Foto: Reprodução/Greenpeace
Por Osíris M. Araújo da Silva – osirisasilva@gmail.com
Em editorial publicado no início de outubro, o Estado de S. Paulo fez pertinente análise da questão ambiental, salientando que, pressionado por governos, associações comerciais e produtores, a Comissão Europeia adiou em um ano a implementação de sua Lei Anti Desmatamento, que proíbe a comercialização de produtos de áreas desmatadas após 2020. É um alívio não só para o Brasil, mas para países diversos, dos EUA à China, além de nações latino-americanas, africanas e do Sudeste Asiático. O governo brasileiro tem um ano para trabalhar com produtores nacionais em busca de adaptação às regras, mas, sobretudo, para mobilizar sua diplomacia a se alinhar com outras partes interessadas ao redor do mundo e pressionar a Comissão Europeia: “o problema não é só, como ela alega, o prazo para a adequação às regras, mas os excessos dessas regras”.
A Lei europeia não distinguia entre desmatamento legal e ilegal, como previsto nas leis brasileiras. Na verdade, nosso Código Florestal é uma das legislações mais equilibradas e restritivas do mundo. Fazendeiros instalados na Amazônia são obrigados a manter a cobertura original de 80% de suas propriedades – nos outros biomas, esse porcentual é de 50%, sem serem remunerados pelos serviços ambientais prestados ao país. Segundo o IBGE, no Brasil, 66% do território é coberto por vegetação nativa, na Amazônia a cobertura é de 83%. Enquanto isso, na Europa, as reservas não ultrapassam, em média, 2% das áreas disponíveis, o que se pode constatar a olho nu. A agricultura brasileira ocupa apenas 10% do território, e, pelos critérios da ONU, tem baixo nível de emissões de CO2.
No que pertine ao bioma amazônico, particularmente, em novembro de 2023 os pesquisadores do Inpa, Charles Clement e Henrique Pereira, diretor do Instituto; Alfredo Oyama Kingo Homma, da Embrapa Amazônia Oriental, e Ima Vieira (Museu Goeldi) traçaram, em importante estudo, algumas considerações sobre o enigma bioeconomia e sua valorização econômica e social. O “paper” foi enviado ao Grupo de Trabalho da Sociobioeconomia, do MMA, e uma versão em inglês ao jornal holandês “Trees, Forests and People”, especializado em publicações (ciência e prática) relacionadas a recursos florestais. Conceitualmente, “parte do princípio de que a Amazônia está no centro das atenções mundiais em face dos altos índices de desmatamento e suas consequências ambientais”.
O documento enfatiza que “muitas propostas de desenvolvimento local baseadas nas cadeias de valor da bioeconomia florestal levam em conta a continuidade e a expansão do extrativismo de produtos da floresta, sem reconhecer as limitações deste sistema de produção nem seus impactos sobre o sistema capitalista observáveis quando a demanda do mercado consumidor aumenta”. Com efeito, “em um bioma com extensão continental como a floresta amazônica este é um desafio de grandes proporções”. Consideram que “a expansão de uma bioeconomia florestal associada à conservação do bioma requer atenção às pessoas do meio rural, tão importantes quanto a dimensão da biodiversidade, frequentemente esquecidas nas discussões”.
Os pesquisadores salientam a especial relevância de produtos alimentícios oriundos das florestas e defendem que políticas públicas e investimentos em Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) “têm papel primordial no fortalecimento da bioeconomia no conjunto da sociobiodiversidade amazônica”. De sua efetiva implementação e avaliação de resultados derivam “a infraestrutura adequada para o desenvolvimento de novos produtos, garantia de preços mínimos, a valorização dos serviços ambientais prestados pelos povos tradicionais, a certificação de produtos, a busca de soluções técnicas e tecnológicas para aprimorar a produção com conservação e o melhoramento das plantas amazônicas potenciais, dentre outras iniciativas”. Em síntese, cabe à pesquisa apontar à instância política caminhos seguros para o desenvolvimento sustentável do bioma.
O fundamental a levar em conta no contexto da análise, entretanto, é reconhecer a extrema limitação da interação dos órgãos de ensino, pesquisa e extensão voltados a prover novos conhecimentos, produtos, processos e serviços para os setores industrial e agropecuário regional e brasileiro. É amplamente sabido que o trabalho de pesquisa realizado em profundidade, foco, comprometimento com as demandas da região e governança do sistema (de baixo nível) em articulação com entidades nacionais e estrangeiras líderes em cada setor são condições essenciais à otimização de investimentos públicos e em parcerias público-privadas tendo em vista a consecução desses objetivos.
Articulações, eficiência, produtividade são fatores que movem a ciência, baseada em informações e soluções que levam ao aumento da competitividade e sustentabilidade da economia. O que significa afirmar, por outro lado, a extrema necessidade de buscar parcerias públicas e privadas para pesquisa, criação, desenvolvimento, compartilhamento de infraestrutura visando manter um portfólio de ativos disponíveis para parcerias em diferentes estágios de maturidade tecnológica. Em síntese, são inúmeras as modalidades e as oportunidades para a inovação. Neste exato ponto é que se verifica o quanto o setor de pesquisa, desenvolvimento e inovação encontra-se distanciado, aqui e no Brasil, de nosso setor produtivo. Ao contrário do que ocorre na China, Japão, Coreia do Sul, União Europeia, Reino Unido e Estados Unidos.
Sobre o autor
Osíris M. Araújo da Silva é economista, escritor, membro do Instituto Geográfico e Histórico do Amazonas (IGHA) e da Associação Comercial do Amazonas (ACA).
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