Quatro novos sítios arqueológicos são catalogados no município de Anajás, no Pará

Museu Goeldi e IPHAN catalogaram peças de cerâmica marajoara expostas devido ao processo de erosão e seca ao leste do Marajó

Pesquisadores e técnicos do Museu Paraense Emílio Goeldi (MPEG) e do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) identificaram novos sítios arqueológicos no município de Anajás (PA), no arquipélago do Marajó. Dois dos registros ocorreram na comunidade da Pedra e outros dois na comunidade Laranjal. 

A ação conjunta foi organizada após a provocação da comunidade que acionou o Ministério Público do Estado do Pará e demais órgãos para que fosse analisado o estado de conservação dos artefatos de cerâmica indígena que ficaram expostos após a recente seca na região do Alto Rio Anajás.

A equipe do Museu Goeldi é liderada pela pesquisadora Helena Pinto Lima e conta ainda com o apoio técnico de Erêndira Oliveira, Nilson Borges e Chayenne Furtado. Os técnicos do Plano Diretor do município, Rossimar Soares e Ouripson Félix; e os arqueólogos Carlos Barbosa e Denise Rosário de Carvalho, do IPHAN, também participaram da operação que teve como principal resultado a catalogação dos sítios que não constavam no Cadastro Nacional de Sítios Arqueológicos (CNSA). De acordo com a legislação federal, toda descoberta de bens dessa natureza deve ser registrada no CNSA.

Helena Lima lembra que a região já foi alvo de pesquisas científicas nas últimas décadas. Ela e Carlos Barbosa integraram a equipe do projeto de doutorado da antropóloga Denise Pahl Schaan (1962-2018), que atuou tanto no Museu Goeldi quanto na Universidade Federal do Pará, e deixou uma coleção arqueológica sob cuidados da secretaria de cultura do município.

A missão emergencial em Anajás é classificada como um “reencontro com emoções” pelos pesquisadores ao mesmo tempo em que instiga e indica novos desafios para a pesquisa relacionada aos povos marajoaras.

Foto: Ouripson Felix

“Os novos achados são importantes para a arqueologia amazônica. Encontramos nesta breve visita um padrão de ocorrência de tesos (aterros construídos pelos povos do Marajó) que aparentemente se replica ao longo do Anajás e outras regiões a leste do Marajó. Talvez aqui estejamos no que foi o início de organização regional de uma sociedade com altíssimo conhecimento do ambiente, que criou e replicou sistemas de assentamentos altamente interconectados. Trata-se de um verdadeiro urbanismo amazônico muito antigo”, 

explica a pesquisadora.

A cerâmica marajoara sempre esteve no centro dos debates sobre complexidade social na Amazônia. Esse patrimônio tem sido pesquisado desde o século XIX, sobretudo na região chamada “Marajó dos Campos”, onde predominam as planícies alagadas. 

Os estudos indicam que essa área já era habitada há cerca de 3.500 anos por grupos que tinham como principais atividades a caça, a pesca, a coleta e o cultivo da mandioca. Pesquisas arqueológicas mostram ainda que essas sociedades foram responsáveis pela produção em cerâmica de uso principalmente doméstico, além do manejo ecológico dos recursos naturais expresso nos tesos, por exemplo.

Leia também: Indígenas do arquipélago do Marajó marcam gerações com a confecção de cerâmicas artísticas

Proteção do patrimônio 

Outra contribuição da vistoria emergencial em Anajás foi a averiguação do grau de vulnerabilidade dos sítios arqueológicos. As informações coletadas permitiram identificar riscos relacionados a fenômenos naturais, como a dinâmica de secas e cheias que tem se tornado mais intensas, assim como o impacto do trafego intenso de embarcações na área, que acaba contribuindo para processos erosivos.

“O risco hoje é perder as informações que ainda existem nesses sítios devido à dinâmica erosiva do rio intensificada pelas mudanças climáticas. Na curva do rio, um dos cemitérios indígenas está sendo exposto e levado pela força das águas”, alerta o arqueólogo Carlos Barbosa, que defende a expansão dos estudos no local.

“Isso torna necessário que medidas sejam tomadas em direção à pesquisa científica. O potencial arqueológico observado durante a vistoria técnica dessa área está fora da região anteriormente pesquisada e, considerando as tecnologias de hoje, é uma região que merece atenção”, 

afirma.

Apesar disso, a equipe ressalta que um fator que deve contribuir para a preservação do patrimônio arqueológico é o grande interesse da comunidade em fortalecer o conhecimento sobre a memória e os povos originários da região. Para isso, as instituições reforçam que qualquer descoberta desse tipo deve ser comunicada ao IPHAN e que não é recomendado coletar vestígios sem acompanhamento profissional.

“As pessoas com quem estivemos, na cidade e nas comunidades, mostraram interesse em conhecer mais e também em preservar os achados, o que é um excelente indicativo. Houve até manifestação em relação ao desejo de terem um museu em Anajás, onde esses achados pudessem ser informados ao público”, destaca Helena Lima.

Tecnologia na pesquisa arqueológica 

Foto: Chayenne Furtado

Durante a vistoria, a comunidade, que fica em uma área acessada somente por transporte aquático, foi mapeada com uso de um drone com sensor LiDAR (sigla em inglês para Light Detection And Ranging). Esta tecnologia permite o sensoriamento remoto e a geração de imagens tridimensionais a partir de pulsos de luz no espectro infravermelho, sendo assim de grande aplicabilidade no campo da Arqueologia. O equipamento foi adquirido por meio do projeto “Parque analítico do Museu Goeldi”, com apoio da Financiadora de Estudos e Projetos (FINEP).

“A tecnologia permite visualizar através de nuvens de pontos analisar diversos cenários em 3D, podendo extrair informações como: modelos de elevações e superfícies, curvas de níveis, biomassa, entre outros. Diversos mapeamentos já foram realizados pelo drone do MPEG com resultados positivos para o avanço de novas descobertas e pesquisa”, pontua o técnico em geoprocessamento Nilson Borges.

Referência: Schaan, Denise Pahl; Martins, Cristiane Pires (orgs). Muito além dos campos: Arqueologia e história na Amazônia Marajoara. GKNORONHA, Belém, 2010. Disponível em: https://portal.iphan.gov.br/uploads/publicacao/PubDivArq_MuitoAlemCampos_m.pdf

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Natural da cidade de Ponta de Pedras, na Ilha do Marajó, ele era conhecido como o roqueiro mais antigo do Brasil.

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