Silêncio como forma de resistência: indígenas isolados na área de influência da BR-319

Especialistas alertam: o ritmo das ameaças é mais veloz que o das garantias.

Foto: Daniel Cangussu/Funai

No Interflúvio Madeira-Purus, onde a mata ainda fala mais alto que o asfalto, vivem povos que escolheram o isolamento como forma de existir. São indígenas que não mantêm contato com a sociedade envolvente e que seguem em silêncio, cercadas por árvores, rios e mistérios.

Na área de influência da BR-319, há registros oficiais da presença de pelo menos cinco grupos isolados, segundo levantamentos da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) e organizações indígenas.

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Esses povos habitam regiões de difícil acesso ao sul da rodovia, entre os municípios de Lábrea, Humaitá e Canutama. Ali, a floresta ainda guarda sinais de sua passagem: trilhas recém-abertas, malocas escondidas, utensílios deixados para trás. Mas a ameaça avança junto com projetos de infraestrutura, como a BR-319, hidrelétricas e a abertura de ramais.

A repavimentação da estrada e a abertura de seus ramais intensificam a presença de madeireiros, grileiros e caçadores — invasões que colocam em risco não apenas o modo de vida desses grupos, mas sua própria sobrevivência física.

Entre os registros mais sensíveis está o dos indígenas isolados do Mamoriá Grande, na calha do rio Purus, entre os municípios de Lábrea e Canutama. Indícios da presença desse grupo já foram confirmados por expedições da Funai, e sua existência levou o Ministério Público Federal a cobrar medidas urgentes de proteção.

Veja também: Indígena isolado faz contato voluntário com ribeirinhos no Amazonas

Outro caso emblemático é o da Terra Indígena Hi-Merimã, no médio rio Purus, onde vivem indígenas isolados que resistem sem contato há décadas, em um dos territórios mais remotos e preservados da região.

Historicamente, muitos desses povos se isolaram após experiências traumáticas de contato forçado, marcadas por violência, epidemias e expulsão de seus territórios.

O direito ao isolamento voluntário é protegido pela Constituição e por normas internacionais, mas, na prática, a proteção depende de ações como a criação de terras indígenas, restrições de uso e vigilância permanente.

Nos últimos anos, o Ministério dos Povos Indígenas e a Funai renovaram medidas de proteção, como a Portaria de Restrição de Uso da Terra Indígena Jacareúba-Katawixi, válida até 2026.

Mas especialistas alertam: o ritmo das ameaças é mais veloz que o das garantias. Defender os povos isolados é defender o direito de existir em liberdade — e proteger o que resta da floresta em pé.

*O conteúdo foi originalmente publicado pelo Observatório BR-319

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