Estudo realizado no Pará aponta importância dos dispositivos vestíveis na construção civil

A tecnologia, segundo a engenheira civil Juliana Silva, consegue capturar métricas que vão da frequência cardíaca até o comportamento de ondas cerebrais, tornando possível investigar o estado físico e emocional dos trabalhadores.

Foto: Rodrigo Pinheiro/Agência Pará

O bem-estar configura-se como um conjunto de práticas essenciais para uma boa qualidade de vida. No contexto atual, essas práticas passaram a ser procuradas e empregadas nos mais diversos ambientes, principalmente no mercado de trabalho. Desse modo, Juliana de Jesus da Silva, então aluna do curso de Engenharia Civil da Universidade Federal do Pará (UFPA), produziu um trabalho de Iniciação Científica (Pibic) que visava beneficiar os trabalhadores da construção civil.

Até o segundo trimestre de 2022, o setor da construção registrou aumento na taxa de emprego. De acordo com dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD), a alta foi de 11,2%. Paralelamente, estudos indicam que o índice de acidentes cresce na mesma proporção, demonstrando que o setor é um dos que mais oferecem riscos ao trabalhador. A pesquisa ‘Sensores vestíveis fisiológicos aplicados à saúde e à segurança na construção civil’ visava modificar esse quadro, afirma a engenheira civil Juliana Silva.

Os dispositivos vestíveis são aparelhos eletrônicos utilizados pelos usuários, como o próprio nome sugere, de forma “vestível”. Trata-se de pulseiras, braçadeiras e até cintas que são utilizadas para monitorar atividades e coletar dados fisiológicos que podem ser utilizados para diminuir acidentes e doenças ocupacionais, de forma a melhorar o ambiente de trabalho.

“Em alguns casos, com um único dispositivo, você consegue capturar métricas que vão da frequência cardíaca até o comportamento de ondas cerebrais. Com o monitoramento desses dados, é possível investigar o estado físico e emocional dos trabalhadores e encontrar maneiras de evitar a ocorrência de doenças ocupacionais, como as provocadas pelo estresse, por exemplo”, 

ressalta a pesquisadora.

Construção civil é responsável por altos índices de lesões e doenças

O trabalho faz uma revisão sistemática da literatura e identifica como os dados fisiológicos capturados por dispositivos vestíveis podem auxiliar na melhoria da saúde e segurança ocupacional. 

“Mesmo com os diversos meios que combatem acidentes e mortes, a indústria da construção ainda é perigosa, sendo responsável por significativas taxas de lesões e outras doenças. Isso acarreta, além do transtorno físico e emocional para os trabalhadores acidentados e seus familiares, um peso econômico para as empresas”,

avalia Juliana Silva.

A coleta de dados consistiu, primeiramente, em buscas exploratórias do tema em bases de dados, analisando-se as palavras-chave mais recorrentes em trabalhos científicos a fim de determinar a string (termos combinados utilizados para busca em bases de dados) de pesquisa. Com ela determinada, iniciou-se, então, a procura pela literatura existente em bases como a Engineering Village. Os artigos encontrados foram submetidos a critérios de inclusão e exclusão, o que resultou no total de 35 artigos incluídos na revisão, os quais usavam dados fisiológicos como a frequência cardíaca, a temperatura corporal e as ondas cerebrais para analisar aspectos tais quais o estado físico, emocional e o conforto térmico dos trabalhadores.

“Os dispositivos mais promissores foram as pulseiras, porque elas podem capturar diversas métricas e são consideradas mais confortáveis pelos trabalhadores”, ressalta a engenheira. Entre os estudos analisados, o principal dado fisiológico coletado foi a frequência cardíaca, pois permite investigar aspectos físicos, emocionais e ambientais.

Foto: Rodrigo Pinheiro/Agência Pará

Pesquisas sobre dispositivos precisam ser ampliadas no Brasil

Juliana de Jesus da Silva destaca que o campo de análise desses dispositivos é recente e, consequentemente, pouco investigado no Brasil. De acordo com a engenheira, são necessários estudos que englobem maior grupo amostral e que investiguem a adesão de operários à utilização dessas tecnologias. “Com um grupo amostral pequeno e em um ambiente controlado, muitos resultados podem não refletir a realidade. Além disso, é importante verificar os termos culturais do ambiente de trabalho: será que o operário vai se sentir confortável em utilizar o dispositivo? No Brasil, ainda não há estudos que certifiquem como a utilização desses aparelhos pode impactar no comportamento e na produtividade dos trabalhadores, por isso a importância de se pesquisar, cada vez mais, essa área”, enfatiza.

A proposta de pesquisa envolvia uma coleta de dados, aplicando um dispositivo vestível, em um canteiro de obras no município de Belém. Todavia o projeto não foi viável em razão da falta de recursos. “Dependendo do dispositivo, o custo pode chegar, em média, a R$ 4 mil”, afirma.

A pesquisa Pibic resultou no Trabalho de Conclusão de Curso de Juliana e rendeu-lhe, durante a Semana do Instituto de Tecnologia (Sitec 2022), o prêmio de melhor TCC do curso de Engenharia Civil da UFPA do período 2021.4 a 2022.2. “Foi uma felicidade muito grande, pois o trabalho exigiu bastante foco, visto que eu não tinha tanta facilidade para escrever. Foi um desafio vencido aos poucos, com a orientação do professor Felipe Moreira, a quem sou muito grata. O prêmio me deu mais gás para buscar fazer a continuação da pesquisa, porque, se o trabalho ganhou esse reconhecimento só com a revisão, imagina a contribuição que não pode ser dada com a aplicação, em si, do aparelho”, conta.

Para finalizar, a ex-aluna ressalta a importância que a utilização desses produtos traz para a construção civil. “Os benefícios são indiscutíveis. Com o emprego correto, associado a mecanismos que mitiguem os problemas identificados, a mão de obra e a indústria tendem a ganhar, visto que a primeira não sofrerá com acidentes e doenças e a segunda não terá custos com operador machucado ou adoecido”, conclui.

*O conteúdo foi originalmente publicado pelo Jornal Beira do Rio, edição 166, da UFPA, escrito por André Furtado e com edição de Rosyane Rodrigues.

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