Indígenas do arquipélago do Marajó marcam gerações com a confecção de cerâmicas artísticas

O arquipélago, localizado no Pará, possui um legado deixado pelos indígenas marajoaras que, por meio da arte do barro (cerâmica), representavam elementos naturais, animais, humanos e outros seres.

Considerado o maior arquipélago de mar e rios do mundo, o Marajó fica localizado no extremo norte do Pará e contempla a foz do rio Amazonas e o oceano Atlântico, formando um cenário paradisíaco, sendo um rico patrimônio humano e cultural na Amazônia.

Durante anos de estudos arqueológicos, foram encontrados vestígios de uma civilização que vivia na região entre 400 e 1.600 a.C. Os vestígios são da cultura indígena marajoara, civilização responsável pela produção de cerâmicas que se tornaram mundialmente conhecidas.

O Portal Amazônia conversou com o doutor em História e professor na Universidade Federal do Pará (UFPA), especialista em Cultura Amazônica e Amazônia Marajoara, Agenor Sarraf, que esclareceu mais sobre o legado deixado pelos povos marajoaras e sua importância na cultura paraense.

Foto: Reprodução/TV Brasil

Os marajoaras marcaram a era pré-colombiana, época em que diferentes nações indígenas se organizavam a partir de Xamãs, Caciques e lideranças indígenas. Anos depois, durante o século XIX começaram a ser desenvolvidas pesquisas arqueológicas, incentivadas principalmente por estudiosos norte-americanos e europeus que direcionavam suas pesquisas para os sítios arqueológicos.

De acordo com Sarraf, durante as pesquisas realizadas nos sítios arqueológicos na região, foram encontradas dois modelos de cerâmicas, arte confeccionada por esses indígenas caracterizada com desenhos iconográficos que eram utilizadas para celebração ou então eram trabalhadas para uso doméstico.

Uma das representações da cultura marajoara é a arte da produção de cerâmicas em formato dos elementos naturais que representavam o cotidiano dos marajoaras. As peças marajoaras eram marcadas por vasos, potes, estátuas e miniaturas.

Nesta arte existem peças que não apresentam coloração e outras que ganham coloração a partir de elementos oferecidos pela natureza. O Urucum, Caulim, Jenipapo, Carvão e Fuligem são alguns dos elementos que potencializam a coloração das cerâmicas.

“A importância dessa cultura tanto para os marajoaras quanto para a Amazônia e o mundo, é que ela é uma cultura ancestral e traz o protagonismo das nações indígenas que habitaram as américas antes da chegada dos europeus. Isso já revela o espírito de desenvolvimento, sabedoria e técnicas milenares explorando os recursos da natureza e construindo grandes organizações. Então, tem uma importância muito poderosa que ainda hoje revela as marcas da identidade cultural do norte da Amazônia, especialmente do arquipélago de Marajó”, 

declarou o historiador.

Foto: Reprodução/Arqueo Espírito

Na cultura dos marajoaras existiam duas nações. A nação Aruãs vivia às margens da costa do arquipélago em contato com o oceano Atlântico, já a nação Nhengaíbas ficava dentro da floresta e era banhada pelo rio Amazonas.

“O nome Nhengaíbas foi uma criação pejorativo dos portugueses que chamavam esses indígenas de ‘gente de língua travada’, ou seja, eles não compreendiam o dialeto e diziam que era uma linguagem incompreensível, portanto os marajoaras vem dessas nações. Até hoje nós que habitamos na região somos considerados filhos dessas mesclas interétnicas e culturais”, acrescentou Sarraf.

Essas nações indígenas eram consideradas politeístas, possuindo uma crença direcionada a vários deuses. E as cerâmicas também representam elementos da geomorfologia vinculados ao ar, às águas e à floresta. Também eram reproduzidos elementos do antropomorfismo através de animais e deuses.

“Eles escreviam nessas cerâmicas a forma como interpretavam o mundo, tendo explicações cosmogônicas. Nas cerâmicas existe uma representação poderosa da conexão que essas populações tinham entre o mundo material e imaterial, mundo visível e invisível. Portanto, para os indígenas o mundo é uma conexão, somente o saber cartesiano, iluminista e racional que vai separar o mundo em reinos e categorizados como mineral, vegetal e animal. Para essas populações, o homem e a mulher são fontes de profundas energias e os seus ancestrais vivem presentes através das sabedorias que vem da tradição oral, assim como heranças deixadas, seja na cultura material ou na transmissão dos saberes”, explicou ao Portal Amazônia. 

Foto: Reprodução/ Arqueo Espírito

O especialista lembra ainda que na cultura marajoara a mulher ganha destaque como detentora da sabedoria e provedora da vida. Nas cerâmicas a vida é representada através do ventre materno e as imagens dos animais são reproduzidas através do ato de conceber vida.

No Marajó, os municípios de Soure, Salvaterra, Cachoeira do Arari, Santa Cruz do Arari, Muaná e Ponta de Pedras são os que possuem maior tradição e reprodução da cerâmica arqueológica.

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