Baleia e Balaio: a história da mãe de um macaco com deficiência que lutou pela vida do seu filhote

Um estudo sobre psicologia comportamental dos animais registrou o caso da mãe Baleia que lutou pela vida do seu filhote Balaio. O filhote nasceu com deficiência congênita na perna que impossibilitava sua locomoção.

Apesar de serem considerados seres irracionais, os animais sempre trazem lições sobre inclusão, amor e empatia. Um amor que vence barreiras e deficiências que podem ser vistas como limitações. Foi com base no amor materno que uma mãe de um macaco-prego lutou pela vida do seu filhote. Completamente dependentes das mães para locomoção nos primeiros meses de vida, os filhotes agarram suas mães para poderem acompanhar o grupo de primatas.

Um estudo sobre psicologia comportamental dos animais registrou a história comovente da mãe Baleia que lutou pela vida do seu filhote Balaio. O filhote nasceu com deficiência congênita na perna que impossibilitava sua locomoção. Com instinto maternal de proteção, Baleia oferecia suporte físico ao Balaio. Os pesquisadores acompanharam os dois primeiros meses de vida do filhote, cuja espécie pode ser encontrada em diversas regiões do Brasil, incluindo a Amazônia.

Para entender melhor sobre esse instinto maternal dos animais, o Portal Amazônia conversou com a pesquisadora do Grupo de Pesquisas de Primatas Neotropicais da Universidade de São Paulo (USP), Tatiane Valença, a coautora do artigo ‘Vida e morte de um infante de macaco-prego selvagem incapacitado’.

Foto: Tatiane Valença

Considerado um dos macacos mais inteligentes do mundo, é capaz de abrir frutos de casca rígida usando pedras ou pedaços de madeira. São macacos de porte médio, que atingem cerca de 45 centímetros de comprimento. 

Vale destacar que sua abrangência no continente sul-americano é grande. Eles são encontrados desde a bacia Amazônica até o sul do Paraguai e norte da Argentina e por todo o Brasil. O Sapajus macrocephalus é uma espécie amazônica, já os Sapajus flavius e Sapajus xanthosternos são endêmicos do nordeste, por exemplo. Outra espécie amazônica é a Sapajus apella, encontrada no Acre, Mato Grosso, Rondônia, Pará, Amapá e Roraima. Para a pesquisa, foram observados macacos do Parque Nacional de Ubajara, no Ceará. 

Contudo, mesmo com o cuidado que a mãe teve com seu filhote, após dois meses ele faleceu. Os pesquisadores acreditam que ele tenha caído da costa da sua mãe, tendo em vista a hipótese de que a causa da morte pode ter sido de um trauma, somado a sua deficiência. A deficiência congênita no filhote estava na sua perna, que não se flexionava igual aos outros. 

“Podemos dizer que ela flexionava para o lado externo, o joelho ‘dobrava para o lado’. Ele era capaz de movimentar a perna normalmente nessa posição diferente e não parecia exibir qualquer desconforto ao fazer isso. Nós acreditamos que seja uma condição congênita, a condição causava dificuldades para se agarrar à mãe. Os filhotes utilizam os dois braços e flexionam as duas pernas para encaixar bem e agarrar firmemente nas costas da mãe, especialmente porque a mãe fica boa parte do tempo andando entre as árvores e às vezes fazendo movimentos de impacto. Como a perna esquerda do filhote flexionava para a lateral, ela não encaixava firmemente nas costas da mãe”,

esclareceu a biológa.

Por conta da deficiência, o filhote ficava em posições instáveis nas costas da sua mãe, então tinha a tendência a escorregar mais que o normal. Algo que chamou atenção dos pesquisadores foi que grupo de macacos que conviviam com o Balaio o tratavam de modo igual, sem diferenciações.

“Os macacos-prego tendem a ter muito interesse pelos recém-nascidos. Eles se aproximam, olham na face, tocam, fazem catação e exibem um comportamento muito interessante que a gente chama de lip smacking, que é um estalar de lábios como se fosse um ‘beijinho’. Esse filhote recebia todos esses cuidados também”, pontuou Tatiane.

Os macacos-prego costumam viver em grupos de até 40 indivíduos. Em geral, sua alimentação é rica em frutos e insetos. Eles possuem o hábito de ingerir alimentos mais duros, como cocos e sementes, este hábito influencia na sua anatomia e comportamento.

“Essa população utiliza pedras como ferramentas para quebrar pequenos cocos. Levantar e abaixar a pedra com força para quebrar o coco gera um impacto grande, então esse é um momento que os filhotes têm que se agarrar bem firmemente ao corpo das mães. Para quebrar cocos, os macacos costumam apoiar a cauda no chão ou em alguma árvore, conseguindo mais estabilidade para bater com força. Essa mãe às vezes levantava a cauda nesse momento, o que é incomum. Então nós acreditamos que ela fazia isso para evitar que o filhote escorregasse nesse momento de impacto”, explicou a coautora do artigo, que também tem assinatura de Tiago Falótico. 

Foto: Tatiane Valença

Casos parecidos com o Balaio

Existem registros de populações de macacos semelhantes ao do Balaio, como é o caso dos macacos japoneses. No Japão, os macacos possuem maior facilidade de locomoção no chão, então não precisam pular com frequência entre as árvores, o que prolonga a sobrevivência dos macacos que nascem com alguma deficiência. Com isso, os filhotes podem escorregar das mães sem causar grandes danos a sua saúde física. 

“Há uma população de macacos japoneses em que há vários casos de macacos que nasceram com deficiências e não conseguem se agarrar às mães. Elas seguram os filhotes deficientes contra o corpo, carregando eles dessa forma pelo tempo que for necessário. Elas também posicionam os filhotes nos mamilos para que possam mamar. E muitos deles conseguem viver bem, chegar à idade adulta e ter seus próprios filhotes”, contou Tatiane.  

A pesquisadora resumiu o artigo em um vídeo. Confira:

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