Dona Arminda era a mãe de um grande amigo e de vez em quando eu a encontrava de passagem.
Dona Arminda era a mãe de um grande amigo e de vez em quando eu a encontrava de passagem. Cabelos bem brancos, pele morena, corpo esguio e olhos claros, de uma cor meio indefinida. Era uma senhora bonita. Era também uma mulher com aparência saudável, que ganhou força na adversidade da vida e que mereceu ter conquistado o que conquistou. Era chefe de enfermagem e tinha prazer e propósito no que fazia. Dizia que a sua maior vitória, no entanto, era a família que construíra ao lado de José, que não ajudou muito, na verdade até atrapalhou um pouco, mas que acabou cumprindo o seu papel coadjuvante no enredo. Dona Arminda era forte, decidida, do tipo que sabe o que quer e que tem energia para fazer acontecer. Era ativa na sua religião, mas não era do tipo carola, pois tinha dificuldades de obedecer a qualquer tipo de mandamento que não concordasse. De qualquer forma, pode-se dizer que era uma motivadora ativa, que tinha sempre uma palavra de esperança para as pessoas.
Esta era a D. Arminda de antes, mas não a D. Arminda de depois. Tornou-se uma outra pessoa. Toda a sua energia agora era direcionada para identificar e realçar os problemas e dificuldades. Uma dor substituía a outra e não adiantava dizer que ela parecia bem, pois ela logo retrucava que não, que agora estava pior de uma ou outra coisa. Sentia-se menos realizada no hospital onde trabalhava e passou a sonhar com a aposentadoria. Seu brilho murchou, seu corpo pareceu encolher e não tardou para que uma doença física de fato aparecesse. Seria um quadro depressivo? Os diagnósticos médicos diziam que não. D Arminda simplesmente mudou e passou a ser uma pessoa como muitas outras, talvez pessimista, talvez realista demais, nada de tão anormal.
Mas toda esta transformação ocorreu depois do que? Nada que meu amigo pudesse identificar ter ocorrido na vida de sua mãe. Nenhuma perda de ente querido, nenhuma tragédia, crise financeira, ou algo assim. Tudo estava como antes, a não ser por um detalhe, que começou sem grande relevância, mas que o meu amigo percebia agora, foi ganhando corpo e, na opinião dele, pode ter sido a origem desta grande mudança: D. Arminda brigou com Deus.
Revoltada pelo noticiário macabro, especialmente de um determinado dia, D. Arminda esbravejou com Deus e assumiu perante a família o compromisso de não agradecer a mais nada e nem de transmitir falsas esperanças para ninguém. Não adiantava, pois tudo estava perdido mesmo. D. Arminda tinha reputação de cumprir a sua palavra e depois disso, nunca mais ninguém viu D. Arminda agradecer por nada, nem mesmo nas suas orações ao deitar-se e ao levantar-se, hábito que teve durante toda a vida. Depois de um tempo, não agradecia também às pessoas por nada, o que antes, era uma marca sua.
Não, meu amigo não achava que a transformação era castigo de Deus, mas como eu e, acredito que você, caro leitor, ele sabe o quanto o exercício da gratidão e a prática de plantar felicidade são importantes para a nossa própria felicidade e saúde. Sabemos que eles funcionam como alimentos para o nosso espírito e para a nossa mente e influenciam fortemente como enxergamos a vida e lidamos com as dificuldades. Assim, mais importante do que vacinas e remédios, do que estamos alimentando o nosso espírito nestes dias? O que estamos conseguindo agradecer e o que estamos transmitindo para neutralizar, pelo menos em parte, toca a carga com que estamos sendo bombardeados?
Dona Arminda já está voltando a ser a velha D. Arminda. Racionalmente, aceitou rever o seu discurso de revolta e voltar a agradecer e a transmitir esperança para as pessoas ao seu redor. Ainda não é a mesma D. Arminda, mas está retornando. Logo, logo, estará de volta a velha D. Arminda.
Julio Sampaio (PCC, ICF)
Idealizador do MCI – Mentoring Coaching Institute
Diretor da Resultado Consultoria, Mentoring e Coaching
Autor do Livro: Felicidade, Pessoas e Empresas (Editora Ponto Vital), dentre outros
Texto publicado no Portal Amazônia e no https://mcinstitute.com.br/blog/