O Rio Negro, em Manaus (AM), voltou a encher após atingir o recorde histórico de 12,11 metros, sendo o nível mais baixo já registrado desde o início do monitoramento em 1902. Após três dias de estabilidade, o rio apresentou um aumento de dois centímetros, com elevações de um centímetro no domingo (13) e na segunda-feira (14), chegando a marca de 12,13.
Ao Grupo Rede Amazônica, a pesquisadora Jussara Cury, do Serviço Geológico Brasileiro (SGB), antiga CPRM, explicou que o Rio Negro está entrando em uma fase de estabilidade, mas que ainda continua no processo de vazante.
“Agora o Rio Negro está passando por uma redução na intensidade de descida, apresentando certa estabilidade e até pequenas elevações. Mas ainda não é o final da estiagem, porque a gente precisa das chuvas consistidas e distribuídas tanto na região de cabeceira quanto na parte central da bacia”, esclareceu.
Ainda quinta-feira (10), o nível do rio tinha se estabilizado na capital, pela primeira vez, após 104 dias seguidos de descida das águas. Entre quinta (10) e sábado (12), o nível do rio permaneceu em 12,11 metros.
Nesse intervalo, o Rio Negro o rio atingiu 12,68 metros, em 3 de outubro de 2024, ultrapassando o recorde do nível mais baixo já registrado. De acordo com o Serviço Geológico do Brasil (SGB), a marca se configura como a pior seca da história de Manaus pelo segundo ano consecutivo.
Em 2024, a descida dos rios no Amazonas começou antes do esperado. Em Manaus, o período da seca teve início em 17 de junho, apresentando oscilações até o dia 28, quando iniciou a descida de forma ininterrupta. Historicamente, o fenômeno ocorre entre a última semana de junho e as primeiras semanas de julho.
Devido à estiagem, a Prefeitura de Manaus decretou situação de emergência por 180 dias e interditou a Praia da Ponta Negra, após o rio ultrapassar a cota mínima de segurança de 16 metros.
Números da seca no Amazonas
Além da capital, os 61 municípios do Amazonas também enfrentam uma situação de emergência devido à seca. Segundo a Defesa Civil, todas as calhas de rios do estado estão em estado crítico de vazante.
Em Manacapuru, o Rio Solimões enfrenta a pior seca de sua história. Lá, a cota chegou a marcar 2,06 metros no sábado (12). Embora o rio tenha subido um centímetro no domingo (13), se manteve estável nesta segunda (14) com a marca de 2,07 metros.
Já no Alto Solimões, em Tabatinga, a situação foi ainda pior, com o rio registrando uma cota negativa. No dia 26 de setembro, o Solimões atingiu a marca histórica de -2,54 metros.
O Ministério da Integração e do Desenvolvimento Regional (MIDR), por meio da Defesa Civil Nacional, autorizou, no dia 14 de outubro, o repasse de R$ 19,8 milhões para ações de resposta e recuperação em localidades atingidas por desastres. Serão atendidos municípios nos estados do Amazonas, Pará, Rio Grande do Sul, Rondônia e Tocantins.
As portarias com os repasses foram publicadas no Diário Oficial da União (DOU):
Estado de Tocantins: R$ 3.821.705,20
Estado do Rio Grande do Sul: R$ 11.773.190,88
Município de Beruri (AM): R$ 540.804,00
Município de Careiro (AM): R$ 1.753.360,00
Município de Espigão D’Oeste (RO): R$ 955.256,95
Município de Aveiro (PA): R$ 1.010.626,80
Como solicitar recursos
Municípios que tiverem o reconhecimento federal de situação de emergência ou estado de calamidade pública podem solicitar recursos ao MIDR para ações de defesa civil. As solicitações devem ser realizadas por meio do Sistema Integrado de Informações sobre Desastres (S2iD).
A partir dos planos de trabalho enviados, a equipe técnica da Defesa Civil Nacional avalia as metas e valores propostos. Após a aprovação, os repasses são formalizados por meio de portaria no DOU, liberando os valores correspondentes.
Capacitação para agentes de defesa civil
A Defesa Civil Nacional também oferece uma série de cursos a distância para capacitar e qualificar agentes municipais e estaduais no uso do S2iD. O objetivo é preparar os profissionais das três esferas de governo para responderem de forma eficiente às situações de emergência. Confira aqui a lista completa dos cursos.
Em 2024, todos os municípios do Amazonas enfrentam uma situação de emergência devido à seca. Segundo a Defesa Civil, todas as calhas de rios do estado entraram em estado crítico de vazante este ano.
Em Manacapuru, o Rio Solimões também enfrenta a pior seca de sua história. Lá, a cota chegou a marcar 2,06 metros no sábado (12). Embora o rio tenha subido um centímetro no domingo (13), se manteve estável na segunda (14) com a marca de 2,07 metros.
Com este cenário preocupante, o Greenpeace Brasil realizou um manifesto no leito seco do Rio Solimões, em Manacapuru. O objetivo da ação foi denunciar os impactos da seca extrema deste ano para as populações vulneráveis.
Confira o texto escrito por Beatriz Campelo, ativista socioambiental e voluntária do Greenpeace Brasil, que esteve presente no protesto:
“Moro no Norte do Brasil, na capital do Amazonas, Manaus. Durante esse período de verão amazônico, participei de atividades de mobilização do Greenpeace Brasil em Manacapuru, com foco na estiagem e seca no estado. Atravessar boa parte do Rio Solimões a pé, em uma área que deveria estar coberta por água, mas que agora se transformou em um “deserto” de areia, foi uma experiência assustadora.
A situação no Amazonas é devastadora, especialmente para quem vive aqui! Estamos acostumados com rios abundantes, que são de extrema importância para nós. Eles são mais do que caminhos de água; por meio deles, ocorre o acesso à educação, saúde, transporte de alimentos, remédios e mercadorias para milhões de pessoas.
