Estudo destaca potencial do jucá na cicatrização de ferimentos

Planta medicinal apresentou melhores resultados quando comparada a medicamentos convencionais.

Uma pesquisa da Universidade Federal do Oeste do Pará (Ufopa) comprova a alta capacidade regenerativa do jucá no tratamento de lesões cutâneas. O estudo, realizado por professores e estudantes do Programa de Pós-Graduação em Biociências (PPGBIO), foi publicado na revista Frontiers in Veterinary Sciences.

A Libidibia ferrea, popularmente conhecida como jucá ou pau-ferro, é uma árvore amazônica usada tradicionalmente em chás, infusões e emplastos para o tratamento de feridas e contusões, além de doenças broncopulmonares, diabetes, reumatismo, câncer e distúrbios gastrointestinais.

Libidibia ferrea. (Foto: José Gabriel de Souza Silva/Uenf)

A pesquisa investigou o uso do extrato da planta no tratamento de ferimentos em 11 cães do Centro de Controle de Zoonoses (CCZ) na cidade de Santarém, no Oeste do Pará, por meio de análises macroscópicas e microscópicas. Os resultados apontaram que formulações a base de jucá foram superiores a um medicamento comercial de alto custo. Isso se deve à presença de substâncias flavonoides, taninos e cumarinas, que têm potencial medicinal.

“A presença de flavonoides nos extratos de jucá confere características anti-inflamatórias; os taninos conferem ação antisséptica e cicatrizante; e as cumarinas são responsáveis pela ação antibacteriana e antifúngica do extrato”, explica Ádria Américo, que desenvolveu o estudo durante o mestrado no PPGBIO.

Sequência mostra produção de fórmulas com jucá. (Fotos: Ádria Américo/Ufopa)

Os testes foram realizados durante 21 dias, com aplicações de três tipos de medicações: 1) em gel de carbopol, com extrato de jucá a base de álcool; 2) em gel líquido cristalino, com extrato de jucá e manteiga de murumuru; 3) pomada veterinária comercial. As formulações com jucá promoveram a recuperação mais rápida da pele e cicatrizes menores.

Segundo a pesquisadora, “As formulações a base de plantas resultaram em uma cicatrização melhor devido ao menor diâmetro e maior retração da ferida quando comparada com a pomada comercial a base de alantoína”.

Na fase da epitelização, que é o surgimento de uma camada rósea e fina sobre o ferimento, observou-se que os tratamentos com jucá apresentaram boa quantidade de novos tecidos e colágeno, além de melhor densidade da pele.

Os resultados sugerem o desenvolvimento de medicamentos com concentração de jucá a 5% para uso veterinário, com custo de produção inferior aos medicamentos comerciais a base de alantoína. O estudo também destaca que as formulações produzidas não causam dor durante a aplicação e que podem servir para a criação de medicamentos para uso veterinário e humano.

Pesquisa associou produto patenteado pela Ufopa


A pesquisa foi conduzida em diversos laboratórios da Ufopa: o Laboratório de Sanidade Animal (LARSANA), coordenado pelo professor Antonio Humberto Minervino; o Laboratório P&D Farmacotécnico e Cosmético, coordenado pela professora Kariane Nunes; o Laboratório de Produção e Desenvolvimento de Bioativos, coordenado pelos professores Kelly Castro e Lauro Barata; o Laboratório de Morfofisiologia Animal, coordenado pela professora Adriana Morini; e o Laboratório de Microbiologia (LabMicro), coordenado pela professora Katrine Rabelo.

Segundo o professor responsável pelo estudo, Antonio Humberto Minervino, do Instituto de Biodiversidade e Florestas (Ibef):


“O jucá eu já imaginava, por conhecimento empírico, que era um bom cicatrizante. O avanço científico foi determinar a dose mais adequada e utilizar um novo sistema de liberação sustentado de fármacos para incorporar o extrato de jucá, com vantagens técnicas superiores às formulações convencionais encontradas no mercado, o qual apresentou melhor resultado”.

Para chegar à medicação adequada, foram necessárias várias pesquisas, com diferentes concentrações do extrato e formulações.

“Destaca-se o emprego do novo sistema de liberação testado como base para o extrato, o gel liquido cristalino baseado em manteiga de murumuru, produto que gerou o primeiro pedido de patente da Ufopa, realizado pela professora Kariane Nunes e seu grupo de pesquisa, e que apresentou resultados excelentes”, ressalta Minervino. O gel com manteiga de murumuru permitiu adequada adesão tópica e, portanto, maior tempo de contato, o que promoveu uma ação prolongada do produto fitoterápico sobre as lesões.

Para a professora Kariane Nunes, vinculada ao Instituto de Saúde Coletiva (Isco): “O desenvolvimento do fitoterápico tópico baseado em manteiga de murumuru e extrato de jucá é uma estratégia tecnológica inovadora e em sinergia com as abordagens da economia circular, já que visa fomentar ambientes favoráveis a cadeias produtivas sustentáveis, com alto valor agregado, conduzindo a novos modelos de bionegócios e comércio justo (fair trade) na região do Baixo Amazonas”.

De acordo a publicação, a pesquisa permitiu aprimorar o conhecimento tradicional amazônico, com a descoberta de uma formulação mais eficiente.

“Apesar de estarmos localizados dentro da maior reserva de biodiversidade do planeta, quando falamos em dados de pesquisa, desenvolvimento e inovação da região, ainda nos deparamos com uma realidade de contrastes. A ferramenta mais eficaz para mudar essa realidade é a soma das diversas expertises que temos na nossa Instituição. Assim, surgiu essa grande parceria a convite do professor Humberto para professores, discentes e técnicos das áreas de veterinária, química, farmácia e microbiologia da Ufopa, a fim de transformar o conhecimento tradicional em plantas medicinais de uso na região amazônica em um produto fitoterápico inovador”, avalia Kariane Nunes.

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