou com uma câmera pela primeira vez. Após 2 anos, ele conseguiu retornar ao local e filmar o grupo em diversos momentos ao longo de 72 horas.
“Disparados simultaneamente por 10 indivíduos, em teoria esses choques podem gerar uma descarga de 8.600 volts!”, diz de Santana.
Se o peixe-elétrico produzisse descargas elétricas contínuas, o gasto energético seria enorme. Por isso ele economiza energia através de pulsos elétricos de baixa voltagem. Esses pulsos servem para enxergar no escuro. É por meio das ondas elétricas que o Poraquê se localiza e encontra suas presas, da mesma forma que os morcegos utilizam as ondas sonoras para a sua orientação. Enquanto as eletroplacas emitem ondas elétricas para o meio ambiente, os eletro-receptores presentes na pele do peixe-elétrico recebem de volta. Essas terminações nervosas levam a informação elétrica ao cérebro do peixe, que indica a localização de tudo que está ao seu redor.
Embora a espécie descoberta na Amazônia seja capaz de produzir uma descarga muito alta, ela é considerada menos perigosa para o ser humano do que a rede elétrica presente nas residências, pois tem baixa amperagem e dura poucos segundos.
Como a maioria desses animais emite correntes de baixa voltagem, os choques nos seres humanos são quase imperceptíveis. Mas o choque de espécies como a Electrophorus voltai pode causar danos se atingir regiões que afetam músculos, nervos ou o coração.
Quer saber mais sobre o poraquê? O Portal Amazônia te convida a conferir o vídeo feito pelo Amazonsat, contando sobre outras curiosidades da espécie.