Mas, isso está se tornando cada vez mais difícil devido à seca extrema que estamos presenciando, comprometendo o acesso a recursos básicos para as populações mais vulnerabilizadas.
Em Manacapuru, tive uma experiência profundamente marcante ao presenciar as cruéis consequências da seca no ecossistema amazônico. Durante nossa caminhada, vimos muitos animais mortos, incluindo peixes de várias espécies, cobertos pela areia do “deserto” que se formou onde antes existia o rio.
A cidade que queremos para nós e para todos precisa ser construída! É urgente que os governos (federal, estaduais, distrital e municipais) e os legisladores priorizem a elaboração e implementação de planos de adaptação aos eventos climáticos extremos. Esses planos são essenciais para mitigar os efeitos da crise climática em nossos territórios e para criar cidades mais justas e seguras, especialmente para as populações vulneráveis, que são as mais afetadas seja por secas, fumaça e/ou enchentes.
Se você se preocupa com os impactos das mudanças climáticas na sua vida, junte-se a nós. Assine a petição do Greenpeace Brasil, que exige ações efetivas dos governos e legisladores para enfrentar as mudanças climáticas!”.
*O conteúdo foi originalmente publicado pelo Greenpeace
Na Colômbia existem alguns modelos de automóveis que conseguiram entrar na vida de muitas famílias e têm um grande significado emocional. Seu design, praticidade, robustez mecânica, versatilidade e outros atributos fizeram desses carros um verdadeiro símbolo da história automotiva nacional. Conheça:
Toyota Land Cruiser Série 40
Há mais de 60 anos, este veículo off-road japonês chegou à Colômbia e o fez para se estabelecer como o rei das trilhas. Inicialmente vieram algumas unidades do primitivo JF25, mas sua consolidação veio com a série 40 que estreou em 1960 e vigorou por mais de duas décadas até sua saída do mercado nacional em 1984.
O primeiro Toyota Land Cruiser Série 40 chegou à Colômbia em outubro de 1959. Era um veículo sólido e barulhento, projetado para levar seus ocupantes aonde quisessem. Em muitas famílias colombianas existia um, tornando-se um carro muito desejado. Sua estrutura robusta com suspensão a molas, caixa de redução e tração nas quatro rodas, tornou-o sinônimo de confiabilidade e longevidade.
Com o tempo, o Toyota Land Cruiser Série 40 tornou-se um ícone, não só pela sua robustez e capacidade de enfrentar os terrenos mais difíceis, mas também pelo seu lugar na cultura colombiana onde muitos o consideram um símbolo de aventura e resistência.
Jeep Willys
O Jeep Willys é um dos carros mais icônicos da Colômbia. Sua presença na região cafeeira é um símbolo da força dos agricultores do nosso país. Há mais de 74 anos abre estradas e transporta café, banana e passageiros. É conhecido como Yipao e faz parte da paisagem folclórica da região cafeeira.
Este carro clássico foi um veículo de uso militar originado na Segunda Guerra Mundial. As primeiras unidades chegaram à Colômbia em 1946 e foram adquiridas por produtores renomados da região cafeeira. Seu significado é tão importante na Colômbia que em 2006 foi quebrado o Recorde do Guinness com a “Maior Caravana de automóveis da mesma marca” e também fez parte da inauguração do Túnel da Linha.
O Willys é ideal para caminhar entre montanhas e trilhas que fazem parte do nosso patrimônio nacional e que ainda se mantêm nos setores com maiores percentagens de produção de café como Risaralda, Antioquia e Sierra Nevada de Santa Marta.
Renault 4
O Renault 4 foi o fiel amigo e protagonista indiscutível dos icônicos carros colombianos. Em 2020, a empresa comemorou 50 anos de história e foi considerado um carro muito popular na Colômbia, durante as décadas de 70 e 90, quando foi produzido na fábrica da montadora de mesmo nome, em Envigado.
Segundo a revista virtual “El Carro Colombiano” devido à sua grande capacidade de carga, as pessoas o utilizavam tanto como veículo familiar quanto como transporte de mercadorias, já que este carro tinha um preço confortável na época, o que ajudou a prolongar sua comercialização durante 22 anos. Além disso, marcou o crescimento econômico do país e foi produto de um avanço industrial na Colômbia.
Algumas pessoas o chamam de “o eterno amigo”, enquanto outros se lembram dele com carinho como o veículo icônico de muitas famílias colombianas que possui grande valor emocional. Quem o teve garante que foi um carro resistente que acompanhou muitos momentos, considerado hoje um símbolo nacional.
Fusca
Este modelo alemão é um dos mais icônicos, não só da Colômbia, mas de todo o mundo. Começou a ser fabricado em 1938 e durante os seus quase 81 anos de história foi um dos veículos mais vendidos e o que permaneceu em produção por mais tempo. Os consumidores o apelidaram de besouro devido à sua grande semelhança com esses insetos.
O Volkswagen Beetle chegou à Colômbia em 1952 através da Caribbean Motor Holding Company. Uma de suas principais características é o motor na traseira e o porta-malas na dianteira, além do bom desempenho mesmo em subidas. No nosso país foi popular nas primeiras corridas internacionais do automobilismo, disputando provas como o Circuito Central e o Doble a Sogamoso.
O fusca é admirado pelo seu design. Muitos têm uma história com isso e muitos tiveram um próximo, seja porque o tio tinha um, o avô ou um amigo próximo. Sem dúvida, entrar no Fusca é entrar numa máquina do tempo que, com o seu aparecimento, nos transporta ao passado e às memórias de família.
A Coleta Seletiva em Porto Velho (RO) tem o objetivo de melhorar a gestão de resíduos e contribuir para um meio ambiente mais sustentável. A iniciativa está dividida em duas modalidades: a Coleta Seletiva Convencional e a Coleta Seletiva Solidária.
