Fumaça de queimadas na Amazônia: uma crise que ameaça a saúde e o meio ambiente

Nosso objetivo é analisar a fumaça derivada das queimadas como um vetor central dessa crise, destacando seus impactos na saúde pública e no meio ambiente.

A Amazônia, vasta e exuberante, é frequentemente considerada a expansão verde do planeta, enfrenta uma crise ambiental crescente, destacada pelo alarmante das queimadas e incêndios florestais.

Impactos das queimadas, práticas agrícolas e pecuárias na Amazônia Legal. Fotos: Anderson Coelho/ Fonte: Revista semanal brasileira CartaCapital.¹

Nosso objetivo é analisar a fumaça derivada das queimadas como um vetor central dessa crise, destacando seus impactos na saúde pública e no meio ambiente. Diante do enfraquecimento das políticas ambientais, se reforça a exploração das atividades humanas, como a mineração, que se entrelaçam com o avanço do desmatamento, criando uma sinergia prejudicial. Além disso, buscamos entender como a exposição à fumaça, contendo substâncias perigosas, está afetando a saúde da população amazônica.

Ao examinar a crise da fumaça de queimadas na Amazônia, buscamos não apenas evidenciar a extensão dos problemas enfrentados, mas também propor reflexões sobre ações de enfrentamento ao problema. Essa análise se torna ainda mais crucial em meio aos desafios adicionais, como a pandemia de COVID-19, eventos climáticos extremos e a iminente temporada do El Niño em 2023, visando contribuir para um entendimento mais abrangente da crise, indispensável para a preservação da Amazônia e, por conseguinte, para o equilíbrio ambiental global.

Quais são as principais causas das queimadas?

O problema das queimadas na Amazônia está intrinsecamente ligado a uma série de fatores que convergem para a manipulação desenfreada desse ecossistema vital. O desmatamento surge como a principal manifestação desse ciclo de destruição, impulsionado por práticas agrícolas e pecuárias, onde a matéria orgânica remanescente é frequentemente consumida pelas chamas para liberar espaço para atividades humanas. A limpeza de pastagens, uma prática comum entre fazendeiros, também contribui para o aumento das queimadas, pois o fogo é empregado na revitalização de pastagens degradadas ou na abertura de novas áreas para a pecuária.

Além do desmatamento, a atividade de garimpo surge como outra força motriz por trás das queimadas na Amazônia. Garimpeiros, em busca de minérios preciosos, recorrem ao fogo para desbravar áreas florestais, deixando rastros de destruição em seu caminho. Surpreendentemente, até mesmo atividades recreativas, como acampamentos e churrascos, podem inadvertidamente desencadear incêndios devastadores.

A influência de fatores climáticos acentua ainda mais a gravidade da situação. Tempestades secas, caracterizadas pela ausência de chuvas, aumentam significativamente o risco de incêndios florestais, enquanto períodos prolongados de seca e a escassez de chuva tornam a vegetação mais propensa a queimadas. O vento, por sua vez, não apenas dissemina as chamas, mas também dificulta os esforços de controle.

Quais são os impactos da fumaça das queimadas na saúde humana e no meio ambiente?

Os efeitos nefastos da fumaça das queimadas não se restringem apenas ao âmbito ambiental, estendendo-se de maneira alarmante à saúde humana. A composição tóxica da fumaça, composta por emissões como monóxido de carbono (CO), partículas de fuligem e elementos prejudiciais, resulta em uma série de impactos adversos. A inalação pode desencadear tosse, falta de ar e agravar doenças respiratórias, com um aumento significativo nas internações hospitalares e taxas de mortalidade, particularmente em pacientes com condições cardiovasculares ou pulmonares preexistentes. Crianças, idosos, gestantes e pessoas com doenças cardíacas ou pulmonares são mais suscetíveis aos efeitos adversos da fumaça, que, ao viajar por milhares de quilômetros, atingem diversas comunidades, fazendo com que aquelas próximas às áreas queimadas sejam mais propensas a sofrer consequências para a saúde.

Fumaça de queimadas encobre Manaus. Foto: William Duarte/Rede Amazônica – Fonte: G1 Amazonas²

Os problemas de saúde associados à fumaça das queimadas abrangem desde irritações nas vias aéreas até complicações mais graves, como asma, bronquite e pneumonia. Além disso, a exposição prolongada à fumaça, rica em substâncias cancerígenas como benzeno, nitrosaminas e hidrocarbonetos aromáticos policíclicos, eleva os riscos de câncer. A vulnerabilidade é acentuada em crianças, com pulmões em desenvolvimento, em idosos, com pulmões menos eficientes, e em pessoas com doenças respiratórias preexistentes.

Diante desse panorama crítico, medidas de proteção tornam-se imperativas. Recomenda-se permanecer dentro de casa, fechando portas e janelas, ao passo que o uso de máscaras pode ser crucial ao sair. Evitar atividades extenuantes e manter uma hidratação adequada também são estratégias para minimizar os efeitos danosos da fumaça. Consulte um médico para manifestar sintomas de infecções após exposição à fumaça é essencial.

Para além dos impactos na saúde humana, a fumaça das queimadas desencadeia uma série de danos ao meio ambiente, com repercussões sistêmicas. A poluição atmosférica resultante compromete a qualidade do ar, prejudicando a saúde local e afetando a visibilidade nas rodovias. A perda de biodiversidade é uma realidade dolorosa, com destruição do ecossistema, morte de animais e impactos significativos na fauna. Também provocam alterações no solo, como a alteração de características físicas e químicas; além disso a redução da fertilidade, perda de nutrientes e alteração do pH são consequências diretas do calor gerado pelas queimadas.

