O Amazonas e Canudos na narrativa de Roberto Mendonça

Roberto Mendonça afirma que a obra é o resultado de anos de pesquisa sobre a guerra da pequena cidade de Antônio Conselheiro em Canudos, no Sertão da Bahia, ao mesmo tempo em que descreve o deslocamento da tropa do Amazonas até aquela cidade.

O historiador e pesquisador Roberto Mendonça. Foto: Reprodução/Amazon Sat

Por Abrahim Baze – literatura@amazonsat.com.br 

‘Cândido Mariano e Canudos’ é a obra do historiador e pesquisador Roberto Mendonça agora numa segunda edição. Cândido Mariano foi militar, nascido em Algemas, no sul de Minas Gerais no dia 2 de maio de 1870, filho do advogado Cândido José Mariano e da senhora Leopoldinas Gomes Mariano.

Roberto Mendonça, pesquisador festejado, afirma que a obra é o resultado de anos de pesquisa desse nobre comandante do Batalhão Policial Militar do Amazonas que se empenhou na guerra da pequena cidade de Antônio Conselheiro em Canudos, no Sertão da Bahia, ao mesmo tempo em que descreve o deslocamento da nossa tropa até aquela cidade.

O autor é Coronel da Polícia Militar e dedicou parte da sua vida na história da Polícia Militar. Nessa obra recorreu ao arquivo em diversas cidades e capitais brasileiras antes de chegar à Bahia, onde realizou o sonho de pisar nas terras do Conselheiro. Porém, o mérito maior foi ter encontrado com a senhora Lucy no Rio de Janeiro, filha de Cândido Mariano, conseguindo assim, um valioso relato sore a história do Comandante, como bem lembra a vice-Presidente do Conselho Regional de Biblioteconomia senhora Elba Carvalho Mendonça.

“Sabeis, o Comandante que a campanha aos bravos viajantes não é novo nos sofrimentos e nas refregas, seu nome já sagrado nos feitos pela república” (Fileto Pires Ferreira, Governador do Amazonas, ao despedir-se da tropa que partia de Manaus).

📲 Confira o canal do Portal Amazônia no WhatsApp

O Amazonas e Canudos na narrativa de Roberto Mendonça
Canudos, no Sertão da Bahia. Foto: Abrahim Baze/Acervo pessoal

A Estação da Calçada do Bonfim visivelmente ordenada e as redondezas da estação ferroviária conservavam-se com céu cheio de nuvens aquele momento histórico. Os acontecimentos e especialmente os personagens da tragédia de Canudos refluem com avassaladora energia na demolição de Belo Monte, consolidado na terça-feira 5 de outubro de 1897.

Os herdeiros de Bom Jesus Conselheiro estão resgatando este singular movimento com a rediscussão dessa saga ocorrido no curto período do quatriênio inaugurado em junho de 1893, ou seja, a partir da implantação daquele arraial liderado por Antônio Vicente Mendes Maciel, conhecido eternamente como Antônio Conselheiro.

Para a Polícia Militar do Estado do Amazonas a data mais significativa da referida campanha é a do retorno de sua tropa, em 8 de novembro daquele mesmo ano. Naquela ocasião O Primeiro Batalhão de Infantaria do Regimento Militar foi saudado com flores e com versos, com discursos inflamados de políticos e literatos no átrio do quartel da Praça da Polícia e das janelas engalanadas dos sobrados, desde o humilde cidadão até as autoridades como o Governador Fileto Pires Ferreira.

Quem é o autor Coronel Roberto Mendonça

Ao ingressar na Polícia Militar do Amazonas (PMAM), em meados de 1966 encontrei, a despeito da escassez de subsídios, o culto a um incensado herói de Canudos Cândido José Mariano. Quase nada se conhecia ou existia publicado a seu respeito, quando em 1972 essa corporação encomendou a um historiador uma síntese histórica. Foram essas primeiras informações biográficas que me impulsionaram a desvendar a origem e o destino deste paladino.

Em frente! Quando servia na Casa Militar do Governo (1983-84), despertou minha curiosidade e impediu-me a desvendar a substância da PMAM uma máquina leitora e copiadora de microfilmes disponível no Palácio Rio Negro. Tardes e tardes inquietei-me diante do visor luminoso a cata de fatos e datas, de nomes e de feitos. As anotações acumularam-se , pois a leitora dispunha de recurso reprodutivo e cópias ampliadas, assim o trabalho de pesquisa tornou-se mais franco e asséptico.

Apesar da assepsia, estou convencido de que, naquele instante, fui inoculado com um veneno da pesquisa. Daí em diante, decidi recuperar de páginas amareladas de compêndios e de fontes disponíveis, o ilustre desconhecido Cândido Mariano.

Da partida, reli e anotei todos os dias dados existentes em arquivos da cidade de Manaus. Visitei (e aqui registro meu agradecimento) todos os departamentos estaduais, todos os locais onde fosse possível colher algum apontamento acerca do campeador de Canudos.

Selo comemorativo dos Correios referente ao centenário do fim da guerra de Canudos. Foto: Abrahim Baze/Acervo pessoal

Somente quando esgota a pesquisa local e ainda pela inexistência de dados básicos, como datas de nascimento e de morte do biografado, viajei ao Rio de Janeiro com a vã esperança de recolher no principal cemitério daquela cidade os pormenores que me afligem. Ledo engano. Descobri, então, que ali os mortos desafortunados ainda não estavam atendidos por esse recurso tecnológico. Contudo, não perdi a viagem, o Arquivo do Exército cedeu-me cópia de todos os documentos existentes na pasta do ex-capitão Cândido Mariano, alguns dos quais ilustram este trabalho.