A Coleta Seletiva Convencional abrange 12 bairros da cidade e ocorre em dias específicos, conforme a programação que pode ser consultada aqui. A população é incentivada a colocar os materiais recicláveis na calçada nos horários definidos: 7h, 14h e 18h. Os moradores devem separar os resíduos em dois grupos: Lixo Seco, que inclui papel, plástico, vidro e metal; e Lixo Úmido, composto por restos de alimentos e outros materiais não recicláveis.
Por outro lado, a Coleta Seletiva Solidária se concentra em condomínios e instituições públicas, direcionando os materiais coletados diretamente para cooperativas e associações de catadores. Essa abordagem não apenas auxilia na destinação adequada dos resíduos, mas também fortalece a economia local, promovendo oportunidades de trabalho e renda para os catadores.
Cada bairro tem sua programação de dias e horas definidas. É necessário que cada morador esteja informado da programação do seu bairro. O lixo deve ser embalado em sacos plásticos devidamente lacrados e mantidos dentro da residência, sendo levado para lixeira somente no dia da coleta no bairro, para evitar que o lixo seja mexido por pessoas ou animais. O mesmo não será recolhido se estiver fora do saco plástico.
Passo a passo da separação
O primeiro passo é ter em casa dois recipientes distintos e claramente identificados: um destinado ao ‘Lixo Úmido’ e outro ao ‘Lixo Seco’.
No recipiente para o ‘Lixo Seco’, que deve ser em saco de cor azul, devem ser colocados materiais recicláveis. Os papéis, como jornais, revistas, caixas de papelão, embalagens, envelopes e papel de escritório, precisam estar limpos e secos, sem resíduos orgânicos.
Os vidros, incluindo garrafas, potes e frascos, devem ser enxaguados para remover qualquer resíduo. As latas de alumínio, latas de aço, panelas e utensílios metálicos vazios também devem ser limpos antes de serem descartados, evitando contaminação. Por fim, embalagens plásticas, garrafas PET, sacolas e outros objetos de plástico devem estar vazios e limpos.
No recipiente destinado ao ‘Lixo Úmido’, que deve ser em saco preto, deve-se descartar os resíduos não recicláveis, como restos de alimentos, cascas de frutas e guardanapos sujos.
É importante lembrar que manter os materiais recicláveis limpos e secos é essencial para evitar a contaminação e garantir sua efetiva reciclagem.
Era noite do 2º dia de fevereiro de 2022. Antonieli Nunes se preparou para um momento feliz: contar para o homem que amava que estava grávida dele. No entanto, o que aconteceu foi o oposto de felicidade: Gabriel Henrique é acusado de matar Antonieli para não assumir a paternidade do filho que ela esperava. Isso porque ele era casado com outra pessoa, além de ser integrante de uma família evangélica de Pimenta Bueno (RO).
Em depoimento, Gabriel contou que teve um “ataque de ansiedade” quando descobriu a gravidez e começou a estrangular Antonieli enquanto eles estavam deitados “de conchinha”. Ele revelou que só parou o mata-leão quando não sentia mais o próprio braço, “de tanto que havia apertado o pescoço” dela.
O julgamento do caso não aconteceu, mesmo dois anos após o crime, e ainda não há uma data prevista. O processo chegou a ser suspenso por meses depois que a defesa do acusado alegou que ele sofre de insanidade mental. Porém, o laudo indicou que Gabriel “tem total capacidade e discernimento para averiguar o que é lícito e ilícito”.
Desde a pronúncia, a defesa de Gabriel entrou com recursos pedindo, entre outros pontos, a nulidade do depoimento que ele deu à polícia no dia do crime e a exclusão de qualificadoras como a do aborto. O recurso chegou até a última esfera: o Supremo Tribunal Federal (STF) e aguarda julgamento. Somente depois disso o júri será marcado.
Nomes por trás dos dados
Antonieli Nunes, de 32 anos;
Rayane Ferreira Nascimento, de 30 anos;
Laryssa Victória, 17 anos;
Ângela Maria Silva Duarte, de 51 anos;
Katia Juliana Garcia, de 29 anos.
Todas foram mortas entre 2022 e 2023 em Rondônia. Uma porque estava grávida, outra porque se recusou a dançar com o ex-companheiro em uma festa, a terceira encontrada morta e enterrada depois de sair de casa para se divertir com as amigas. As histórias são diferentes, mas ligadas por um ponto: todas morreram de forma violenta em Rondônia apenas pelo fato de serem mulheres.
Histórias semelhantes a essa se repetem centenas de vezes nos últimos anos e refletem o que aponta o Fórum Brasileiro de Segurança Pública: Rondônia é o estado que mais mata mulheres no Brasil.
Dados por trás dos nomes
O Anuário de Segurança de 2023 aponta que as tentativas de feminicídio somam 41 vítimas no estado de Rondônia em 2022. No ano seguinte, houve um crescimento de 41%, totalizando 99 casos.
Partindo para outro recorte, mais de 7,7 mil mulheres sofreram violência doméstica em 2022 e 2023 em Rondônia. As taxas nos dois anos só perdem para o Mato Grosso: são as segundas maiores do Brasil. A taxa calcula a quantidade de vítimas para 100 mil habitantes.
Em 2022 e 2023, Rondônia perdeu 44 mulheres para o feminicídio. Nesse último, a taxa foi reduzida de 2,4 para 2,6 e ainda assim é quase duas vezes maior que a média nacional, que é 1,4. Nos últimos dois anos, o estado se consolidou como o mais letal para mulheres.
Mas por que Rondônia conserva esse status?
De acordo com a promotora Joice Gushy Mota Azevedo, que atua em júris de feminicídio, o machismo e a cultura de violência são os pilares que sustentam o título de estado mais violento para mulheres.
