Fungos que brilham: espécies servem como “guia” para comunidades indígenas na Amazônia

Na Amazônia, são descritas duas espécies desse tipo de fungo, o que gera curiosidade e interesse para quem ainda não conhece o fenômeno.

Os fungos são seres que já passaram por diversas mudanças no universo científico. Já foram considerados vegetais e até mesmo protozoários, mas atualmente estão englobados dentro de um reino próprio: o Fungi.

Algumas espécies de fungos possuem uma característica de bioluminescência, que é a capacidade de alguns seres vivos de emitir luz fria e visível. O fenômeno faz com que muitos fiquem encantados, porém é algo recente na Amazônia.

Na região amazônica, mais precisamente no interior do Amazonas, foram descritas duas espécies de fungos bioluminescentes. O mais recente foi publicado em 2021, na revista científica Mycoscience.

O Portal Amazônia mostra essas descobertas, o que se sabe sobre o fenômeno e explica o que é o micoturismo. Acompanhe:

Foto: Reprodução/Revista Mycoscience

Fungos são organismos heterótrofos, ou seja, não produzem o próprio alimento, dependem da ingestão de matéria orgânica, viva ou morta, para sobreviver. As espécies que se alimentam de matéria orgânica morta possuem um papel importante na decomposição de animais e vegetais e são chamadas de saprófagas.

Primeira descoberta

Em 2009, foi realizada a primeira descoberta de fungo bioluminescente encontrado na Amazônia. A descoberta aconteceu durante uma expedição científica na rodovia BR-319 pelo biólogo e pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa), Ricardo Braga-Neto.

A espécie fungo já era conhecida, contudo, ninguém havia percebido nela o fenômeno da bioluminescência. Com a ajuda de outro pesquisador, Braga-Neto descobriu que Mycena lacrimans era a primeira espécie de fungo encontrada na Amazônia que tem o cogumelo bioluminescente, entre as 64 já classificadas no mundo.

Foto: Cassius V. Stevani/USP

“Brilhos da Floresta” 

Nove anos após a primeira descoberta, em 2018, a doutora em Recursos Naturais pela Hokkaido University e também pesquisadora do Inpa, Noemia Kazue Ishikawa, identificou fungos bioluminescentes em São Gabriel da Cachoeira, também no Amazonas.

Ela foi apresentada ao fenômeno por um indígena da região, Aldevan Baniwa, que o conhecia como “brilhos da floresta”. A comunidade utiliza a luz proporcionada pelos fungos como forma de se guiar por trilhas, uma vez que as luzes da cidade não são fortemente presentes na região e a mata fechada é bastante escura durante o período noturno.

O Inpa analisou as informações por três anos. Até então, só havia uma espécie de fungo biolumenscente. “Em 2005, encontrei a primeira espécie de cogumelo que emite luz. É indescritível a sensação de se observar a emissão de luz por fungos em uma floresta à noite. Impossível não ficar emocionado e pensativo”, comenta a pesquisadora.

E o resultado da pesquisa recente foi publicado na revista cientifica Mycoscience e a nova espécie foi batizada em homenagem a uma professora da Universidade Federal do Amazonas (Ufam), Cristina Maki, como Mycena cristinae. A professora fez parte do grupo de pesquisa, mas faleceu antes da conclusão dos estudos.

Confira aqui o resultado da pesquisa.

Foto: Reprodução/Revista Mycoscience

Explicação do fenômeno

Eles brilham em função de uma reação química semelhante a que ocorre com vaga-lumes e outros organismos, mas o fato é que ainda não se sabe ao certo sobre o mecanismo das reações químicas associadas a esse processo. De acordo com a revista científica Scientific American, algumas hipóteses ecológicas e fisiológicas foram levantadas para explicar o fenômeno. A bioluminescência de fungos se daria devido a uma emissão constante de luz que depende da presença de oxigênio para ocorrer.

Alguns estudos sugerem que essa luz pode ter a função de alertar os predadores de suas defesas, afastando animais que comem fungos, ou, ainda, que a luz poderia atrair predadores desses animais fungívoros (que se alimentam de fungos), conferindo vantagens para os fungos bioluminescentes.

Estímulos ao conhecimento

Para facilitar o entendimento sobre a espécie recém descoberta e sua importância, Noemia Ishikawa e outros pesquisadores criaram um livro ilustrado, que conta como que os “fungos que brilham” foram descobertos. “Espero que este livro induza as pessoas a serem curiosas, a se questionarem e explorarem a Natureza. Atualmente, são conhecidos uma centena de fungos bioluminescentes, mas muitos mais devem existir nas florestas. Temos de preservá-los e estudá-los”, afirma a pesquisadora.

O material está disponível em português, japonês, inglês e na língua indígena nheengatu. Acesse AQUI.

Exposição “Amazônia ao Cubo”. Foto: Hadna Abreu

Além disso, devido aos fungos bioluminescentes atraírem a curiosidade de entusiastas, as descobertas podem contribuir para o crescimento do micoturismo na região. Grupos de expedições com cientistas ou até mesmo pessoas comuns frequentando a floresta em busca dos fungos.

Como são lugares geralmente distantes dos centros urbanos, outra alternativa é criar exposições ou amostras lúdicas, com o intuito de aproximar a sociedade da ciência e para que todos possam conhecer mais sobre as espécies. 

Como acontece na exposição ‘Amazônia ao Cubo’, da artista visual Hadna Abreu. A partir de ilustrações para os livros publicados pela pesquisadora do Inpa, a artista se interessou pelos cogumelos bioluminescentes e criou uma exposição que une tecnologia e os detalhes da floresta.

“Ela [Noemia Ishikawa] me deu todo embasamento científico e de pesquisa para que eu conhecesse os fungos mais profundamente e com mais detalhes. Ela me apresentou a história do livro e seus personagens que são todos reais. E eu amei ter ilustrado, ficando fascinada pela magia desses fungos. Sempre gostei de dar fantasia aos meus trabalhos e eles só abrilhantaram ainda mais o meu processo criativo com a Amazônia”, explica Hadna.

Segundo a artista, a aplicação nas obras é realizada através da tecnologia que imita o efeito da floresta noturna, com sensores que despertam luzes e sons da natureza “de forma encantadora e mágica”, estimulando os visitantes a buscarem conhecer mais sobre a Amazônia.

“Procuro em todos os meus trabalhos trazer sensibilidade e sensações. Estas obras são capazes de levar o público a outro lugar, fora da cidade, da agitação da vida urbana. A exposição captura a atenção das pessoas para sentir a floresta bem perto, perto e dentro”, conta.

A exposição ‘ Amazônia ao Cubo’ está em cartaz no Espaço Casa Som Amazônia, localizado na rua Travessa Planalto, número 03, Bairro Parque Dez de Novembro, Zona Centro-Sul de Manaus. A visitação é gratuita e até dia 22 de dezembro, de segunda a sexta, de 19h às 21h, e no sábado (18) de 15h às 17h. Os ingressos são limitados e é preciso agendar a visita por meio da plataforma Sympla.

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