Reconhecido por seu trabalho literário em todo o país, o poeta morreu em casa, em Manaus (AM), nesta sexta-feira (14). A causa da morte ainda não foi informada.
Leia também: Conheça a história de Thiago de Mello
Em setembro de 2021, a 34ª edição da Bienal de São Paulo homenageou o poeta amazonense inspirada no verso que faz parte do pela ‘Madrugada Camponesa’: “Faz escuro, mas eu canto Porque a manhã vai chegar”. O poema também ganhou uma versão musical por meio de uma parceria entre Thiago de Mello e o músico Monsueto Menezes.
Pois aqui está a minha vida. Pronta para ser usada. Vida que não guarda nem se esquiva, assustada. Vida sempre a serviço da vida. Para servir ao que vale a pena e o preço do amor.
Trecho da poesia ‘A vida verdadeira’, de Thiago de Mello.
O escritor e poeta Tenório Telles informou ao Grupo Rede Amazônica, por meio do g1 Amazonas, que o velório de Thiago de Mello ocorrerá no Palácio Rio Negro, Centro Histórico de Manaus, em horário a ser definido.
“A passagem do Thiago é uma perda irreparável para a cultura do nosso estado, para o país e para a literatura mundial. Ele fará muita falta pelos compromissos que ele tinha com a vida e com o ser humano”, declarou.
O governador do Estado, Wilson Lima, decretou luto oficial de três dias pela morte do poeta.
Thiago de Mello tornou-se nacionalmente conhecido na década de 1960 como um intelectual engajado na luta pelos Direitos Humanos, e manifestou em sua poesia o seu repúdio ao autoritarismo e à repressão.
Suas obras foram traduzidas para mais de 30 idiomas e o poema mais conhecido é ‘Os Estatutos do Homem’, onde ele chama a atenção do leitor para os valores simples da natureza humana
Além de ‘Estatutos do Homem’, o também tradutor possui outras poesias famosas como ‘Faz Escuro, mas eu Canto: porque a manhã vai chegar’, de 1966, e a prosa ‘Amazônia — A Menina dos Olhos do Mundo’, de 1992.
Leia ‘Os Estatutos do Homem’, de 1977:
Os Estatutos do Homem
(Ato Institucional Permanente)A Carlos Heitor Cony
Artigo I.Fica decretado que agora vale a verdade.
que agora vale a vida,
e que de mãos dadas,
trabalharemos todos pela vida verdadeira.
Artigo II.
Fica decretado que todos os dias da semana,
inclusive as terças-feiras mais cinzentas,
têm direito a converter-se em manhãs de domingo.
Artigo III.
Fica decretado que, a partir deste instante,
haverá girassóis em todas as janelas,
que os girassóis terão direito
a abrir-se dentro da sombra;
e que as janelas devem permanecer, o dia inteiro,
abertas para o verde onde cresce a esperança.
Artigo IV.
Fica decretado que o homem
não precisará nunca mais
duvidar do homem.
Que o homem confiará no homem
como a palmeira confia no vento,
como o vento confia no ar,
como o ar confia no campo azul do céu.
Parágrafo Único:
O homem confiará no homem
como um menino confia em outro menino.
Artigo V.
Fica decretado que os homens
estão livres do jugo da mentira.
Nunca mais será preciso usar
a couraça do silêncio
nem a armadura de palavras.
O homem se sentará à mesa
com seu olhar limpo
porque a verdade passará a ser servida
antes da sobremesa.
Artigo VI.
Fica estabelecida, durante dez séculos,
a prática sonhada pelo profeta Isaías,
e o lobo e o cordeiro pastarão juntos
e a comida de ambos terá o mesmo gosto de aurora.
Artigo VII.
Por decreto irrevogável fica estabelecido
o reinado permanente da justiça e da claridade,
e a alegria será uma bandeira generosa
para sempre desfraldada na alma do povo.
Artigo VIII.
Fica decretado que a maior dor
sempre foi e será sempre
não poder dar-se amor a quem se ama
e saber que é a água
que dá à planta o milagre da flor.
Artigo IX.
Fica permitido que o pão de cada dia
tenha no homem o sinal de seu suor.
Mas que sobretudo tenha sempre
o quente sabor da ternura.
Artigo X.
Fica permitido a qualquer pessoa,
a qualquer hora da vida,
o uso do traje branco.
Artigo XI.
Fica decretado, por definição,
que o homem é um animal que ama
e que por isso é belo.
muito mais belo que a estrela da manhã.
Artigo XII.
Decreta-se que nada será obrigado nem proibido.
tudo será permitido,
inclusive brincar com os rinocerontes
e caminhar pelas tardes
com uma imensa begônia na lapela.
Parágrafo único:
Só uma coisa fica proibida:
amar sem amor.
Artigo XIII.
Fica decretado que o dinheiro
não poderá nunca mais comprar
o sol das manhãs vindouras.
Expulso do grande baú do medo,
o dinheiro se transformará em uma espada fraternal
para defender o direito de cantar
e a festa do dia que chegou.
Artigo Final.
Fica proibido o uso da palavra liberdade.
a qual será suprimida dos dicionários
e do pântano enganoso das bocas.
A partir deste instante
a liberdade será algo vivo e transparente
como um fogo ou um rio,
e a sua morada será sempre
o coração do homem.
Thiago de Mello
*Com informações do g1 Amazonas