Mais de 50 analistas ambientais, brigadistas, instrutores e convidados participaram de uma imersão na Floresta Nacional do Bom Futuro, em Porto Velho (RO), durante o segundo módulo do Curso de Restauração Ecológica, promovido pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) e parceiros.
Este foi o primeiro módulo presencial realizado pelo órgão e faz parte de uma série de estratégias de estruturação da sua agenda de restauração ecológica, alinhada à meta do Brasil de restaurar e reflorestar 12 milhões de hectares de florestas até 2030.
Na formação, os participantes percorreram as principais etapas do processo de restauração em uma Unidade de Conservação: diagnóstico e avaliação da área, definição de técnicas de restauração mais adequadas e monitoramento do desenvolvimento das áreas.
A Flona do Bom Futuro é uma UC Federal de Uso Sustentável criada em 1988 com 280.000 hectares (ha) e que sofreu, ao longo dos anos, uma série de invasões e formalização de acordos para desafetação, tendo seus limites reduzidos para 100.075,13 ha em 2010. Todo o processo histórico de invasão resultou no desmatamento de diversos polígonos, que atualmente são ocupados por pastagens, com ou sem regeneração natural, e outras áreas em processo de restauração florestal.
Neste cenário, os cursistas tiveram a oportunidade de visitarem diversas áreas alteradas em diferentes estágios de degradação ambiental e outras em processo de restauração ecológica por meio de diferentes técnicas, exercitando em grupos todo o processo de avaliação quanto a tipo e nível de degradação, situação dos solos, técnicas de recomposição mais apropriada e também monitoramento do processo de restabelecimento da floresta.
“Nós pudemos fazer aqui todas as etapas, como se fosse pensar e realizar um projeto de restauração real. Começamos pelo diagnóstico, avaliação da área, o estabelecimento das técnicas de restauração baseadas nesse diagnóstico, e entender como se faz o monitoramento dessa área”, explica Alexandre Sampaio, analista ambiental do ICMBio e coordenador do Centro Nacional de Pesquisa e Conservação em Biodiversidade e Restauração Ecológica (CBC).
Sampaio explica que o aumento da capacidade técnica dos servidores é uma das partes mais importantes dessa estruturação que o ICMBio vem trabalhando para lidar com a questão da restauração ecológica. “Essa formação não existia no ICMBio, a gente está iniciando ela agora”. A formação foi iniciada no ano passado, com o módulo teórico.
Ainda como parte da formação, os cursistas visitaram a aldeia Bejarana na Terra Indígena Karitiana, vizinha a Flona. Lá, a Ação Ecológica Guaporé (Ecoporé) vem realizando um trabalho de formação de coletores de sementes florestais e mais de 90 famílias já compõem a Rede de Sementes da Bioeconomia Amazônica (Reseba), principal fornecedora das sementes para produção de mudas e semeadura direta dos projetos de restauração executados pela Ecoporé na Região.
Na própria Flona, a Ecoporé tem utilizado a técnica de semeadura direta (popularmente conhecida como Muvuca) e complementada com plantio de mudas para a restauração em mais de 80 hectares, no âmbito do Projeto Paisagens Sustentáveis (ASL), que tem como uma das agências executoras a Conservação Internacional – CI-Brasil.
Na aldeia, os participantes conheceram de perto como é feito o trabalho de formação e também como cada comunidade constrói seu calendário de coleta, criado com base nas dinâmicas, conhecimentos tradicionais e observações registradas em cada território. Breno Karitiana, cacique da Aldeia Bejarana, falou da importância do trabalho dos coletores de sementes e o fortalecimento da renda da comunidade.
“Desde 2021 a gente vem fazendo esse trabalho. Para nós é uma experiência nova e uma troca de saberes. E é uma valorização do nosso trabalho de coleta das sementes, que vão ser usadas para restaurar onde foi desmatado. A gente fica muito feliz”, afirma a liderança.
Além do apoio para a realização do curso, parte da equipe técnica da Ecoporé também compôs o grupo de instrutores. “A gente acredita que a gente só vai conseguir ter uma restauração em grande escala em várias regiões na Amazônia a partir do momento que tivermos mais pessoas qualificadas para isso”, avalia Marcelo Lucian Ferronato, coordenador do Programa Floresta e Agricultura da Ecoporé, que tem entre as suas iniciativas a Escola da Restauração, apoiada pelo Serviço Florestal dos Estados Unidos e que visa exatamente proporcionar essa capacitação técnica para a cadeia da restauração ecológica na Amazônia.
Assessora Técnica Sênior do Programa Brasil do Serviço Florestal dos Estados Unidos, uma das organizações apoiadoras da formação, Kirsten Silvius falou da importância da união de diferentes atores para a promoção de formações em restauração como a realizada na Flona do Bom Futuro. “Isso não acontece sem o apoio de um grupo como a Ecoporé, que tem a experiência de restauração, nem sem a participação das pessoas que moram aqui, que conhecem bem essa área. A restauração precisa do conhecimento técnico, mas também de entender a visão do pessoal do entorno, desde o proprietário rural, fazendeiro, as pessoas da cidade, as questões políticas também. É preciso entender todo esse contexto para fazermos uma restauração durável”, comentou.
A Década da Restauração, estabelecida pela Organização das Nações Unidas (ONU), objetiva prevenir, interromper e reverter a degradação dos ecossistemas em todos os continentes e oceanos. Neste contexto, o governo brasileiro anunciou a recuperação de 12 milhões de hectares de vegetação até 2030. Em Rondônia, a Ecoporé é um dos atores deste movimento mundial em prol da restauração, com iniciativas também em unidades de conservação,
Para Alexandre, as UCs são ambientes extremamente propícios para se realizar a restauração e o analista ambiental precisa estar devidamente capacitado para acompanhar esses projetos, a fim de que o resultado final seja o melhor possível.
“Todo investimento realizado dentro de uma área protegida, circundada de floresta conservada, traz benefícios maximizados em termos de serviços ecossistêmicos, em termos de conservação da biodiversidade. Então, começando por aqui, a gente começa a dar exemplo, começa a, de fato, mostrar os benefícios da restauração e amplificar o poder de conservação dessas áreas que a gente já está investindo tanto”, reforça.
O curso é uma iniciativa do ICMBio (CBC) em parceria com a FGV e articulação do Comitê Técnico Assessor de Rondônia (CAT-RO), uma iniciativa colaborativa entre diversas instituições para promover a restauração multifuncional nas Unidades de Conservação (UCs) de Rondônia, composto por representantes do ICMBio, Serviço Florestal Brasileiro, Serviço Florestal dos Estados Unidos, Conservação Internacional, Ecoporé, Projeto Paisagens Sustentáveis (ASL) e Universidade Federal de Rondônia.