O surgimento de cidades ao redor da Amazônia e o fluxo de migração

Entre as cidades mais importantes está Santa Cruz de la Sierra (Bolívia), cuja taxa de imigração é a mais alta de qualquer jurisdição amazônica. 

Foto: Reprodução

A migração rural-urbana é um fenômeno mundial e a Amazônia não é exceção. No entanto, uma grande proporção de seus imigrantes são pequenos agricultores que vieram originalmente dos Altos Andes e do Nordeste do Brasil, apostando seu futuro nas paisagens de floresta da Pan-Amazônia

Esse fluxo de pessoas para as comunidades rurais diminuiu drasticamente após o ano 2000, quando as famílias rurais começaram a transferir seu domicílio principal para os centros urbanos. No Brasil e na Bolívia, elas tendem a se mudar para cidades amazônicas, grandes e pequenas; no Peru, Equador e Colômbia, no entanto, é mais provável que se mudem para cidades nas terras altas, serras ou montanhas, ou para o litoral.

No Brasil, a proporção relativa de residentes rurais e urbanos na Amazônia Legal era aproximadamente equivalente antes de 1990; no entanto, em 2000, mais de setenta por cento dos residentes residiam no que o censo nacional considera áreas urbanas. A maior parte da migração rural-urbana ocorreu para os seis maiores centros metropolitanos: Manaus, Belém/Ananindeua, São Luís, Cuiabá/Várzea Grande, Porto Velho e Macapá/Santana.

Houve uma expansão semelhante de cidades intermediárias e pequenas, muitas das quais são centros administrativos de municípios conhecidos por seu papel nas cadeias de suprimentos agrícolas (Itaitatuba [AM], Sorriso, Sinop [MT], Tailândia [PA], Ji-Paraná [RO]), minas corporativas (Marabá, Parauapebas, Oriximiná [PA]), cidades de garimpo (Itaituba [PA], Pontes e Lacerda [MT]), ou paisagens pecuárias conhecidas por altas taxas de desmatamento (Altamira, São Félix do Xingu [PA], Humaitá [AM]). 

A maioria delas dobrou sua população entre 2000 e 2010 e tem crescido de dois a três por cento ao ano na última década, uma tendência que foi replicada nas categorias de cidades grandes e pequenas que estão no centro da economia rural da Amazônia brasileira.

Imagem: Reprodução/Mongabay

A Amazônia boliviana tem as taxas de imigração mais altas de qualquer jurisdição amazônica, mas essa estatística é distorcida pelo crescimento fenomenal da cidade de Santa Cruz de la Sierra, que passou de cerca de 100.000 residentes em 1970 para mais de 2,5 milhões em 2022. Outros municípios que registraram influxos significativos incluem San Ignacio de Velasco (Santa Cruz), Yapacaní (Santa Cruz), Ivirgarzama (Cochabamba), Cobija (Pando), Riberalta (Beni), Palos Blancos e Caranavi (La Paz). Todas estão localizadas na fronteira agrícola e apresentam taxas muito altas de desmatamento.

No Peru, os esforços para promover a migração para a Amazônia são prejudicados pela atração econômica de Lima e de outras cidades costeiras; consequentemente, a população da Amazônia tem se expandido um pouco acima da taxa nacional na última década (cerca de 1,4%).

A expansão observada da população da Amazônia peruana é consequência de uma taxa de natalidade relativamente alta, pois a emigração atualmente excede a imigração em todos os departamentos de planície, com exceção de um: Madre de Dios, local de uma corrida do ouro em constante expansão, sua população aumentou cerca de 5% ao ano na última década. A maioria dos recém-chegados são residentes rurais que trabalham em campos de mineração.

No restante da planície peruana, há uma migração consistente de pessoas do campo para as cidades e vilas regionais; as comunidades rurais de Loreto têm aproximadamente a mesma população hoje que em 2000, enquanto sua capital, Iquitos, teve apenas um crescimento modesto, aumentando de 360.000 para 423.000 habitantes entre 2007 e 2020 (1% ao ano).

Taxas de crescimento mais altas são registradas para Pucallpa (2,5%) e Yurimaguas (4,1%), sendo ambas cidades terminais de rodovias troncais. De qualquer forma, o número de emigrantes de Ucayali desde 2000 excedeu o de imigrantes; a maioria provavelmente é composta por jovens que estão se mudando para Lima.

