Pesquisa avalia riscos para a distribuição de espécie de primata amazônico

Macaco-de-cheiro da cabeça preta da espécie Saimiri vanzolinii. Foto: Marcelo Santana/Instituto Mamirauá

Um pequeno primata da Amazônia, o macaco-de-cheiro da cabeça preta (Saimiri vanzolinii), encontrado apenas na Reserva de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá, está preocupando pesquisadores. O motivo é que os indivíduos dessa espécie vivem restritos a uma pequena área, de 870 quilômetros quadrados (km²), na unidade de conservação. Os pesquisadores acreditam que o local de ocorrência da espécie vem reduzindo ao longo dos anos, o que pode levar, consequentemente, à diminuição da sua população.

As pesquisas desvendaram que, diferente do que ocorre em outras regiões da Amazônia, ou com outras espécies, as barreiras para a dispersão de Saimiri vanzolinii para outras regiões não são físicas, mas ecológicas. Umas das explicações relaciona-se à diferença na estrutura de floresta e disponibilidade de recursos utilizados para alimentação.

A pesquisadora do Instituto Mamirauá, Fernanda Paim, explica que são três espécies de macaco-de-cheiro vivendo na região. A hipótese dos pesquisadores é que as outras duas espécies, que ocorrem em maior abundância, poderiam estar pressionando a população do macaco-de-cheiro da cabeça preta.

“Em algum momento da história evolutiva dessas espécies, os animais entraram na várzea da Reserva Mamirauá e eu acredito que, de alguma forma, eles estão pressionando Saimiri vanzolinii, o que a longo prazo pode comprometer o tamanho de sua área de distribuição geográfica, podendo levar a espécies à extinção. É uma hipótese, que não podemos provar ou testar. Mas esse seria um caso de extinção natural”, disse Fernanda.

Fernanda explica que, durante a pesquisa, foi observado que há uma delimitação clara entre a área de ocorrência das três espécies na Reserva Mamirauá. Os pesquisadores imaginavam que os rios atuariam como barreiras geográficas, separando os limites de distribuição de cada espécie, mas são outros fatores que parecem estar limitando a distribuição. Então, a hipótese que surgiu era: se existe uma separação, uma área bem delimitada, qual é a causa? Na Reserva Mamirauá, a causa foi uma questão ecológica”, explicou.

Fernanda ressalta que a área de ocorrência de uma espécie é um dado importante para traçar estratégias de conservação. O macaco-de-cheiro da cabeça preta é classificado como vulnerável à extinção pela União Internacional pela Conservação da Natureza (IUCN, em inglês). Como a sua área de ocorrência está limitada a uma unidade de conservação, a partir de informações como da dieta e ecologia dessa espécie, poderiam ser sugeridas adequações ao plano de manejo da área, de acordo com a pesquisadora.

“Eu considero essa unidade de conservação um sítio biogeográfico muito importante para os macacos de cheiro. É um local de alguma forma especial. Porque três espécies (das sete conhecidas) conseguiram se adaptar e viverem juntas nessas áreas”, contou Fernanda.

O estudo demonstrou que os animais das três espécies utilizam de forma diferente o ambiente e os recursos naturais presentes no local. A ocorrência das três espécies foi avaliada em três diferentes habitats na área da Reserva: várzea alta, várzea baixa e chavascal. Os três ambientes se caracterizam como distintos tipos florestais e contêm diferentes características, mas uma semelhança: são sazonalmente alagadas em função da variação do nível do rio.

Foi observado na pesquisa que os indivíduos de macaco-de-cheiro de cabeça preta têm preferência pelo chavascal, em relação aos outros habitats. “Os chavascais da área de S. vanzolinii possui uma maior riqueza de espécies de árvores, quando comparado ao mesmo tipo florestal para a área das outras espécies de Saimiri”, de acordo com Fernanda.

Outro ponto interessante observado, como descreve a pesquisadora, é a grande presença de lianas na área de ocorrência do animal dentro dos três habitats. As lianas são um tipo de cipó muito utilizado por esses animais para alimentação. “Pode ser que esses dois fatores estejam interferindo na distribuição da espécie. Então, de alguma forma, essa região onde a espécie está restrita, apesar de ser tão pequena, oferece o que é necessário para ele viver. O que separa a distribuição deles não são rios, mas sim diferenças na estrutura de floresta e oferta de recursos, que são necessários para que a espécie possa sobreviver”, comentou a pesquisadora.

Essa pesquisa é parte do projeto de doutorado de Fernanda Paim na Universidade Federal de Minas Gerais, com recursos da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) no programa de doutorado sanduíche, realizado em parte na McGill University, no Canadá.

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