As galerias foram construídas no fim do século XIX e início do século XX, mas com o passar do tempo começaram a apresentar problemas na infraestrutura.
As galerias subterrâneas localizadas no Centro da cidade de Manaus, no Amazonas, foram construídas no fim do século XIX e início do século XX, para suprir as necessidades sanitárias da população que estava enfrentando dificuldades após os aterramentos que aconteceram durante o processo de “embelezamento” da cidade.
Com o passar do tempo e a expansão da cidade, as galerias começaram a apresentar problemas na infraestrutura. Em 2012, a cheia do Rio Negro, uma das maiores enchentes da história da capital amazonense, acabou comprometendo a estrutura das galerias.
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Até 2012, as galerias já haviam sido rompidas três vezes entre um período de nove anos, o que aumentou a preocupação das autoridades. Um dos incidentes aconteceu em novembro de 2004, quando uma cratera de 10 metros se abriu na esquina entre as avenidas Sete de Setembro e Eduardo Ribeiro.
Quatro anos depois, outra cratera se abriu, dessa vez na Rua Floriano Peixoto, em março de 2008. Já o terceiro incidente aconteceu em maio do mesmo ano, quando parte do calçamento da praça Adalberto Valle, entre as ruas Floriano Peixoto e Marquês de Santa Cruz, cedeu, colocando em risco a estrutura da calçada e o meio-fio, além do asfaltamento da Rua Marquês de Santa Cruz. Um poste teve que ser retirado do local porque corria o risco de cair.
Apesar das obras de recuperação, esses casos continuam acontecendo, como em abril deste ano, quando uma galeria na esquina entre a Avenida Sete de Setembro e a Avenida Eduardo Ribeiro se abriu na área. De acordo com a Secretaria Municipal de Infraestrutura de Manaus (Seminf), a antiga galeria dos ingleses rompeu e causou o afundamento.
O Portal Amazônia conversou com o diretor-presidente do Instituto Brasileiro de Avaliações e Perícias de Engenharia do Amazonas (Ibape/AM), Frank Albert Soares Araújo, para entender qual a atual situação das galerias.
“Temos que voltar um pouco para lembrá-los que são galerias que foram dimensionadas e construídas há mais de 100 anos. Quando Manaus tinha uma realidade completamente diferente da atual. Essas redes estão sofrendo pela falta de manutenção ao longo do tempo”,
alertou Frank Araújo.
Como foram feitas as galerias?
As galerias são feitas de tijolos cerâmicos maciços e foram projetados para atender 60 mil habitantes, área destinada a atender a população da época. O objetivo era de represar e drenar a água dos igarapés que foram aterrados na região hoje onde é localizado o Centro.
“Com o fenômeno da cheia, que é característico da nossa região, não é nada que nós não conheçamos, todos os anos irá ocorrer o fenômeno da cheia. Essa subida do Rio Negro represa a água do sistema de drenagem e ao represar essa água causa inundação do Centro, causando o alagamento”,
explicou Frank.
A problemática das estruturas
O crescimento da cidade, a construção de novos prédios e a ausência de manutenção das galerias, geraram uma série de problemas externos à infraestrutura do Centro. Para que as galerias fossem construídas, foi necessário realizar o aterramento de diversos igarapés, durante o fim do século XIX e início do século XX. Manaus estava passando por um processo de “embelezamento” da cidade, que se moldava aos padrões europeus de metrópole.
Por isso, durante o período da cheia, as áreas que ficam inundadas estão apenas recebendo as águas que retornam “ao seu local de origem”. De acordo com Frank Albert, devido ao fato das galerias terem sido dimensionadas pela realidade da época em que foi construída, não estão mais sendo eficientes nos dias atuais.
“Ao represar essa água da drenagem, essas galerias vão trabalhar 100% preenchidas. Com a sua capacidade em 100%, como elas são de uma metodologia construtiva antiga, essa água infiltra pelo solo e no momento que houver o fenômeno da vazante, essa água vai deixar de estar dentro do solo e esse solo vai se acomodar novamente e vai haver ruptura da rede de drenagem em alguns pontos. Isso é muito grave, porque muitas vezes esse rompimento pode acontecer como aconteceu ali na Rua Henrique Martins, pode ocorrer embaixo de edificações, que foi visto no início do ano passado, quando foi necessário a interdição e demolição de um prédio e no início deste ano, onde houve o desabamento do prédio ao lado, no mesmo ponto, na Rua Henrique Martins”,
comentou o diretor-presidente do Ibape/AM.
De acordo com o especialista, o ponto mais crítico atualmente está localizado na esquina da Avenida Sete de setembro com a Avenida Eduardo Ribeiro. Essa região está bem próxima da entrada das galerias, na parte mais profunda delas. Outro ponto crítico é a própria Rua Henrique Martins.
“O crescimento do Centro, novas construções, prédios, ligações clandestinas nessas redes e aumento considerável da contribuição de usuários para aquela rede. Então, nada disso foi previsto. Somado a isso a ausência de manutenção, com o tempo e principalmente agora nos últimos anos”, enumerou.
Além desses pontos, a região do terminal de ônibus próximo à Igreja Matriz – Catedral Metropolitana de Manaus Nossa Senhora da Conceição -, uma área que possui o terreno irregular, também sofre com a falta de manutenção das galerias. Em 2012, devido a cheia em que o Rio Negro acabou atingindo a marca de 29,97 metros, uma das maiores já registradas da história, acabou afetando as galerias que passam por baixo. Por conta disso, no dia 20 de junho de 2012, o Terminal da Matriz foi desativado temporariamente.
Outra preocupação apontada pelo diretor-presidente do Ibape/AM é em relação a execução do projeto de revitalização da área da praça da Igreja Matriz. Ele informa que há suposições sobre a forma como a área foi compactada e se poderia ter danificado a rede de drenagem. Por isso, o especialista destaca que a preocupação maior é realmente em relação à falta de manutenção dessa estrutura desde a sua construção.
A solução dos problemas
De acordo com Frank, ainda existe a possibilidade de ocorrer outro rompimento nas mesmas ou em outras áreas onde existem galerias subterrâneas.
“Como são galerias antigas, centenárias, tem que ser elaborado um plano de manutenção específico para esse tipo de galeria. Tem que haver também um trabalho de conscientização dos usuários, para pararem de jogar lixo no bueiro. Com a chuva, ela acaba levando esse lixo todo para dentro da rede e isso vai assoreando, vai diminuindo a capacidade de vazão dessa rede. Os tijolos das galerias são apoiados uns nos outros, então isso facilita a percolação da água [passagem de água pelo solo e rochas permeáveis fluindo para reservatórios subterrâneos] e pode gerar um problema mais a frente, o que já está acontecendo, na realidade. Então, tem que ser feita uma vistoria minuciosa e definida uma metodologia de manutenção”,
recomendou Frank Albert.
De acordo com o engenheiro, a melhor solução para esse tipo de galeria é com obras de túneis. Ele indicou que, guardada a devida proporção, seria necessário fazer uma camada de proteção interna nas galerias com função estrutural.
**Esta é a segunda parte da série ‘Galerias Subterrâneas de Manaus’, dividida em três reportagens. Confira a primeira parte: