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Sábado, 20 Abril 2024

Quem mexeu na minha escova de cabelo?

O pai está na sala tentando se concentrar para um importante evento que vai dirigir naquela manhã e que inclui uma palestra sua. Como faz em situações assim, respira fundo, procura acalmar-se e faz uma oração silenciosa antes de sair de casa.

"Quem mexeu na minha escova de cabelo?" - grita uma das filhas de um quarto.

"Tenho duas aqui no meu banheiro, mas não fui eu que peguei a sua" - berra uma segunda filha.

"Se está aí é porque berr levou, a escova não anda sozinha. Preciso dela agoooora".

"Problema seu. Vem buscar".

Foto: Reprodução/LinkedIn

A discussão se estendeu entre as adolescentes, incluindo agora a terceira irmã e a mãe, que foi chamada a intervir. O pai precisava estar bem, em seu perfeito equilíbrio espiritual e mental. Tentou manter-se calmo. Levantou-se, pegou a escova do banheiro de uma e a levou para a outra filha. A calma no lar foi reestabelecida, e o pai seguiu com a sua preparação. Não fosse a palestra, talvez tivesse estourado, como já ocorrera antes. Mas não naquele dia.
O que o pai fez e que acabou aproveitando como exemplo para a sua palestra? Nada complicado, mas ao mesmo tempo, difícil de colocar em prática. Ele focou na solução e não no problema.

Focar no problema, na ameaça e nos defeitos é o que o nosso modelo mental tende a fazer sem muito esforço. Fomos criados assim e isto favoreceu a sobrevivência da espécie, que não era a maior, a mais forte e nem a mais veloz. O foco no problema nos mantém alertas e prontos para atacar ou fugir. Nossas conexões neurais permanentes nos levam para a esfera do problema.

A questão é que, como destaca David Rock no livro Não diga aos outros o que fazer, focar no problema nos remete ao passado, a tentar mudar o que ocorreu, a encontrar culpados ou a nos defender com justificativas. E isto acontece de maneira automática. Focar no problema é bom para melhorar processos, mas não para lidar com pessoas.

Conscientemente, podemos levar nosso pensamento para um outo tipo de conexão, não-automática, fruto de nossas escolhas. Isto exige um certo esforço e treinamento, mas podemos chegar lá. A questão é que, mesmo quando fazemos isso, podemos encontrar um outro filtro, formado por crenças, estímulos culturais e argumentos teóricos que nos empurram para o problema.

Sem querer generalizar, algumas técnicas de terapia, por exemplo, concentram-se por um longo tempo no passado, buscando causas e traumas, reforçando cada vez mais estas conexões. Elas focam o problema. Martin Seligman, um dos pais da psicologia positiva, já alertava o quanto o foco na doença pode dificultar a saúde. Da mesma forma que não ser infeliz não significa ser feliz.

A construção da felicidade não está na esfera dos problemas, mas nas soluções. Conscientemente, podemos buscar um filtro que estimula, por exemplo, a busca de alternativas e oportunidades, um componente da resiliência e da inovação. Mokiti Okada afirma que se é a crise que abre caminhos, ela deixa de ser crise, podendo ser comparada aos nós do bambu, que lhe dão força e resistência.

Focar nas soluções coloca energia onde interessa. Isto faz criar novas conexões, que se tornam mais fortes, cada vez que as utilizamos. Focar nas soluções é um estímulo à criatividade, à esperança e ao otimismo, elementos importantes para a construção da felicidade. É também uma maneira prática de lidar com pequenas questões que às vezes ganham uma dimensão de um grande problema, como teria sido se o tal pai das adolescentes tivesse caído na armadilha de focar no problema. Emocionalmente irritado, como teria sido a sua palestra? Que diferença faz quem mexeu na escova de cabelo?

Sobre o autor

Julio Sampaio (PCC,ICF) é idealizador do MCI – Mentoring Coaching Institute, diretor da Resultado Consultoria, Mentoring e Coaching e autor do livro Felicidade, Pessoas e Empresas (Editora Ponto Vital). Texto publicado no Portal Amazônia e no https://mcinstitute.com.br/blog/.

*O conteúdo é de responsabilidade do colunista 

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