Salto alto na estrada: conheça Afrodite, o caminhoneiro crossdresser do Mato Grosso

Nas estradas do Mato Grosso, a masculinidade, machismo e força bruta frequentemente associadas aos caminhoneiros contrastam com a delicadeza e sensibilidade de Afrodite. Na boleia de seu caminhão, músculos e palavrões dão lugar a meias-calças, batons e saltos altos. Aos 68 anos, ela só usa preto, em sinal de luto. Mas o sentimento não se refere à perda de um ente querido. Afrodite diz que vive em luto pelo homem que morreu dentro dela; ou melhor, o homem que ela matou quando se assumiu crossdresser, que é o ato da pessoa se vestir e usar adereços do sexo oposto, independentemente da orientação sexual.

“O meu sonho sempre foi ser mulher, andar e me vestir como mulher. Eu nunca me conformei com meu corpo de homem. Desde criança sempre questionava minha mãe sobre os meus seios, que não cresciam. Fundamentada pelo espiritismo, ela me respondia: nesta encarnação o seu corpo veio de homem, mas seu espírito é de mulher”, relata.
Infância e bullying

Afrodite nasceu Heraldo Almeida Araújo. Ao Portal Amazônia, ela conta que o hábito de vestir roupas femininas a acompanha desde a infância.

“Na escola, minhas atividades preferidas eram as de bordado, tecelagem, costura. Eu detestava ter que jogar bola. Eu tinha vergonha de tirar a camiseta, era como se meus seios ficassem à mostra”, contou.

Nessa fase da vida, porém, a peças se restringiam às roupas íntimas. Como é comum nesses casos, ele conta que durante toda a infância sofreu preconceito e foi vítima de bullying por parte dos colegas.

“Eu nunca tomava banho junto com os meninos. Sofria ‘gozação’ dos outros colegas, que me chamavam de ‘mariquinha’, e fui crescendo ouvindo isso, em Jacarezinho, no Paraná, onde nasci. Nos mudamos para São Paulo, quando eu tinha 12 anos, e lá fui trabalhar com tecelagem, e quando eu estava sozinho produzia algumas peças íntimas e usava por baixo da roupa, e isso era um orgulho pra mim”, contou.

Sempre se disfarçando, usava roupas íntimas femininas para sentir mais a vontade, até mesmo quando serviu ao exército. Afrodite conta que, durante o serviço militar, a possibilidade de ser ferido ou morto em um possível combate era menos preocupante do que ter seu segredo revelado.

“Fiquei 3 anos no exército e fui cabo. Na hora que eu ia tomar meu banho, eu tinha que ficar no último chuveiro, mas nunca ninguém me molestou ou percebeu nada. Eu tinha preocupação de ser ferido ou morto e, na hora que me tirassem a farda, vissem minha roupa íntima por baixo e descobrirem”, disse.

Apesar de se vestir como mulher, Afrodite não se considera homossexual e diz que as histórias Rogéria e Roberta Close o ajudaram a dar vazão a seus desejos.

“Acompanhei as histórias da Rogéria, Roberta Close, mas nunca quis ser um travesti ou homossexual, queria ser mulher e ter um homem. O tempo passou e eu cresci com ânsia por ser uma mulher. Hoje, eu sou homem ainda”, relata.Afrodite afirma que está em busca de acompanhamento psicológico, como é recomendado. “Hoje estou fazendo meu tratamento hormonal por conta própria, mas já fui ao psiquiatra e ele vai me orientar”, disse.

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