O Equador amazônico tem a maior taxa de crescimento populacional de todas as regiões do país, apresentando uma taxa média decenal que é aproximadamente o dobro da média nacional (4% vs 2%).

Aparentemente, isso se deve a uma taxa de natalidade mais alta, porque a migração para a região praticamente parou, com apenas 1,3% dos entrevistados se identificando como imigrantes no censo de 2010. As taxas de natalidade relativamente altas e o ritmo lento da migração interna são justapostos com o ritmo lento da urbanização, já que apenas 29% (em comparação com 59% a nível nacional) dos residentes da região moram no que o órgão responsável pelo censo define como cidade ou vila

Imagem: Reprodução/Mongabay

A crescente urbanização da Amazônia se reflete no número de habitantes da jurisdição administrativa de menor nível (por exemplo, município, cantão, distrito), conforme relatado nos dados recentes do censo nacional (parte superior e central), bem como a mudança relativa entre 1980 e 2020 (parte inferior). Fontes de dados (painel superior e central): Bolívia (INE); Brasil (IBGE); Colômbia (DANE); Equador (INEC); Guiana Francesa (INSEE); Guiana (BS); Peru (INEI); Suriname (AGS); e Venezuela (INE). Fonte de dados (painel inferior): Thomas Brinkhoff, City Population, http://www.citypopulation.de/

Na Amazônia colombiana, a violência civil empurrou milhões de famílias rurais para as cidades. A população de Caquetá diminuiu em 50.000 pessoas entre 1993 e 2005, enquanto a cidade de Florencia aumentou em 33.000: dezenas de milhares de pessoas fugiram para refúgios seguros, como Villavicencio, Huila e Bogotá.

A campanha militar (Plano Colômbia) e o acordo de paz de 2016 mudaram essa dinâmica, e Caquetá tem crescido cerca de 3% ao ano na última década. O aumento da população é impulsionado em grande parte por uma corrida por terras e um boom econômico, com colonos e investidores rurais atraídos por terras baratas que estão sendo comercializadas por grileiros em uma das paisagens mais sem lei da Amazônia. 

Ironicamente, os centros populacionais locais cresceram apenas marginalmente com essa nova onda migratória, mas, se as tendências de outras fronteiras florestais se mantiverem, em breve elas sofrerão outro boom populacional.

Historicamente, a região do Escudo das Guianas tem uma população estável e majoritariamente urbana, com a maioria dos habitantes residindo em cidades no Rio Orinoco, na Venezuela, ou na planície costeira da Guiana, Suriname e Guiana Francesa. Os dados do censo podem não refletir com exatidão o número de pessoas nas jazidas de ouro, que sofreram um boom populacional local devido ao influxo de garimpeiros brasileiros e venezuelanos na última década.

A Guiana sofreu um êxodo em massa durante a última metade do século XX. Um pouco mais da metade de seus cidadãos nativos – 750.000 pessoas – deixaram o país desde 1970. A taxa de emigração diminuiu de recordes de quase 15.000 por ano no final dos anos 80 para cerca de 5.000 na última década. A grande maioria dos emigrantes reside atualmente nos Estados Unidos e no Canadá, mas não é incomum manter uma segunda residência e sustentar membros da família. Entre 2015 e 2020, o valor total das remessas variou de US$ 300 milhões a US$ 500 milhões, aproximadamente metade da receita do setor de garimpo de ouro.

Um fenômeno semelhante, porém menos grave, afetou a população do vizinho Suriname, onde cerca de 250.000 cidadãos emigraram, principalmente para a Holanda. A emigração diminuiu para menos de 1.000 cidadãos por ano, o que é aproximadamente igual ao número de indivíduos que imigram ou retornam ao Suriname.

“Uma tempestade perfeita na Amazônia” é um livro de Timothy Killeen que contém as opiniões e análises do autor. A segunda edição foi publicada pela editora britânica The White Horse em 2021, sob os termos de uma licença Creative Commons (licença CC BY 4.0).

*O conteúdo foi originalmente publicado pela Mongabay, com análise de Timothy J. Killeen e tradução de Lisete Correa.

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