Lendas Vivas: animais amazônicos e suas histórias místicas

Descubra como alguns animais amazônicos se ligam com as lendas indígenas, criando histórias que nos conectam com ancestralidade e biodiversidade.

O veado-mateiro (Mazama americana). Foto: Whaldener Endo

Por Luciana Frazão

A Amazônia é terra de biodiversidade e cultura, onde natureza e crenças se entrelaçam. Aposto que você leitor com certeza já ouviu alguma lenda amazônica em que um animal é protagonista, certo? Entre as muitas riquezas da nossa floresta, destacam-se os animais que inspiraram histórias passadas de geração em geração pelos povos indígenas. Vamos conhecer cinco animais fascinantes que não são apenas parte da fauna, mas também personagens de lendas cheias de mistério e sabedoria ancestral.

Que tal se aprofundar um pouco mais em um mundo onde a floresta ganha voz e os animais revelam segredos que atravessam gerações?

Boto-cor-de-rosa: o encantador das águas

O boto-cor-de-rosa (Inia geoffrensis) é um dos protagonistas mais famosos das lendas amazônicas. Conta-se que, nas noites de festa, ele se transforma em um belo jovem para encantar moças e levá-las para o fundo dos rios. O boto-cor-de-rosa é o maior dos botos podendo chegar até 2,55 metros de comprimento e pesar até 207 kg.

O boto-cor-de-rosa se mantém ativo tanto de dia como de noite e, durante o período de atividade, se alimenta basicamente de peixes. Esse golfinho de água doce, que vive nos rios da nossa região, é também conhecido por seu comportamento social e inteligência, reforçando seu papel quase mágico nas crenças populares.

O boto-cor-de-rosa (Inia geoffrensis). Foto: Federico Mosquera / Fundação Omacha

Veado-mateiro: Anhangá, o espírito guardião do cervo

Nas narrativas indígenas, o Anhangá é um espírito protetor da floresta que muitas vezes assume a forma de um cervo de olhos flamejantes. Acredita-se que ele guia caçadores desavisados para longe de suas presas, protegendo a fauna. Alguns associam esse mito ao veado-mateiro (Mazama americana), uma espécie que habita as densas matas amazônicas e é conhecida por sua habilidade de se camuflar. São animais grandes, onde os adultos pesam em média 30 quilos, e apresentam entre 67 cm e 80 cm de altura (medida nas ancas). Os veados-mateiros são herbívoros e possuem um impacto considerável no ecossistema amazônico, sendo responsáveis por ajudar a dispersar sementes na floresta.

O veado-mateiro (Mazama americana). Foto: Whaldener Endo

Uirapuru: a melodia do amor

Pequeno e discreto, o uirapuru (Cyphorhinus arada) é celebrado como símbolo de sorte e amor. Diz a lenda que, ao ouvir seu canto, a floresta silencia para escutar. Este pássaro tímido, encontrado nas matas amazônicas, tem um dos cantos mais complexos e belos do mundo, o que reforça seu status quase mítico. O uirapuru tem o tamanho médio de 12,5 cm e se move no solo ou no meio das folhagens e se alimenta principalmente, insetos, mas também se alimenta de frutas. Há uma lenda que diz que com o seu canto ele atrai bandos de aves, mas esse comportamento é uma estratégia para otimizar a busca por alimento. 

O uirapuru (Cyphorhinus arada). Foto: Hector Bottai

Cobra-grande: a guardiã dos rios

A cobra-grande, ou sucuri (Eunectes murinus), é um dos animais mais temidos e reverenciados na Amazônia. Segundo a lenda, ela habita as profundezas dos rios, protegendo seus segredos e punindo os invasores. Essa serpente, de fato, é uma das maiores do mundo, podendo chegar a mais de 5 metros de comprimento e pesar mais de 90kg. Apesar do tamanho que impõe respeito, esses animais não são peçonhentos e não costumam apresentar perigo aos seres humanos, e desempenham um papel essencial no equilíbrio ecológico dos rios amazônicos.

A sucuri (Eunectes murinus). Foto: Alexandre Almeida

Gavião-real: a ave celestial

O gavião-real (Harpia harpyja) é visto por muitos povos indígenas como um mensageiro dos deuses. Com suas poderosas garras e voo majestoso, ela simboliza força e proteção. Devido ao grande porte, é conhecido pelos indígenas como Uiraçu, um termo tupi que significa “ave grande”. Para muitas tribos indígenas brasileiras, o gavião-real é a personificação dos caciques, símbolo de altivez e força, sendo representado em diferentes manifestos culturais populares.

Essa ave, uma das maiores aves de rapina do mundo, podendo alcançar um pouco mais de 2 metros de envergadura de asa (o tamanho de uma ponta a outra da asa) e pesar até 9 quilos, no caso das fêmeas e 5 quilos os machos. O gavião-real habita as florestas densas e é um ícone tanto da biodiversidade quanto da espiritualidade da região.

O gavião-real (Harpia harpyja). Foto: Guilherme Jofili

Esses animais, além de desempenharem papéis importantes nos ecossistemas que habitam, são a conexão viva entre natureza e cultura. Eles nos lembram que a Amazônia não é apenas um lugar de beleza natural, mas também de histórias que enriquecem nossa identidade, herança e legado. Espero que tenham gostado dessa viagem pelas lendas e mistérios da nossa floresta. Abraços de sucuri pra vocês e até o próximo encontro com os animais incríveis da Amazônia!

Sobre a autora

Luciana Frazão é pesquisadora na Universidade de Coimbra (Portugal), onde atua em estudos relacionados as Reservas da Biosfera da UNESCO, doutora em Biodiversidade e Conservação (Universidade Federal do Amazonas) e mestre em zoologia (Universidade Federal do Pará).

*O conteúdo é de responsabilidade da colunista

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