“A violência contra a mulher é tolerada e, em muitos casos, justificada. Uma visão excessivamente conservadora desqualifica e menospreza a vida de mulheres que não seguem um padrão pré-formatado e considerado de ‘mulheres de valor’. Assim, em casos de vítimas com um estilo de vida mais livre, mais ousado para os padrões conservadores ou que envolvam vícios, a vida da mulher é vista como de menor importância”, aponta.
A legislação brasileira tipifica o feminicídio como um crime de ódio ao gênero feminino, que geralmente ocorrem quando a vítima está em contexto de violência doméstica, assim como quando há menosprezo ou discriminação pelo simples fato dela ser mulher. Esse “ódio” é enraizado na sociedade.
“A nosso sentir, parcela considerável da sociedade rondoniense apresenta um perfil voltado à objetificação da mulher, com excessiva valorização de seu corpo e severas imposições culturais de submissão. O sentimento social de proteção à integridade física e psicológica, bem como, à vida da mulher é pequeno. As famílias de vítimas em relacionamentos abusivos pouco ou nada interferem para retirá-las de relações violentas até que o pior acontece”, aponta a promotora.
Anne Cleyanne é psicóloga e fundadora da Associação Filhas do Boto Nunca Mais, uma Organização Não Governamental (ONG) que tem um olhar voltado aos cuidados de mulheres e crianças em contexto de violência. Tal iniciativa nasceu de uma dor.
“Eu fui violada sexualmente pelo mesmo homem que abusou da minha mãe. Quando foi com ela ninguém acreditou, quando foi comigo ela me mandou para longe para me proteger. O comportamento da família sempre foi de optar pelo silêncio. Cresci sem família e fui exposta a outros tipos de violência. Quando entendi que isso é um problema de muitas meninas, não só meu, eu entendi que poderia transformar minha dor em ação”, comenta.
O descrédito nas vítimas de violência foi um padrão que Anne percebeu nos anos que passou à frente da Associação. Ela também cita outros problemas: machismo estrutural e falta de educação sexual. O próprio nome da Associação veio dessas experiências.
“Descobri que durante muito tempo a lenda do Boto foi usada para encobrir abuso sexual intrafamiliar. Ninguém se intrometia na vida de ninguém, então se a criança aparecia grávida, eles iam apontar que foi o pai que fez aquilo? Falavam que era do boto. Esse contrato foi mantido, o silêncio e o descrédito da vítima”, revela.
Proteção e Justiça
Além de grupos como a Associação Filhas do Boto, órgãos públicos unem forças para evitar violência contra a mulher e feminicídios ou puni-los quando for o caso.
O Ministério Público de Rondônia, por exemplo, recebe denúncias e auxilia no suporte jurídico, emocional e psicológico às vítimas. Além disso, o órgão tem uma Promotoria especialmente para a atuação no Tribunal do Júri em casos de homicídios dolosos praticados contra a mulher por razões da condição de sexo feminino.
“A atuação do Ministério Público se destaca em ações preventivas, na busca e acompanhamento de medidas protetivas, no atendimento e orientação de vítimas, no acionamento dos órgãos da rede proteção e também em ações repressivas, no processamento para punição dos agressores e também adoção de providências para imposição de medidas cautelares, inclusive a prisão de agressores e feminicidas”, aponta a promotora Joice Gushy.
Outro atuante é o Tribunal de Justiça de Rondônia. O aplicativo “Módulo Lilás” foi lançado em novembro de 2022 pelo órgão com o objetivo de garantir o acesso mais rápido de mulheres vítimas de violência doméstica ao judiciário.
A quantidade de feminicídios denunciados à Justiça de Rondônia no primeiro trimestre de 2023 foi 153% maior em comparação ao mesmo período de 2021, de acordo com dados do Tribunal de Justiça do estado (TJ-RO). Março, marcado como “Mês da Mulher”, teve a maior quantidade de denúncias e julgamentos realizados.
Fases da violência doméstica: como pedir ajuda?
São três os principais tipos de violência doméstica:
Violência psicológica: situações que causam abalos emocionais na vítima, tais como constrangimento, humilhação, chantagem psicológica e até mesmo ameaças.
Violência patrimonial: tem relação com dinheiros e bens do casal. O agressor controla o dinheiro e consequentemente a mulher não tem autonomia financeira.
Violência física: são as agressões por meio de murros, tapas, chutes e outras formas. Mesmo que elas deixem marcas ou não.
De acordo com a advogada Sthefany Salomão, existem comportamentos do agressor que ajudam a identificar as fases da violência doméstica.
“Eles começam a se relacionar e aí vez ou outra começa um aumento de tensão. Ele se estressa por alguma coisa e geralmente coloca a culpa nela. Depois disso começam as agressões verbais, as agressões físicas e após esse ciclo é a chamada ‘lua de mel’: ele vem com flores, com pedido de perdão, fala que na verdade foi um covarde, que estava com raiva e a culpa é dela. A gente tem que lembrar que a culpa nunca é da vítima”, relata.
A denúncia pode ser feita pela própria vítima ou por testemunhas, mesmo anonimamente. É possível denunciar nos seguintes canais:
Ministério Público de Rondônia
Telefone: 180
Telefone: 190
Após acompanhar por anos casos de violações contra as mulheres, a promotora Joice Gushy aponta que somente uma reconstrução cultural e de valores pode tirar Rondônia do ranking de estado com as maiores taxas de feminicídio e violência doméstica.
O que podemos fazer para tirar o Estado da estatística?
“É preciso que se forme uma sociedade que reconheça, com igualdade, os direitos, o espaço, as escolhas e o pensamento de todas as mulheres. O empoderamento e a liberdade das mulheres deve ser efetivamente materializado no seio social, com a compreensão de que mulheres empoderadas (leia-se com direitos e garantias reconhecidos em patamar de igualdade aos que são reconhecidos aos homens) e com a liberdade respeitada é que são o pilar de uma família estável e de uma sociedade verdadeiramente fraterna”, finaliza.
