Filhos de antes e filhos de agora

Não era uma situação confortável para as crianças, mas elas eram educadas a não serem o centro. Pai e mãe eram pais, e filhos eram filhos. Os primeiros a serem servidos eram os mais velhos e os filhos vinham depois.

Por Julio Sampaio de Andrade – juliosampaio@consultoriaresultado.com.br

O encontro é profissional, mas a conversa inicial é sobre os desafios de cada um com filhos pequenos. São pais na faixa dos quarenta anos ou um pouco mais. Um por um relata a sua rotina, como pais ou como mães, na tentativa de equilibrar a vida profissional e a de pais. Observei que ninguém comentou sobre os papeis de marido ou mulher, que parecem ter sido colocados em um plano bem secundário.

As agendas são muito parecidas e eles se divertem ao perceber isso. Durante a semana, creches ou escolas, trabalho fora ou em home office, hora do jantar, hora da brincadeira, músicas infantis que são sempre as mesmas, filminhos na TV, que numa fase, também são sempre os mesmos, até que é hora de botar um para dormir e fazer sossegar o maiorzinho, que está mais elétrico do que em qualquer outra hora do dia. Depois de um tempo, crianças de um lado e pais desmaiados do outro. O primeiro sono ainda na cama das crianças, para depois irem mortos para o seu quarto. Ainda vão acordar no meio da noite, quando um dos filhos corre para a cama dos pais, como faz toda noite. No final de semana, a agenda está cheia, pois a programação também tem como prioridade as crianças. Parquinhos, festinhas e uma série de lugares para os pequenos conhecerem. As férias são para as crianças, naturalmente.

Observo com admiração estes novos pais e é inevitável a comparação com a época em que eu tinha filhas pequenas. O contraste é grande. Primeiro, éramos pais mais jovens e não tínhamos tantos cuidados como recebem as crianças de hoje, na média, com pais mais velhos.

Já não tão forte quanto na época dos meus pais, mas, na minha geração ainda havia uma separação nítida de responsabilidades entre homens e mulheres, mesmo que elas já trabalhassem fora, no caso, em jornada dupla. Na maioria dos casos, ainda valia a máxima: “o homem vai à caça e a mulher cuida da prole”. Havia a dona da casa e o chefe da casa. Para algumas coisas, mandava ela, para outras, era ele. Havia outras distorções, como a autoridade sobre o uso do dinheiro, as desigualdades nas relações, etc. Muita coisa era diferente de hoje. Mas o que chama minha atenção é o novo poder das crianças. Elas estão no centro e no topo da hierarquia, talvez mais do que nunca.

Voltando a agenda de final de semana, lembro que as minhas filhas nos acompanhavam e a agenda era nossa, dos pais. Seja para lazer, seja para uma atividade necessária, levávamos as nossas filhas. Às vezes, em um sábado à noite, elas podiam sair já dormindo de uma pizzaria, carregadas no colo, depois de um encontro com os nossos amigos. Nossos, não delas. Na programação do dia seguinte podíamos decidir ir à praia ou a piscina e lá estariam elas, sem problemas, sem stress, sem traumas (será que eles existem?).

Olhando sob este prisma, não era uma situação confortável para as crianças, mas elas eram educadas a não serem o centro. Pai e mãe eram pais e filhos eram filhos. Os primeiros a serem servidos eram os mais velhos e os filhos vinham depois. Era um tipo de educação que valorizava a ordem e servia para outras situações na vida, no trabalho, nos relacionamentos, no dia a dia.

Se antes os pais já davam o máximo, os de agora vão ainda além. A nova divisão de trabalho, talvez tenha aumentado a carga de todos e a “nova criança” é mais exigente. Algumas podem acostumar-se a receber e a sentir como um direito adquirido, sem desenvolver gratidão ou sentimento de queres ser útil (já podemos encontrar por aí alguns crescidinhos com estas características), sempre insatisfeitos.

Os pais de hoje talvez sejam mais generosos, mais preocupados com o bem-estar dos filhos. Mas bem-estar não significa felicidade. Educar uma pessoa para ser feliz envolve pelo duas características que são muito mais fáceis de desenvolver na infância: o modelo mental da gratidão e o modelo mental do altruísmo. Desejo que os novos pais não se esqueçam disso. Vale para os filhos de antes e para os filhos de agora. Ah, e que não esqueçam dos papéis de marido e de mulher. Nunca é demais lembrar de onde vieram os filhinhos.

Sobre o autor

Julio Sampaio (PCC,ICF) é idealizador do MCI – Mentoring Coaching Institute, diretor da Resultado Consultoria, Mentoring e Coaching e autor do livro Felicidade, Pessoas e Empresas (Editora Ponto Vital). Texto publicado no Portal Amazônia e no https://mcinstitute.com.br/blog/.

*O conteúdo é de responsabilidade do colunista

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