Pesquisa indica que, apesar do cultivo milenar, o uso das pupunhas como alimento é muito tardio
Todo início de ano é a mesma coisa. Como um presente dos deuses da floresta, o mercado Adolpho Lisboa, a feira da Manaus Moderna, as demais feiras e os vendedores das esquinas enchem a cidade de belos cachos de pupunha (Bactris gasipaes), com seus frutos verdes, amarelos ou vermelhos. Quem resiste a pupunhas cozidas no café da manhã? E a tradição vai longe, mesmo que a princípio seu uso primeiro fosse a extração da madeira.
Segundo pesquisas realizadas por Margaret Cymerys e Charles Clement do Instituto de Pesquisas da Amazônia (Inpa), indicam que as pupunheiras estão entre as primeiras plantas domesticadas pelos indígenas, há milhares de anos, mas seu uso como alimento é muito tardio.
Eles não sabiam o que estavam perdendo. Aliás, o palmito da pupunha, rico em nutrientes e vitaminas, atualmente é bastante requisitado por chefs de restaurantes renomados do Sul do país. Em comparação a outros palmitos, o da pupunha tem a vantagem comercial de se formar mais rapidamente. Já o fruto é um poderoso antioxidante, devido aos carotenoides e selênio que possui em sua composição, o que auxilia no combate o envelhecimento da pele.
A pupunha pode ainda ser utilizada na fabricação de pães, bolos e muito mais, conta a nutricionista do Inpa, Dionísia Nagahama. “São preparações culinárias saudáveis com alimentos encontrados na região, de baixo custo, utilizando as partes geralmente desprezadas desses alimentos, como talos, cascas e sementes”, explicou Dionísia que pesquisa a culinária a partir das pancs (plantas alimentícias não convencionais), como o tucupi de cubiu. No caso da pupunha, ela usa a polpa. E ainda tem o óleo, que corresponde de 2% a 30% do fruto, e pode substituir o azeite de oliva.
As cores amarelas, laranjas e vermelhas da pupunha são resultado do caroteno (70 ml por cada 100 gramas de polpa), explicou Margaret Cymerys. “Quanto mais vermelha a polpa, mais vitamina A ela possui, contribuindo para a saúde dos olhos, cabelos, unhas e pele. A polpa de pupunha também oferece cálcio, ferro e fósforo”, escreveu Margaret. Outro estudo, sob a coordenação de Helyde Marinho, também do Inpa, pesquisa quatro produtos à base dos óleos da pupunha e do buriti: sabonetes líquido e sólido, emulsão evanescente e creme antioxidante. Todos patenteados e prontos para serem industrializados.
500 cachos/dia
A família de Mel Gbson Dantas (que não é o ator australiano), trabalha há mais de 15 anos na Manaus Moderna. “Quando inicia dezembro começam a chegar os cachos de pupunha, vindos de Coari, onde temos um sítio. Até março as remessas diárias não param” disse o comerciante da feira da Banana. No sítio a família produz açaí, macaxeira, mandioca, guaraná, abacaxi e pupunha, tudo vendido a seu tempo na feira, em Manaus.
Por dia, a banca, onde trabalham Gelcineide Dantas, tia de Mel, e mais quatro ajudantes, recebe 400 cachos de pupunha. “Mas vendemos cerca de 500 cachos.
Esses 100 a mais, compramos de outros produtores que trazem a fruta do distrito de Caviana (na BR 174), de Fonte Boa e até de Boa Vista (RR). Não é porque é nossa, não, mas a pupunha de nosso sítio é melhor que as outras, pois dura mais e chega aqui fresquinha”, garantiu.
As embarcações saem de Coari, do sítio dos Dantas, diariamente, e levam um dia para chegar a Manaus. “Para baratear o frete, as pupunhas vêm em pencas com três cachos e pagamos R$ 1, pela penca. Se viessem os cachos separados, pagaríamos R$ 1 por cacho”, disse. Na banca da família os cachos custam de R$ 5, a R$ 35, “dependendo da aparência dos frutos”, revelou o feirante.
De 5 a 26 cachos
A pupunheira alcança 25 metros de altura e cada tronco atinge de 10 a 25 cm de diâmetro. A planta forma uma touceira com até 15 troncos espinhosos. Há muitas variações na cor da casca do fruto (verde, vermelha, amarela, laranja), no teor de óleo (de 2% a 30% do peso fresco) e no tamanho do fruto (de 10 a 200 gramas). Além disso, existem frutos sem sementes.
A pupunheira floresce entre agosto e outubro e frutifica entre dezembro e março, raramente até abril. Porém, existem indivíduos que reproduzem fora dessa safra, especialmente em anos de chuvas abundantes e em solos mais ricos em nutrientes. Quando está com flores, a pupunheira é visitada por milhares de gorgulhos e outros besouros polinizadores.
Cada pupunheira produz de cinco a dez cachos por ano. No entanto, há palmeiras que chegam a produzir 25 cachos em apenas um ano chuvoso, em solo bom. Cada cacho de pupunha pesa entre dois e doze quilos e contém aproximadamente 100 frutos, podendo atingir até 400 frutos por cacho. Uma pupunheira pode produzir de 10 a 120 quilos de frutos. A colheita de um hectare pode variar de quatro a dez toneladas por ano. Às vezes, ocorre baixa produção por causa da polinização insuficiente, falta de chuva, falta de matéria orgânica ou solos compactados.
Festa da pupunha
As tribos indígenas do alto dos rios Solimões e Negro, no Amazonas, fazem uma festa durante a safra da pupunha. A festa é regada por caissuma e por comidas feitas com os frutos cozidos e farinha. Caissuma é uma bebida fermentada de pupunha e tem aroma de pêssego maduro. Por isso o geógrafo, naturalista e explorador nascido na Prússia (atual Alemanha) Alexander Von Humboldt criou, em sua passagem pelo Amazonas no século 19, os nomes europeus para a pupunha: palmeira de pêssego (Portugal), palmera de melacotón (Espanha) e peach palm (Inglaterra).
Palmito de pupunha
As vantagens do palmito da pupunheira em relação às outras espécies do seu gênero é o pouco tempo para a formação do palmito, o seu sistema de perfilhamento e as qualidades químicas do próprio palmito. Ao cortar o primeiro palmito da palmeira (mãe), depois de 12 a 18 meses no campo, o perfilho já está bem crescido e dará seu palmito em mais 6 a 9 meses.
Bons para a saúde
Em Manaus, os frutos são frequentemente consumidos depois de cozidos em água e sal e têm várias qualidades. Valor nutricional: são uma excelente fonte de fibra alimentar, proteína e alguns minerais, tais como ferro, zinco, cobre, manganês, magnésio, cálcio, fósforo e potássio.
Benefício na prevenção de doenças degenerativas: as cores vivas do fruto não são à toa: os tons que variam do amarelo para o vermelho indicam alta concentração de carotenoides, substâncias ricas em antioxidantes e que estão associadas à prevenção de doenças degenerativas.
Benefício pra pele: para quem deseja combater o envelhecimento precoce, um dos principais benefícios do fruto é sua grande quantidade de antioxidantes. Além de deixar a pele mais firme, beneficia a visão, o sistema imunológico e os ossos, que são fortalecidos.
Benefício pra digestão: o palmito da pupunha é um alimento pobre em gorduras e rico em fibras.