Portal Amazônia responde: comer formiga “faz bem pra vista”?

Na região amazônica alguns tipos de formigas são verdadeiras iguarias em culturas indígenas, como o caso da etnia Baniwa que consome formigas saúva e maniwara.

Em algum momento da sua infância você deve ter ouvido de seus pais ou avós que faz bem comer formiga e que, segundo as histórias, “faz bem para vista”. Mas será mesmo que isso é verdade?

Na região amazônica alguns tipos de formigas são verdadeiras iguarias em culturas indígenas, como o caso da etnia Baniwa que consome formigas saúva e maniwara. Elas podem ser torradas e consumidas como farinha, sem necessariamente passar por cozimento prévio.

Foto: Karina Pinheiro / Portal Amazônia

Algumas dessas formigas utilizadas na culinária possuem um sabor bem peculiar. Quando vivas, geralmente exalam um cheiro de capim santo ou capim limão, mas quando preparadas, possuem um sabor levemente apimentado, lembrando o gengibre e a hortelã, criando um tempero diferente para as receitas. Já quando torradas possuem um gosto que lembra o amendoim japonês.

O Portal Amazônia conversou com o pesquisador do Museu Paraense Emílio Goeldi, Rogério R. Silva, especialista em formigas, para saber mais sobre as espécies de formigas “comestíveis” – ou não – encontradas na Amazônia.

De acordo com o pesquisador, o número total de espécies da Amazônia está perto de 1200. 

“A questão sobre valores médios, depende da escala de estudo. Por exemplo, se olharmos na menor unidade de análise sobre diversidade de formigas (1 metro quadrado), temos cerca de 20 espécies em cada pedaço do chão da floresta. Se olharmos numa escala maior de análise, como 1 hectare (como os botânicos estudam a vegetação), temos cerca de 250 espécies no chão da floresta. Se olharmos em escalas grandes, como quadrados de 20 km², temos algo em torno de 500-800 espécies de formigas. Isso é uma diversidade extraordinária. No entanto, esses números não consideram a fauna que está no dossel (nas copas) das árvores porque é muito difícil obter amostras desses locais de difícil acesso. Isso significa que esses números são uma estimativa mínima e crescerão com o avanço do trabalho de pesquisa – visitando novos locais e ao longo de toda a Amazônia”, 

afirma.

O especialista também esclareceu o porquê das formigas serem tão importantes para a região amazônica:

“As formigas ajudam a cuidar da floresta. São, por excelência, os primeiros organismos que visitam qualquer novidade que surja na floresta (como um fruto caído, um inseto morto, um animal morto, fezes de pássaros nas folhas das árvores ou no chão). As formigas têm interações com milhares de outras espécies animais e com as plantas nas florestas (ou qualquer outro ambiente). Como resultado, exercem funções fundamentais para que a vida funcione, como proteção de plantas e animais, ciclagem de nutrientes, modificação do solo através de atividades de construção de ninhos, redistribuição de nutrientes (especialmente dentro do solo), predação (regulação da abundância de outros organismos, como controle de herbívoros), polinização e dispersão de sementes, ajudando a floresta a crescer”.

E destaca ainda que é preciso lembrar que “a biomassa de formigas em uma floresta é maior que a biomassa de aves e mamíferos combinada. Se você entrasse numa floresta e pudesse pesar todas as aves, mamíferos e formigas, chegaria a essa conclusão. A última estimativa sobre abundância de formigas em nosso planeta chegou a um número de 20 quadrilhões de formigas andando na Terra”.

Mas e a história de que comer formiga “faz bem pra vista”? 

De acordo com o pesquisador, a história não é verdadeira, já que não existe nenhuma relação cientificamente comprovada de que a ingestão de formigas ajude, de alguma forma, a melhorar a visão humana:

“Não conheço nenhuma relação entre compostos químicos das formigas e a visão [humana]. Essa crença popular provavelmente está relacionada com o fato de que as pessoas associam condições boas de visão e a capacidade de enxergar algo que tem tamanho de corpo muito diminuto, como as formigas. Formigas pequenas são comuns dentro de residências, fazem parte do cotidiano das pessoas e talvez seja o ponto de referência para avaliar se a visão mudou com o avanço da idade. Consulte um oftalmologista e também sempre valorize a ciência”,

explica Rogério.

Formigas na culinária 

Mas, como dito anteriormente, as formigas são uma iguaria na culinária amazônica e não são todas as espécies que se pode comer. Até porque, vale lembrar que esses insetos percorrem diversos locais como chão, mato e até lixo. 

As mais populares na gastronomia, tratadas para consumo humano, conhecidas até então, são as formigas Tanajura ou Içá e as formigas da espécie Atta – as saúvas. 

Projeto Sciants Amazônia

O projeto Sciants Amazônia é uma iniciativa que tem como objetivo promover a informação científica para aumentar o conhecimento sobre a diversidade de formigas na Amazônia. 

Fundado em 2021, a base do projeto fica no Museu Paraense Emílio Goeldi (Belém/PA) e conta com a participação de pesquisadores das áreas de ecologia, taxonomia, sistemática, conservação, história natural e extensão, incluindo o pesquisador Rogério Silva.  

Além de contar com uma rede colaborativa de pesquisadores de instituições públicas e privadas nacionais e internacionais. 

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