Povo Akroá-Gamella durante a celebração do Ritual de Bilibeu. Foto: Ana Mendes
Rituais indígenas são manifestações milenares que celebram a vida, os costumes e a conexão entre o mundo espiritual e natural dos povos originários. As práticas consistem em danças, pinturas corporais e diversas práticas de adoração aos deuses e envolvem todos os pertencentes desses grupos.
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No interior do Maranhão, os indígenas da etnia Akroá-Gamella celebram anualmente, no dia 30 de abril, o ritual de Bilibeu, tradicional festa que consiste numa caminhada coletiva que percorre todo o território do grupo, como uma forma de agradecimento ao São Bilibeu, o santo que concede fertilidade à terra e proteção àquele povo. Toda a comunidade indígena se mobiliza na celebração e que dura geralmente quatro dias.
Quem é Bilibeu?
Também conhecido por Bilibreu ou Oracio, Bilibeu é uma entidade cultuada pelo povo Akroá-Gamella e simboliza fertilidade e resistência pela terra. Reza a lenda que Bilibeu foi encontrado durante uma queima de lavoura dentro da área territorial daquele povo, por conta disso, contos antigos remetem o santo como o protetor das terras, o milagreiro da cura e responsável por fecundar as mulheres.
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O ritual de Bilibeu
Tradicionalmente, o ritual de Bilibeu começa com a busca do mastro enfeitado com frutas e levantado com uma bandeira no topo. Após isso, os indígenas se reúnem para definir quem será a onça, o gato-maracajá e o cachorro-chefe, responsáveis pela coordenação da chamada “corrida dos cachorros de Bilibeu”: a marcha que percorre todas as aldeias do território Taquaritiua.

Pintados de preto-Jenipapo, vermelho-Urucum e preto-carvão, dezenas de corredores incorporados dos “filhos de Bilibeu”, saem em busca de caças como galinhas, patos, porcos e outros tipos oferecidos à entidade. Os caçadores buscam comida e bebida para oferecer ao santo.

As caças, quando aves, são jogadas para o alto, atiçando os “cachorros” que executam um ritual de presa e morte e sendo estraçalhadas numa disputa de presas. O cachorro vencedor corre, carregando na boca, a cabeça da ave que conquistou.
Garrafas de conhaque ou de cachaça são enterradas no chão para serem encontradas por eles. As caças podem ser também refrigerantes, que são dados às crianças, tidas como os cachorrinhos de Bilibeu.

Simbologia
De acordo com a lenda, Bilibeu se alimenta através dos seus “cães”, nutridos das oferendas dadas pelos donos das casas.
Na corrida, considerada o ápice do Ritual de Bilibeu, os presentes do santo são jogados aos ares ou enterrados para que os cachorros, com suas patas, encontrem.

Durante todo o ritual, os indígenas dão voltas, jogam água em si mesmos, se amontoam ao chão, rolam, se lambuzam de terra e lama, emitem grunhidos e latidos. E é assim que a festa preserva, dentro de suas características, um ritual no qual os brincantes, ao pintar seus corpos, dar seus gritos e piques, se reencontram com uma identidade silenciada por décadas.

Contos antigos relatam, ainda, que a corrida dos cachorros de Bilibeu também representa um rito de passagem para as crianças Akroá-Gamella.

Celebrada antigamente no período do carnaval, a data do ritual se remete ao ano de 2017, quando o povo Akroá-gamella sofreu o pior massacre da sua história.
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Na ocasião, pistoleiros, grileiros e fazendeiros da região de Viana atentaram violentamente contra o grupo indígena, resultando em mais de vinte feridos, fato que ficou conhecido como o “Massacre dos Akroá-gamella”.
Após a corrida, é realizado um momento de cantorias ao som dos maracás para Bilibeu e João Piraí. À noite, a sentinela na casinha de reza representa, simbolicamente, o adoecimento, a morte e a ressurreição de Bilibeu. O ritual é finalizado com a derrubada do mastro.