Para melhor assistência às mulheres indígenas gestantes e puérperas é preciso ampliar a presença de médicos nas aldeias e o acesso a medicamentos e exames para atendimento imediato de casos especiais. Profissionais de saúde também precisam respeitar as vivências indígenas para acolher as mulheres a partir de suas especificidades culturais. Esta é a recomendação de artigo científico publicado em 11 de outubro na ‘Revista Brasileira de Enfermagem’ por pesquisadores da Universidade Franciscana de Santa Maria (UFN), das federais do Maranhão (UFMA) e Amazonas (Ufam) e da Universidad Católica del Maule, do Chile.
A equipe realizou uma pesquisa qualitativa baseada em entrevistas com 27 gestantes indígenas do estado do Mato Grosso. A maioria delas, 23, teve parto por via vaginal e ocorrido na própria aldeia. A análise dos dados da entrevista permitiu identificar temáticas recorrentes para essas mulheres, como a valorização do parto natural e do aleitamento materno. De forma geral, as entrevistadas veem o percurso natural no nascimento como forma de respeito a práticas sagradas, além de atender as necessidades de cada bebê e possibilitar o convívio com a família na aldeia.
“Surpreendeu-nos o quanto as mulheres indígenas valorizam e reconhecem o seu saber e as suas práticas singulares para o desenvolvimento sustentável”, avalia Dirce Stein Backes, professora da UFN e autora do estudo.
“Se, por um lado, o saber científico evolutivo nos conduziu às melhores evidências científicas, por outro criou cegueiras e miopias hegemônicas que nos distanciaram do saber dos povos originários”, acrescenta.
Por isso, o estudo aponta que é importante uma aproximação mais efetiva dos profissionais de saúde, especialmente os médicos, com as gestantes e puérperas indígenas.
Backes também ressalta que os resultados da pesquisa devem orientar gestores locais para atentar à alimentação das gestantes e puérperas indígenas — considerando que muitas entrevistadas relataram fraqueza. Cansaço e desânimo também foram reportados — principalmente durante a amamentação.
Apesar das mulheres somente interromperem o aleitamento a partir do nascimento do próximo filho, a recorrência de mal-estar nessas circunstâncias reforça a importância de políticas específicas de apoio às puérperas para que a prática siga sendo culturalmente aceita.
A equipe também recomenda o investimento em cursos de qualificação dos agentes indígenas de saúde.
“As mulheres indígenas preferem ser assistidas e orientadas por profissionais de saúde indígena, pela compreensão sólida de práticas culturalmente aceitas e estimuladas”, destaca a autora.
O Programa em Saúde Materno Infantil da UFN, coordenado por Backes, trabalha atualmente com pesquisadores de instituições nacionais e internacionais na qualificação dos agentes indígenas de saúde, das equipes de saúde hospitalar e da equipe das Casas de Saúde Indígena (Casai).
Entre outras ações realizadas para melhorar a assistência às mulheres indígenas, estão a suplementação alimentar e nutricional das gestantes e puérperas indígenas e a realização de teleconsultas. “O projeto visa sensibilizar os profissionais da saúde em relação aos cuidados, direitos e a valorização da cultura dos povos originários, em uma perspectiva humanística e prospectiva”, revela a pesquisadora.
*O conteúdo foi originalmente publicado pela Agência Bori
A festiva cidade de Parintins, no Amazonas, é conhecida como “ilha da magia”. Em 15 de outubro de 2024, a cidade comemora 172 anos. Também conhecida como Ilha tupinambarana, fica localizada a 369 quilômetros da capital Manaus e é famosa, mundialmente, por ser a cidade que realiza o maior evento folclórico a céu aberto do mundo: o Festival Folclórico de Parintins.
Além da disputa dos bois-bumbás Garantido e Caprichoso, que tradicionalmente acontece no último fim de semana de junho, Parintins tem algumas particularidades que você só encontra nela:
Você sabia que a cidade é dividida literalmente em duas cores?
O azul do boi Caprichoso e o vermelho do boi Garantido também dividem a cidade na localização geográfica, onde a catedral de Nossa Senhora do Carmo é o ponto de partida. O lado azul conhecido como reduto do Caprichoso, inclui bairros da cidade onde está localizado o curral Zeca Xibelão. E o lado vermelho, conhecido como Baixa do São José, é onde está situado o curral Lindolfo Monteverde, no complexo Cidade Garantido.
Saiba mais detalhes:
Festa de Nossa Senhora do Carmo
Por falar em Nossa Senhora do Carmo, as festividades em homenagem a Maria, Mãe de Jesus, honrando sua função como padroeira da Ordem dos Carmelitas, é uma atração à parte da cidade.
A Catedral em sua homenagem foi tombada por sua importância cultural pela Lei Nº 618/2004. Trata-se do maior templo católico do Médio Amazonas, e o festejo é celebrado no dia 16 de julho, quando atrai romeiros de vários lugares do Amazonas.
Entenda a importância:
Triciclo, meio de transporte mais popular da Ilha de Parintins
Como falar em Parintins e não lembrar do tradicional triciclo? Este meio de transporte tão característico da ilha é considerado Patrimônio Cultural e Imaterial do Amazonas. São estruturas de metal cobertas por uma lona, movidas pelo guidão de bicicletas ou motos encontrados pelas ruas da cidade. O veículo é um importante gerador de renda para dezenas de famílias do município, principalmente no período do Festival Folclórico.
