Abatedouro flutuante de jacaré recebe licença ambiental no Amazonas

A licença ambiental do abatedouro simboliza um marco na conservação dos jacarés, uma vez que o manejo sustentável é também uma estratégia de mitigação da caça ilícita e predatória.

Uma comitiva de autoridades do Amazonas desembarcou em Tefé no último dia 19 com um objetivo claro: avançar no processo de viabilização do manejo participativo e sustentável do jacaré. A agenda cumpriu um passo decisivo tanto para a conservação da espécie quanto para a geração de renda para as famílias locais.

Recepcionada pelo diretor-geral do Instituto Mamirauá, João Valsecchi, e pelo coordenador do Programa de Manejo da Fauna, grupo responsável pelo projeto, Diogo Franco, a comitiva seguiu até a comunidade de São Raimundo do Jarauá, localizada na Reserva de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá, onde foi recebida pelo presidente da associação de moradores, Adelson Oliveira.

A agenda do dia foi marcada pela entrega da licença ambiental para o funcionamento do abatedouro PLANTAR, uma estrutura flutuante construída pelo Instituto Mamirauá para o abate e pré-beneficiamento de jacarés.

O Deputado Estadual Sinésio Campos e o presidente do Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas (IPAAM), Juliano Valente, fizeram a entrega dos documentos de licença. Estiveram ainda presentes autoridades do IBAMA, do MAPA, da UFAM e da Prefeitura de Tefé, essenciais nesta etapa do programa de manejo do jacaré do Amazonas.

João Valsecchi, diretor-geral do Instituto Mamirauá comemorou: “É uma vitória muito grande da pesquisa, da ciência, da comunidade, que foi parceira em todas as etapas. É uma vitória de todas as instituições aqui presentes e de todos os envolvidos”.

Conservação e sustentabilidade

A licença ambiental do abatedouro simboliza um marco na conservação dos jacarés, uma vez que o manejo sustentável é também uma estratégia de mitigação da caça ilícita e predatória. Diogo Franco, coordenador técnico do projeto, enfatizou a importância da regulamentação rigorosa do manejo do jacaré pelas comunidades tradicionais.

A presença no evento de Jorge Carvalho, personalidade respeitada no Médio Solimões, entre comunidades, técnicos e pesquisadores, e parceiro do Instituto Mamirauá há décadas, reforçou a importância da união entre conhecimento tradicional e científico. Conhecido carinhosamente como Tapioca, contou em sua fala que “o trabalho com jacarés começou em 1994, mostrando aos pesquisadores. Só tenho a agradecer ao Mamirauá“. Tapioca iniciou a colaboração com o Instituto Mamirauá como parceiro e depois como assistente de campo e tem um papel histórico nos programas de manejo. Desde os anos 90, quando os primeiros estudos de manejo de jacaré e pirarucu começaram, essa colaboração entre ciência e conhecimento tradicional tem sido fundamental para o desenvolvimento de estratégias inovadoras de conservação.

Entraves

Apesar de pioneiro no Brasil, o manejo comunitário de jacaré na RDS Mamirauá enfrentava entraves burocráticos. Em junho deste ano, um amplo debate na Assembleia Legislativa do Amazonas, conduzido pelo Deputado Estadual Sinésio Campos, destacou a urgência e relevância do projeto. “Este é um projeto vital para a conservação e para a economia local”, declarou o deputado. Na agenda de entrega da licença, em julho, Sinésio Campos lembrou que “somos parte da natureza” e enalteceu o papel das comunidades tradicionais: “quem preserva a natureza são vocês”, afirmou.

Juliano Valente, presidente do Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas (IPAAM), mencionou a sua surpresa quando teve conhecimento dos entraves burocráticos que o projeto sofria há anos. Daí em diante, determinou uma reviravolta na pauta, dando a prioridade necessária para que o processo caminhasse ao mesmo tempo que todas as exigências legais fossem cumpridas. “O IPAAM tem sido fundamental para garantir que cada etapa do processo de manejo siga os mais altos padrões ambientais”, afirmou Valente durante a cerimônia de entrega da licença.

Joel Araújo, superintendente do IBAMA, ressaltou que a autorização de manejo é proporcional à contagem dos indivíduos na natureza, garantindo que o processo seja sustentável. “Este projeto é um exemplo de como podemos conciliar conservação e desenvolvimento econômico”, comentou Joel.

