Suframa exige gestão técnica com apoio político

A ZFM, diante da iminente possibilidade de vir a tomar corpo definitivo este ano a Reforma Tributária (RT), tem pesados desafios a enfrentar.

Durante os 56 anos da Zona Franca de Manaus (ZFM) que se completam no próximo dia 28, os momentos mais dramáticos vividos pela Suframa, em termos de gestão, foram exatamente aqueles em que o lado técnico-profissional perdeu espaço para interesses políticos partidários em relação à “ocupação da autarquia” como cota “de sacrifício” em favor da base aliada de governos. Quem vivenciou o cenário desde sua implantação tem a nítida noção dos divisores de água que então se desenharam. 

Efetivamente, quando, sob controle de grupos partidários alheios aos interesses da região, a Suframa, com o nome manchado, chegou a ser levada ao fundo do poço. Do que são exemplos: os crimes do “colarinho verde”, da “máfia do açúcar”, da compra e venda de cotas de importação. Tais escândalos proliferaram em tal intensidade e gravidade que chegaram a pôr em risco a própria sobrevivência da autarquia, como extintas foram em 2001, por medida provisória do governo FHC, a Sudam e a Sudene.

A ZFM, diante da iminente possibilidade de vir a tomar corpo definitivo este ano a Reforma Tributária (RT), tem pesados desafios a enfrentar. E para tal precisa de gestores com pleno conhecimento das idiossincrasias geopolíticas da região e da necessidade de promover ajustes ao modelo, hoje tecnológica e comercialmente distante do mundo globalizado. A RT exige análise cautelosa, porém corajosa e inovadora, por parte de autoridades técnicas, das quais se exige, adicionalmente, sólidos conhecimentos do sistema tributário nacional, da legislação de incentivos e que sejam dotados de visão desenvolvimentista.

Foto: Isaac Júnior/Suframa

Que o assunto é espinhoso não há dúvida. Que expõe as fragilidades do modelo arquitetado no DL 288/67, tornando-o indefeso ante qualquer tipo de ameaça à sua integridade institucional, não há como evitar. Sobretudo devido sua matriz econômica estribar-se sobre o mesmo modelo econômico – de substituição de importações – vigente em 1967. Concretamente, só despertamos para tais fragilidades quando graves obstáculos surgem, a exemplo da Reforma Tributária que deverá se processar neste exercício. Cruel o impasse: como excepcionalizar a ZFM, que detém um pouco mais de 400 fábricas no PIM diante de poderosos interesses do setor industrial brasileiro e da própria sociedade que almeja livrar-se de um sistema tributário draconiano e ineficaz?

Tivesse o governo, há 30/40 anos, incentivado a diversificação econômica via exploração dos minerais estratégicos abundantes em nosso solo; da produção madeireira via manejo florestal sustentável, do turismo ecológico, da produção de alimentos, da exploração das nanotecnologias biológicas, a ZFM não estaria hoje mais uma vez a mendigar favores muito difíceis de serem satisfeitos. Mais grave ainda: o modelo arrima-se numa monocultura industrial sustentada por sete cadeias produtivas que respondem por cerca de 93% do faturamento do PIM. A ZFM continua aguardando projeto inovador de ajuste de sua matriz econômica ao mundo globalizado 4.0.

Enquanto isso, agrava-se o quadro socioeconômico do interior, que, decorridos 56 anos, continua pendente de políticas públicas de forte impacto nos setores econômicos, sociais, educacionais e culturais. O cenário conjuntural é desalentador: 47 % da população amazonense encontra-se em estado de pobreza, ao tempo em que a capital e as sedes municipais sofrem incessante processo de êxodo rural e as zonas rurais não alcançam níveis satisfatórios de produção agropecuária. Em síntese, desde a abertura da economia decretada pelo governo Collor de Mello, em 1992, a ZFM deveria ter dado o grande salto, processado as reformas recomendadas pela comunidade técnica local e por meio dos estudos realizados pelo IPEA, em 1995, e o Núcleo de Estudos e Pesquisas do Senado Federal, em 2013. Suas deformações institucionais já àquela altura saltavam aos olhos.

Recomendar a revisão do modelo econômico, para certos líderes políticos e empresariais da época, contudo, equivalia a crime de lesa-pátria. Como dito por Winston Churchill: “He who fails to plan is planning to fail“.

Sobre o autor

Osíris M. Araújo da Silva é economista, escritor, membro do Instituto Geográfico e Histórico do Amazonas (IGHA), da Academia de Letras, Ciências e Artes do Amazonas (ALCEAR), do Grupo de Estudos Estratégicos Amazônicos (GEEA/INPA) e do Conselho Regional de Economia do Amazonas (CORECON-AM).

*O conteúdo é de responsabilidade do colunista

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