Incêndio no Parque Guajará-Mirim, em Rondônia. Foto: Reprodução/Ibama
Em 2024, Rondônia bateu recordes de queimadas, sobretudo em áreas protegidas. O Parque Estadual Guajará-Mirim e a Estação Ecológica Soldado da Borracha, por exemplo, perderam milhares de hectares de vegetação. Além da destruição causada por incêndios criminosos, as unidades de conservação possuem algo em comum: ambas foram alvos de normas que tinham a intenção de reduzir e/ou extinguir suas áreas.
O Parque Estadual Guajará-Mirim possui cerca de 216 mil hectares de floresta protegida localizada em Nova Mamoré (RO). Desse total, mais de 100 mil hectares foram destruídos por queimadas ao longo dos últimos três meses. O parque é uma das maiores unidades de conservação do estado.
A Estação Ecológica Soldado da Borracha tem uma área de 178.948 hectares e se divide pelos municípios de Porto Velho e Cujubim. A unidade foi criada para preservar a natureza e propiciar o desenvolvimento de pesquisas científicas. Os incêndios já destruíram 163 mil hectares de floresta na região onde a estação está localizada.
O processo de destruição são os mesmos: desmate, incêndio e grilagem. Mas o que torna essas unidades de conservação alvos tão frequente de crimes ambientais? De acordo com o promotor de justiça e coordenador do Grupo de Atuação Especial do Meio Ambiente, o Gaema, Pablo Hernandez Viscardi, o que tem incentivado os invasores são “eventuais apoios políticos”.
“Eles [invasores] sabem e sentem o apoio político para eventual regularização futura. Mas volto a dizer: o que eles estão fazendo ali é grilagem e grilagem nenhuma poderá ser regularizada, poderá contar com a anuência do poder público. Se os políticos nossos sinalizassem no sentido de que aquela área não será regularizada e que o que eles estão fazendo é crime, com certeza eles se sentiriam desestimulados”, reforça.
A reportagem do Grupo Rede Amazônica questionou ao governo de Rondônia quais medidas ele tem adotado para apontar que não apoia crimes ambientais, sobretudo em unidades de conservação, e que eles devem ser combatidos, mas nenhuma resposta foi apresentada até a última atualização desta reportagem.
Para entender a importância de preservação do Parque e da Estação, cabe ter conhecimento que dentro das unidades existem diversas espécies, seja da flora ou da fauna, que são ameaçadas de extinção, quase ameaçadas ou vulneráveis. Ao redor da área existem reservas extrativista e Terras Indígenas.
Em chamas
Nas primeiras semanas do incêndio no Parque Guajará-Mirim, o Ibama informou que o fogo já tinha consumido 70 hectares. Em um mês, as chamas se espalharam e atualmente a área queimada é mais que 1,4 mil vezes maior que àquela informada inicialmente.
Os incêndios cresceram de forma tão significativa que se tornaram o maior registro ativo em Rondônia e contribuíram para colocar o estado nos piores índices de queimadas dos últimos 14 anos.
Documentos que a equipe da Rede Amazônica teve acesso mostram que as chamas foram identificadas no dia 11 de julho. A Sedam acionou o Ibama no dia 12; seis dias depois, uma equipe do Prevfogo se deslocou para atuar no local. Ou seja, quando o combate foi iniciado, o parque já queimava há pelo menos uma semana.
A equipe inicial de combate era formada por 12 pessoas, utilizando apenas meios terrestres. Desde então, os brigadistas já apontavam que a quantidade de agentes era pouca.
A falta de apoio aéreo foi outro grande problema. A exaustão de se deslocar a pé para onde os focos estão concentrados e a dificuldade em chegar aos pontos mais isolados passou a fazer parte do cotidiano dos brigadistas.
“Um apoio aéreo seria muito importante para lançar água, para recolher os brigadistas ao final do dia. Nós já andamos praticamente uns 4 km fazendo aceiros e nós vamos ter que retornar esses 4 km de volta na pernada. O apoio aéreo deixaria onde nós precisássemos combater o fogo”, relatou o chefe de esquadrão José Baldino, à época.
A Sedam informou que “fez tratativas” para que o Núcleo de Operações Aéreas (NOA), da Secretaria de Estado da Segurança, Defesa e Cidadania (Sesdec) fosse enviado ao local, mas que “devido ao mau tempo” e a falta de visibilidade causada pela fumaça, o pedido não pode ser atendido.
Na primeira semana de setembro, quase dois meses depois que as chamas foram identificadas, o governo de Rondônia pediu apoio aéreo para o governo federal.
Segundo o Ministério Público de Rondônia (MP-RO), há uma análise em andamento para entender se com o orçamento que a Sedam tinha, “ela poderia ter feito mais”.
“Com certeza houve um atraso. Eu não posso dizer agora que o Estado foi omisso, mas com certeza houve uma demora. Essas medidas poderiam ter sido adotadas desde bem antes”, aponta o promotor Pablo Hernandez Viscardi.
O governo apontou que fez uma parecia com projeto que visa a recuperação de áreas degradadas e escolheu o Parque Estadual Guajará Mirim como alvo. E entretanto os incêndios acabaram atingindo parte da área atendida pelo projeto.
Incêndios criminosos
Desde que identificou os incêndios no Parque, a Secretaria de Estado do Desenvolvimento Ambiental (Sedam) já apontava a possibilidade de ações criminosas. A hipótese foi reforçada quando garrafas de combustíveis foram encontradas próximas aos focos de incêndio, além de pegadas.
Segundo o promotor Pablo Hernandez Viscardi, os indícios apontam que os incêndios foram causados como retaliações às fiscalizações ambientais, sobretudo àquelas realizadas na Operação Mapinguari, realizada pelo MP-RO: a maior ação de desocupação em unidades de conservação já realizada em Rondônia.
Na ocasião, pelo menos 10 pessoas foram presas, mais de 2 mil cabeças de gado foram retiradas do local e centenas de estruturas irregulares de invasores destruídas.
