Moradores de uma casa às margens do Rio Araguari, no município de Itaubal, no Amapá, tiveram que abandonar o local após o avanço da erosão causada pelo fenômeno conhecido como ‘Terras caídas’. O problema também atinge comunidades ribeirinhas no Arquipélago do Bailique, na foz do Rio Amazonas.
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O fenômeno causa o deslizamento de terras em rios que estão sujeitos a grandes cargas de sedimentos. Na vila Progresso, a maior do arquipélago, casas e até uma escola tiveram as estruturas comprometidas com a erosão.
De acordo com o pesquisador Maamar El-Robrini, diretor da Faculdade de Oceanografia da Universidade Federal do Pará (UFPA), e que estuda a Zona Costeira Amazônica, os ecossistemas das áreas de deltas de rios são vulneráveis. Segundo o cientista, isso ocorre por conta do grande acúmulo de sedimentos, mas principalmente pela ação humana sobre sedimentos considerados geologicamente jovens.
“As orlas costeiras apresentam uma dinâmica muito peculiar, devido à interação de processos hidrológicos, oceanográficos (marés), atmosféricos e eventos extremos. O canal norte do estuário do rio do Amazonas é dominado por escoamento alto, associado às fortes marés, além de outros processos que podem produzir efeitos erosivos, em algum momento do ano mais forte, e em outro mais brando”, descreveu o pesquisador.
Os dados mais recentes da UFPA indicam que a descarga hídrica máxima do Rio Amazonas gira em torno de 230.000 metros cúbicos por segundo no mês de maio – o que, junto com as marés altas provocadas pela influência da lua, geram as maiores erosões na região.
Um outro problema na região é o assoreamento dos pequenos rios e a salinização na foz do Rio Amazonas, provocado, segundo moradores, a partir da construção de barragens no Rio Araguari, que teve a foz alterada de local.
O agricultor José Cordeiro, de 52 anos, mora da comunidade de Arraol, no Arquipélago do Bailique, e descreveu que as embarcações de pescadores sofrem dificuldades para navegar por conta dos assoreamentos. A pesca é um dos principais meios de subsistência dos habitantes do conjunto de ilhas.
“O assoreamento é muito grande aqui, principalmente nas comunidades aqui da região norte do Bailique. Elas estão praticamente isoladas e sem acesso por embarcações. Os canais estão secando e as praias estão crescendo muito e a gente tá numa situação bem difícil mesmo”, descreveu o morador.
A comunidade do Arraiol é uma das maiores produtoras de açaí e mel na região. De acordo com um estudo do Instituto de Pesquisas Científicas e Tecnológicas do Amapá (Iepa), o fenômeno atinge a área que compreende a costa do município de Vitória do Jari, no extremo sul do Amapá, até o Bailique, zona rural de Macapá.
O pesquisador Maamar El-Robrini informou que a salinização da água pode contribuir com o avanço mais rápido do processo de erosão na região.
“O que está sendo observado ainda próximo a foz, é uma anomalia de salinidade da água, que varia com o tempo, podendo contribuir com a erosão e a salinização dos lenções freáticos. Diante de todo este cenário, temos as comunidades e infraestruturas instaladas em áreas topograficamente muito baixas, que se tornam altamente vulneráveis. Recentemente, um estudo reconhece que 65 % do litoral brasileiro está em processo erosivo”, acrescentou o cientista.
As pesquisas mais recentes no trecho próximo à foz do canal Norte apontam erosão com taxa estimada de mais de 90%. Para El-Robrini é fundamental compreender os riscos potenciais, considerando os efeitos das mudanças morfológicas, nas infraestruturas municipais e outros serviços e/ou bens existentes.
*Por Rafael Aleixo, da Rede Amazônica AP