De retorno a Manaus, certo dia caminhando solitário (como atleta frustrado) veio-me a ideia de repetir a experiência realizada em A Crítica, jornal da cidade. Inquiri-me por que não endereçar uma carta a um jornal carioca? Assim, no início de dezembro de 1993, remeti com certa descrença uma carta ao leitor para O Globo. Resumindo como presente natalino, recebi um telefonema de Jorge Torres, neto de Cândido Mariano. É, para meu cabal entusiasmo anunciava que sua mãe adotiva – nonagenária era a filha de Cândido Mariano e, estava viva e me aguardando.

Alvorecei-me para encontrar tão preciosa descoberta. Viajei ao Rio, onde dialoguei durante uma semana (vou explorar isso a exaustão do decurso desta retrospectiva) com dona Lucy Mariano, que me proporcionou uma incomensurável dadiva. A de ser o último e único policial militar do Amazonas a conversar com a filha de Cândido Mariano. O privilegio recompensou-me de tantas andanças e de horas e horas enfurnado em pesquisas, nem sempre em ambiente acolhedor como também postado a frente do computador.

A partir desse diálogo, localizei no cemitério de São João Batista, do Rio de Janeiro a arca contendo os restos mortais de Cândido Mariano no extremo do campo santo, constituindo a parede para a rua fronteiriça. Ao retornar a Manaus, fiz gestão junto ao comandante-geral no sentindo de que a PMAM efetuasse a remoção dos restos mortais de seu patrono. Já ponderei essa sugestão a mais outros comandantes. Contudo, nunca obtive sucesso. Oxalá, a urna ainda esteja perpetuando o combatente de Canudos.

E avancei na empreitada. Em busca de maiores detalhes sobre o homenageado, visitei Rio Branco e Sena Madureira, no Acre e Porto Velho, capital de Rondônia, onde vasculhei arquivos de organizações, sem muito alcançar. O arquivo rondoniense estava a merecer maior espaço e organização (1994), e os apontamentos sobre os funcionários da estrada de Ferro Madeira Mamoré estavam sendo processados para se construir um acervo de futuro museu. Ainda há muito a pesquisar, pois o comandante do batalhão do Amazonas operou por diversas cidades do sul ao norte do país. Espero que a divulgação deste trabalho ajude aos interessados a recompor a trajetória deste combatente.

Por fim, aventurei-me em uma particular quinta expedição. Para isso, retornei a Salvador (BA), quando mantive contato com o saudoso mestre José Calasans Brandão da Silva (1915-2006) e com professores do Centro de Estudos Euclides da Cunha (CEEC), da Universidade do Estado da Bahia (UNEB), para recolher informações sobre Canudos. Fiz uma parada e, Juazeiro (BA), aonde recebi o apoio do 3.° Batalhão Policial ali instalado que, me permitiu madrugar em direção a Canudos. Embora estivesse e, veículo policial, a turma da Associação Canudense de Estudos e Pesquisas Antônio Conselheiro (Acepac) conduziu-me pelas trilhas sagradas de Belo Monte. Concretizei um sonho!

Acerca da campanha canudense, não me propus a produzir uma dissertação acadêmica. Livros a mão cheias expostos, tentando desvendar os mistérios insólitos daquela luta as margens do rio Vaza Barris. Meu intento persiste – tão somente – em particular a presença amazonense, recolhendo, para isso, de compêndios e de revista, de diários e de periódicos, a descrição do desempenho da força militar no campo de luta. Bem como a passagem do batalhão de Cândido Mariano por algumas cidades da costa brasileira, em especial, a capital baiana. Valho-me do método de revelar a história, fazendo falar os personagens, que vem ao encontro do leitor, tal como me inspirou Hélio Silva, saudoso historiador.

Seja qual for resultado deste trabalho, a participação da Polícia Militar do Amazonas no evento bélico do final do século XIX, na Bahia de inúmeros Antônios, está posta a disposição de estudiosos ou, simplesmente de interessados. Sou imensamente grato a quantos me incentivaram a publicá-la.

Roberto Mendonça

Sobre o autor

Abrahim Baze é jornalista, graduado em História, especialista em ensino à distância pelo Centro Universitário UniSEB Interativo COC em Ribeirão Preto (SP). Cursou Atualização em Introdução à Museologia e Museugrafia pela Escola Brasileira de Administração Pública da Fundação Getúlio Vargas e recebeu o título de Notório Saber em História, conferido pelo Centro Universitário de Ensino Superior do Amazonas (CIESA). É âncora dos programas Literatura em Foco e Documentos da Amazônia, no canal Amazon Sat, e colunista na CBN Amazônia. É membro da Academia Amazonense de Letras e do Instituto Geográfico e Histórico do Amazonas (IGHA), com 40 livros publicados, sendo três na Europa.

*O conteúdo é de responsabilidade do colunista

Publicidade
Publicidade

Relacionadas:

Mais acessadas:

Comissão de Direitos Humanos aprova criação da Política Nacional de Segurança dos Povos Indígenas

A proposta reafirma competências de vários órgãos de Estado relacionadas ao combate à violência contra os povos indígenas.

Leia também

Publicidade