“Sabemos que os incêndios são criminosos, sabemos que esses criminosos que atuam lá atuam de forma organizada, de forma articulada, já temos linhas investigativas nesse sentido. Não há incêndio acidental, não há incêndio voluntários, há dolo, há crimes”, apontou o promotor.
Para ajudar a combater as queimadas em Rondônia, o Ministério Público de Rondônia, através do Gaema, colocou em prática outra operação: Temporã. O objetivo é responsabilizar criminalmente os envolvidos. Segundo Pablo Hernandez Viscardi, a ação se fez necessária em meio a uma “falta de nexo de interlocução entre os órgãos responsáveis”.
“A gente detectou um aumento muito grande nos focos de calor e então a gente marcou uma reunião com todos esses órgãos para que a gente alinhasse uma atuação estratégica para diminuir os focos e daí surge a Operação Temporã”.
Mais de 200 agentes se envolveram na operação, incluindo membros do Ibama, Polícia Federal, Polícia Militar, Polícia Militar Ambiental, Comando de Fronteira do Exército, Secretaria de Desenvolvimento Ambiental, Polícia Civil, Corpo de Bombeiros Militar e Politec.
“Isso [os incêndios] tem melhorado muito nos últimos dias, principalmente depois do dia 30, quando o Ministério Público Estadual capitaneou uma reunião com todas as forças que fecharam todas as vias de acesso ao parque e nós tivemos um excelente reflexo”, apontou o superintendente do Ibama, César Guimarães, após o início da Operação Temporã.
Segundo a Sedam, os incêndio dentro do Parque Estadual Guajará-Mirim tiveram uma queda significativa após a ação coordenada pelo MP-RO. Entretanto, ao longo desta semana foram registrados novos focos de calor dentro da unidade.
O combate não é fácil. Para dificultar a ação dos brigadistas, os invasores espalham armadilhas pelo caminho, como árvores derrubadas e objetos pontiagudos para furar os pneus dos veículos.
“É um artefato caseiro chamado de ouriço que eles utilizam nas estradas para evitar a fiscalização, pequenas lanças que furam geralmente os quatro pneus das caminhonetes”, relata o tenente da Polícia Militar Ambiental, Paulo Henrique.
E não para por aí…
A Estação Ecológica Soldado da Borracha também foi consumida pelo fogo por mais de dois meses, segundo documentos que a reportagem teve acesso. Agentes do Prevfogo encontraram áreas derrubadas e galões de veneno na unidade de conservação durante uma das ações;
Os focos de incêndio na Estação foram identificados no dia 12 de julho. No dia 8 de setembro, quase dois meses depois, o Ibama foi acionado pela Secretaria de Estado do Meio Ambiente (Sedam). O combate foi iniciado 4 dias depois.
No dia 18 de setembro, durante o combate às chamas, os agentes do PrevFogo perceberam uma grande concentração de calor. Ao chegarem no local, encontraram a vegetação derrubada para aplicação de veneno. Galões com a substância foram encontrados próximos a uma residência.
Quase extintas e/ou reduzidas
Parque Estadual Guajará-Mirim e Estação Ecológica Soldado da Borracha: ambas unidades tiveram suas áreas afetadas por normas estaduais que tinham a intenção de reduzi-las e/ou extingui-las
O decreto nº 27.565, publicado no Diário Oficial (Diof) no dia 28 de outubro, foi assinado pelo governador Coronel Marcos Rocha. O documento cita que o governo “desistiu” da criação da Estação Soldado da Borracha pela falta de orçamento para indenizar as pessoas que tem propriedades no local. Na época, a unidade tinha cerca de 700 imóveis para indenização e desapropriação.
O MP-RO entrou com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) apontando que o documento ofende o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado e a proibição do retrocesso ambiental. Cerca de um mês depois, o Tribunal de Justiça de Rondônia (TJ-RO) suspendeu os efeitos da norma.
O Parque Guajará-Mirim e a Reserva Extrativista Jaci Paraná se tornaram alvo de uma lei semelhante, de autoria do governador Marcos Rocha, aprovada na Assembleia Legislativa de Rondônia (ALE-RO) e sancionada em maio de 2021. Logo após a sanção, o Ministério Público do Estado (MP-RO) ingressou com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI).
A partir da aprovação da norma, as duas áreas de preservação citadas sofreram uma redução de aproximadamente 220 mil hectares.
“Essa lei visava exatamente regularizar os grileiros, invasores e criminosos e o Ministério Público e o Poder Judiciário não concordaram com isso. Os dados de satélite mostram que o desmatamento aumentou significativamente, justamente pela sensação de que os invasores e grileiros de que as invasões seriam regularizadas”, comenta Pablo Hernandez Viscardi.
Dados do Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon), apontam que no ano seguinte à aprovação da lei, o Parque Estadual Guajará-Mirim esteve dentre as 10 unidades de conservação mais desmatadas de toda Amazônia Legal.
A ONG WWF Brasil também apontou o prejuízo ambiental: as duas áreas juntas perderam, de janeiro a outubro de 2021, 127 km² e quase todo este desmatamento aconteceu depois da aprovação da norma estadual.
Conforme os dados da WWF, o Parque Estadual Guajará-Mirim não teve sequer um km² desmatado entre janeiro e abril do mesmo ano. Após a aprovação da lei, o desmatamento na área já chega a 40 km².
A norma foi declara inconstitucional em novembro de 2021. De acordo com o desembargador Jorge Ribeiro da Luz, relator do processo, o governo justificou a redução apontando que existem pessoas que se ocuparam de vários espaços das unidades, até mesmo para a criação de gado. No voto, ele cita que o Estado não pode simplesmente renunciar o dever de proteger o meio ambiente diante da situação.
“Se os conflitos estão crescendo, se essas 120 mil cabeças de gado estão na reserva extrativista e no parque estadual é porque o poder público tem se mostrado ineficiente na proteção dessas unidades de conservação violando seu dever constitucional”, comentou o desembargador Jorge Ribeiro da Luz na sentença.
