Queimadas e seca explicam alta do desmatamento em Florestas Públicas Não Destinadas da Amazônia

"O aumento do desmatamento na região nessa época é geralmente atrelado ao período de seca", diz a pesquisadora no IPAM, Rebecca Maranhão.

Rebecca Maranhão é pesquisadora do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM) e compõe a equipe responsável pelo levantamento de dados sobre Florestas Públicas Não Destinadas (FPNDs) monitorados pelo Observatório das Florestas Públicas. Ela explica a importância de destinar essas áreas a povos indígenas e comunidades tradicionais e alerta para o impacto do desmatamento dessas florestas para população do Brasil.

A atualização do Observatório que traz os dados de julho revela um panorama preocupante do desmatamento em FPNDs na Amazônia, especialmente para os estados do Pará e Amazonas.

A plataforma oferece à sociedade civil, academia e tomadores de decisão, subsídios para entender a dinâmica do desmatamento nas florestas públicas a partir da transparência de dados atualizados e confiáveis. 

Por que aumentou o desmatamento nas FPNDs?  

Rebecca Maranhão: O aumento do desmatamento na região nessa época é geralmente atrelado ao período de seca, que vai de julho a outubro. De acordo com levantamento da rede MapBiomas Fogo, coordenada pelo IPAM, também é entre agosto e novembro que se observa 75% de toda a área queimada na Amazônia de 1985 a 2022. Esses momentos acabam sendo oportunos para ocorrerem invasões e atividades ilegais na floresta, o que resulta em aumento do desmatamento e da ocorrência de incêndios.

Tais fatores somados às mudanças climáticas – pelas quais há menos chuvas, tempo mais seco e temperaturas mais altas – deixam as áreas de vegetação nativa mais suscetíveis às queimadas. Para se ter uma ideia, de 2022 a 2023, o IPAM identificou um aumento de 32% na área afetada pelo fogo em florestas públicas não destinadas. 

Quais são os impactos da perda dessas florestas para a Amazônia e o Brasil?  

Rebecca Maranhão: São diversos os impactos tanto de serviços ambientais e ecológicos, quanto socioeconômicos em escalas local, regional e global. A perda de floresta é também de biodiversidade, afetando o estoque de recursos hídricos, saúde do solo, polinização. Por exemplo, as florestas possuem uma riqueza de espécies de árvores, que liberam quase 500 litros de água para atmosfera, contribuindo para manter o regime de chuvas na região e fora dela. Ou seja, a floresta tem papel chave na manutenção dos recursos hídricos, na sobrevivência dos rios, cruciais para navegabilidade e segurança alimentar das populações amazônidas.

Por outro lado, o equilíbrio do ciclo das chuvas impacta a irrigação da agricultura no Cerrado, fonte econômica e de segurança alimentar. Um estudo realizado pelo IPAM e pelo Centro de Pesquisa em Clima Woodwell apontou que 28% da área agrícola do Centro-Oeste, na região de transição entre a Amazônia e o Cerrado, já está fora das condições climáticas de plantio devido ao clima extremo. 

Qual seria a prioridade de destinação dessas FPNDs?  

Rebecca Maranhão: Uma destinação que vise o uso sustentável dessas florestas é essencial. Unidades de conservação e terras indígenas estocam cerca de 56% do carbono no bioma amazônico e, de acordo com levantamento da rede MapBiomas de 2024, o desmatamento em áreas indígenas, por exemplo, foi de apenas 1% em 39 anos.  

Então a destinação em si é apenas um primeiro passo para garantir que essas florestas estejam nas mãos de povos indígenas e comunidades tradicionais que, historicamente, conservam o meio ambiente. No entanto, é fundamental que haja apoio de políticas públicas para que essas populações continuem seus modos de vida, exercendo o direito sobre a terra, pois isto traz benefícios para o país, seja do ponto de vista da produção ou socioambiental. 

 Qual o papel do Observatório de Florestas Públicas Não Destinadas?

Rebecca Maranhão: A questão fundiária brasileira é complexa e o acesso a informações sobre as florestas públicas não destinadas ainda é difícil. O Observatório tem esse papel de informar a sociedade civil sobre o que são essas florestas. É também um modo de monitoramento da situação nessas áreas e do processo de destinação pela Câmara Técnica de Florestas Públicas recentemente reativada pelo governo federal. 

A plataforma traz um contador da destinação das florestas, além de informações sobre desmatamento ilegal, CAR (Cadastro Ambiental Rural) em FPNDs, estoque de carbono e outros dados relevantes, para entendermos o que está acontecendo com essa imensidão de florestas que pertence a todos nós.   Oferecer transparência sobre esses dados é essencial para engajar a sociedade e os agentes públicos para destinar essas áreas urgente.  

Qual é a importância da pesquisa e dos dados atualizados, contínuos e confiáveis sobre as FPNDs?  

Rebecca Maranhão: Tendo uma base de dados consolidada, com transparência, reforça a importância da pesquisa não só no monitoramento, mas também na análise temporal dos impactos, desmatamento e mineração, bem como das potencialidades, biodiversidade, estoque de carbono e os benefícios da floresta. Obter isso ao longo do tempo é essencial para entender a governança, como anda isso no aspecto governamental de políticas públicas.

*O conteúdo foi publicado originalmente pelo IPAM Amazônia, escrito por Camila Santana

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