A escassez de água surge como mais um problema, causando a diminuição da capacidade de infiltração de água no solo e contribuindo para o seu ressecamento, levando eventualmente à desertificação. A contribuição para as mudanças climáticas, por meio do aumento da emissão de gases de efeito estufa, agrega outra camada de complexidade ao quadro ambiental. Os impactos na saúde pública, o prejuízo aos povos indígenas e uma série de outros desdobramentos, como a destruição de habitat, incêndios florestais e prejuízos econômicos, evidenciam que a problemática das queimadas transcende fronteiras geográficas e impacta profundamente o equilíbrio ambiental e social.

Quais medidas que podem ser tomadas para combater as queimadas?

O enfrentamento das queimadas exigiu uma abordagem abrangente, envolvendo tanto a prevenção quanto o combate direto aos incêndios. No âmbito preventivo, é imperativo fortalecer o monitoramento de áreas propensas a queimadas, utilizando tecnologias como imagens de satélites, aeronaves e drones. A fiscalização, por sua vez, desempenha papel crucial na identificação e proteção de responsáveis por queimados ilegais, enquanto a educação da população sobre os riscos associados pode contribuir para a redução desses eventos.

No tocante às medidas de combate, a formação de brigadas de incêndio, composta por bombeiros e profissionais especializados, emerge como uma estratégia eficaz. A utilização de aeronaves para transporte de água e materiais no combate a incêndios, somada a recursos como caminhões-pipa, máquinas pesadas e equipamentos de comunicação, fornece uma resposta mais eficiente diante das chamas já existentes.

Além das ações destacadas, as políticas públicas desempenham papel fundamental no combate às queimadas. O incremento de recursos e pessoais para ações preventivas e de combate, por meio de instituições como o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), representa um compromisso estatal crucial. A Operação Guardiões do Bioma, lançada para disponibilizar brigadistas em estados afetados, é um exemplo positivo de iniciativa governamental.

A conscientização da sociedade e a promoção das mudanças de hábitos são fundamentais na luta contra as queimadas. Informar a população sobre os impactos ambientais e na saúde humana e promover práticas que evitem a realização de queimadas são ações indispensáveis. O controle de queimadas ilícitas, incentivando denúncias à Polícia Ambiental e ao Corpo de Bombeiros, também se mostra crucial, respaldado por legislações específicas.

A proibição das queimadas para plantio, salvo com autorização dos órgãos competentes, e a promoção do saneamento ambiental, desencorajando práticas como o descarte inadequado de cigarros e o incêndio de fogueiras próximas à vegetação, são medidas adicionais que trouxeram significativamente para a prevenção.

Investimentos em comunicação em massa, por meio de campanhas educacionais em escolas, mídias sociais e TV, são estratégias poderosas para divulgar informações sobre os impactos das queimadas. Em nível local e regional, prefeituras e governos estaduais podem implementar políticas específicas, como orientações à população para evitar a proximidade com incêndios e cuidados com a saúde.

Desta forma, o combate eficaz às queimadas requer uma abordagem holística, envolvendo a sociedade, órgãos governamentais e medidas práticas que atuem tanto na prevenção quanto no controle direto dos incêndios, envolvendo proteção do meio ambiente e da saúde humana.A Amazônia, vasta e exuberante, é frequentemente considerada a expansão verde do planeta, enfrenta uma crise ambiental crescente, destacada pelo alarmante das queimadas e incêndios florestais.

¹ Bispo, Fábio; Anderson Coelho. Agro vai desmatar 1 milhão de hectares por ano na Amazônia para atender demanda por carne até 2030. CartaCapital. 2020. Disponível em: https://www.cartacapital.com.br/sociedade/os-interesses-economicos-por-tras-da-destruicao-da-amazonia/

² Monteiro, Eliena. Fumaça de queimadas coloca Manaus entre cidades com pior qualidade do ar no mundo. G1-Globo. Amazonas. 2023. Disponível em: https://g1.globo.com/am/amazonas/noticia/2023/10/11/fumaca-de-queimadas-coloca-manaus-entre-cidades-com-pior-qualidade-do-ar-no-mundo.ghtml

Com a colaboração de:

Prof. Dr, Yunier Sarmiento Ramírez possui graduação em Ciências Econômicas pela Universidade do Estado do Amazonas, mestrado em Gestão de Empresas pela Universidad de Holguín – Cuba e doutorado em Economia pela Universidade Federal de Rio Grande do Sul. Atualmente é professor da Universidade Federal do Amazonas no Departamento de Economia e Análise – DEA e no Programa de Pós-Graduação em Serviço Social e Sustentabilidade na Amazônia – PPGSS. Desenvolve pesquisas na área de Economia aplicada, teoria econômica e métodos quantitativos

Sobre o autor

Prof. Dr, José Barbosa Filho possui graduação em Engenharia de Pesca pela Universidade Federal do Ceará (1989), mestrado em Economia Rural pela Universidade Federal do Ceará (1992) e doutorado em Engenharia de Produção pela Universidade Federal de Santa Catarina (2005). Atualmente é professor Titular da Universidade Federal do Amazonas. Desenvolve pesquisas na área de Contabilidade Ambiental, Matemática Financeira e Econometria, com ênfase em Gestão Ambiental, atuando principalmente nas seguintes áreas: valoração ambiental, desenvolvimento sustentável, avaliação de impactos ambientais e gerenciamento de processos.

Contato: jbarbosa@ufam.edu.br

*O conteúdo é de responsabilidade do colunista 

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