A reportagem questionou se o governo enxerga que a lei e o decreto contribuíram para a grande quantidade de incêndios criminosos em unidades de conservação, sobretudo no Parque Guajará, mas não obteve resposta até a última atualização desta reportagem.
Recordes de queimadas e seca extrema
Em 2024, Rondônia bateu recordes de queimadas. Entre janeiro e 5 de setembro foram registrados 7.282 focos: a maior quantidade dos últimos 14 anos para o período.
As queimadas expressivas ocorrem em um período de estiagem e seca extremas. Pela primeira vez, desde que começou a ser monitorado em 1967, o rio Madeira ficou abaixo de um metro. A imensidão de água no rio Madeira foi substituída por bancos de areia gigantes e montanhas de pedras. O nível mais baixo já observado foi o de 19 centímetros, na sexta-feira (11): 19 centímetros.
Os moradores das comunidades ribeirinhas viram os poços amazônicos secos, assim como o rio. Muitas famílias vivem com menos de 50 litros de água por dia para abastecer toda a residência. A quantidade é menos da metade dos 110 litros por dia considerados pela Organização das Nações Unidas (ONU) como necessários para suprir as necessidades básicas de apenas uma pessoa.
Além disso, o céu azul, citado no hino de Rondônia, foi substituído pelo “cinza” causado pelas queimadas na Amazônia. O pôr do Sol “abraçando” o rio Madeira, por exemplo, que fazia parte do dia a dia da população, passou a ser raras ou inexistentes.
Em parceria com o Governo do Amapá, pesquisadores do Jardim Botânico do Rio de Janeiro e do Botanical de Nova Iorque (EUA) estão no Estado para participar da 4ª expedição de campo do ‘Programa Nacional de Monitoramento da Biodiversidade – Programa Monitora’, que vai coletar amostras de novas espécies para a criação do primeiro banco de dados da Reserva de Desenvolvimento Sustentável (RDS) do Rio Iratapuru, no Vale do Jari, na região Sul.
A expedição também vai capacitar a equipe local na área de pesquisa. A equipe iniciou o deslocamento no dia 8 de outubro. A coordenadora da equipe de pesquisadores, Rafaela Fersozza, explica que a partir da coleta de plantas, será elaborada uma lista de espécies para criar o banco de dados da reserva.
“Nossa expectativa é implementar à equipe local o que chamamos de protocolo básico e avançado de plantas, onde temos parcelas permanentes que serão monitoradas para sempre, especialmente as árvores. Quando começamos a monitorar as plantas, a gente quer ver a saúde da floresta, como ela está, se vai estar saudável ao longo dos anos. Faremos um trabalho inédito”, destacou a coordenadora.
Durante o trabalho de campo, que será realizado até o dia 26 de outubro, os pesquisadores farão a marcação das árvores que serão monitoradas e, a cada cinco anos, elas serão “remedidas”. Esse acompanhamento vai revelar se ocorreu incorporação de carbono e se há mortalidade de plantas acima do esperado. É um diagnóstico de saúde da floresta com informações detalhadas e precisas.
Para o pesquisador do Botanical de Nova Iorque, Flávio Obermuller, a expedição é muito valiosa para a troca de experiências e conhecimento. Além de ser um verdadeiro inventário da biodiversidade do Sul do Amapá.
“A pesquisa é um ganho para a natureza e para a ciência com novas descobertas de espécies. A RDS do Rio Iratapuru é rica em espécies plantas, o Programa tem uma média para Amazônia que a cada seis coletas importantes que a gente faz, uma é um novo registro para o estado e a cada 30, uma é um novo registro para a ciência. Numa expedição como essa de 20 dias, a média de coleta é de no mínimo mil amostras de plantas, significa que teremos muitas novidades”, ressaltou o pesquisador.
Os pesquisadores irão demarcar áreas previamente selecionadas, onde serão coletadas amostras e folhas para análises posteriores em laboratórios. O trabalho de campo também vai utilizar sistemas de GPS para o georeferenciamento, garantindo precisão da localização. Os resultados irão compor o banco de dados do Programa Nacional, além de gerar publicações para a comunidade científica e acadêmica.
“As ações do programa de monitoramento da biodiversidade na RDS do Rio Iratapuru é uma ferramenta muito importante para a gestão dessa Unidade de Conservação, onde tornará possível criar estratégias para atenuar as pressões sobre essa área e, inclusive, ajudar a entender como as mudanças climáticas afetarão as nossas florestas”, explica o coordenador de Gestão de Unidades de Conservação e Biodiversidade, Euryandro Costa.
Programa Monitora
O Programa Nacional Monitora, é vinculado ao Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA) e ao Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio). Dividido em três subprogramas – terrestre, aquático continental e marinho e costeiro – ele é executado dentro das Áreas Protegidas da Amazônia (Arpa) e atua através de expedições de campo, contribuindo para a proteção dos ecossistemas florestais e para o avanço do conhecimento científico sobre as plantas lenhosas na região amazônica.
Reserva do Rio Iratapuru
A Reserva de Desenvolvimento Sustentável (RDS) do Rio Iratapuru é uma unidade de conservação estadual localizada nos municípios de Laranjal do Jari, Mazagão e Pedra Branca do Amapari.
A expedição é uma ação do Governo do Estado, coordenada pela Secretaria de Estado do Meio Ambiente (Sema) com o apoio do Programa Áreas Protegidas da Amazônia (Programa Arpa) que visa garantir informação de qualidade para a avaliação contínua da efetividade da Unidade de Conservação.
Desde 2020, o Programa vem sendo executado dentro da RDS do Rio Iratapuru com o monitoramento de aves cinegéticas, borboletas frugívoras e mamíferos de médio e grande porte.