A licença ambiental do abatedouro avança, enfim, para a etapa de conclusão dos trâmites legais, que enfrentaram uma longa jornada. Abates experimentais autorizados pelo Ibama foram realizados em 2004, 2006, 2008 e 2010. Estes pilotos serviram como base para a criação de legislação específica para o manejo de jacarés. Finalmente, em 2020, foi realizado um abate com plano de manejo e abatedouro licenciado próprio para jacarés, atendendo a todos os pontos da legislação estadual. A nova licença atende a todos os critérios, e permitirá que processo avance também em outras instâncias. Quanto à licença, o superintendente do Ibama sinalizou positivamente: “O Ibama aguarda a solicitação do manejo do jacaré do Instituto Mamirauá dentro dos critérios legais de sustentabilidade. E tão logo possa será emitida a autorização”.

Estrutura de abate: um modelo para a Amazônia

A estrutura de abate do jacaré é robusta, adaptada ao clima amazônico e equipada com três áreas distintas, destaca Diogo Franco, do Instituto Mamirauá. A primeira é destinada à higienização dos animais, utilizando água clorada e detergente biodegradável. Cinco profissionais capacitados trabalham na recepção dos jacarés machos, subadultos e capturados fora do período de reprodução.

Na segunda área, outros cinco profissionais realizam o abate de forma indolor, transportando os animais para a terceira área através de um trilhamento aéreo. Nesta terceira área, a carne é separada e pré-beneficiada. João Valsecci, diretor do Instituto Mamirauá, ressaltou que “a estrutura flutuante de abate é um projeto modelo para a Amazônia, pensada para testar o que poderá ser replicado em outras reservas do bioma onde o manejo seja viável do ponto de vista conservacionista”.

Manejo sustentável

O Instituto Mamirauá, pioneiro na criação da primeira estrutura flutuante de abate de jacarés licenciada no Brasil, assessora comunidades no desenvolvimento de atividades que promovem a conservação da biodiversidade e geram renda para populações ribeirinhas.

Esta iniciativa trabalha com a conservação das espécies de jacarés na Reserva de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá, monitorando ninhos e indivíduos para garantir uma cota sustentável de retirada. O processo inclui monitoramento anual de ninhos e contagem de indivíduos, com cotas de abate estabelecidas em no máximo 15% do total contado, respeitando o tamanho dos animais e as áreas de reprodução. Fêmeas não são abatidas. Esse processo visa manter saudável a população de jacarés na reserva, assegurando que indivíduos não sejam capturados em áreas de reprodução. Em especial, o manejo é uma forma eficaz de combate à caça ilegal e predatória.

O programa, coordenado pelo zootecnista Diogo de Lima Franco, proporciona uma alternativa econômica para as comunidades ribeirinhas, similar ao bem-sucedido manejo do pirarucu, que combina geração de renda com conservação.

A atividade legalmente reconhecida desde 2011, envolve a criação de planos de manejo, capacitação das comunidades em boas práticas de vigilância, abate, beneficiamento e comercialização, e o desenvolvimento de infraestrutura apropriada. O Instituto Mamirauá também facilita a articulação entre grupos manejadores e órgãos reguladores.

A geração de renda sustentável através do manejo de jacarés contribui para a diversificação econômica local e a segurança alimentar das comunidades, garantindo ao mesmo tempo a proteção das áreas de nidificação e a estabilidade das populações de jacarés. A iniciativa promove um modelo de conservação que beneficia tanto o meio ambiente quanto as comunidades que dele dependem, fortalecendo as parcerias e o desenvolvimento local sustentável.

As autoridades da comitiva e as lideranças comunitárias

A comitiva de autoridades, recebida por dezenas de comunitários e pela equipe do Instituto Mamirauá, foi composta pelo Deputado Estadual do Amazonas Sinésio Campos, Juliano Valente (IPAAM), Joel Araújo (IBAMA), Dionísia Campos (MAPA), Ronis da Silveira (UFAM), Euclides Queiroz (Engenheiro de Pesca da Secretaria de Produção de Tefé), além de outros representantes do IBAMA e IPAAM.

Um grande número de comunitários recebeu a comitiva, a exemplo de Adelson Oliveira, Elane Carvalho Marques e Jorge Carvalho, o Tapioca, lideranças do São Raimundo do Jarauá.

O Instituto Mamirauá contou com a presença do Diretor-geral, João Valsecchi, do líder do projeto Diogo Franco e equipe.

O evento marcou um momento de celebração e otimismo para a comunidade de São Raimundo do Jarauá e para a conservação do jacaré-açu. Com a licença ambiental formalizada e em mãos, a expectativa é de que o primeiro manejo ocorra no primeiro semestre de 2025, já com a autorização do Ibama.

*Com informações do Instituto Mamirauá

Publicidade
Publicidade

Relacionadas:

Mais acessadas:

Primeira borracha feita com látex 100% da Amazônia é lançada no Brasil

De acordo com a Mercur, a iniciativa busca valorizar o trabalho de comunidades extrativistas e ampliar o portfólio de produtos com matérias-primas renováveis no setor educacional.

Leia também

Publicidade