Saiba como o guaraná se tornou símbolo da cultura de Maués

Cipó originário da Amazônia, o guaraná também é chamado de guaranazeiro e uaraná, pela cultura indígena, e já foi conhecido como “droga do sertão” por suas propriedades.

Cipó originário da Amazônia, o guaraná (Paullinia cupana) é comumente chamado de guaranazeiro e uaraná, pela cultura indígena. De acordo com estudos arqueológicos, a planta foi domesticada entre cinco e seis mil anos atrás por nativos da região que se localiza entre os rios Madeira e Tapajós, no Amazonas, denominada em pesquisa como “região cultural do guaraná”.

O Portal Amazônia entrevistou o historiador e mestre em desenvolvimento regional, Fortunato Martins Filho, para entender sobre o desenvolvimento do guaraná e a importância cultural, social e econômica para Maués. Confira a seguir:

Foto: Acervo/Portal Amazônia

Região cultural do guaraná

Devido a fatores geográficos e físicos, como o solo, vegetação, clima e relevo, a região onde está localizado o município de Maués é considerada um ambiente privilegiado para o surgimento de uma espécie única e efetiva adaptação e reprodução do guaraná. Fortunato Martins a denomina de “região cultural do guaraná”.

“No processo cultural, esses povos originários da região desenvolveram tecnologias para o cultivo da semente e também para o preparo do guaraná para beber. No cultivo da semente selecionaram as melhores mudas e assim tiveram uma melhor produção. No preparo para beber, desenvolveram a torrefação do guaraná, a pilação e o preparo da bola do guaraná, submetendo-a ao processo de defumação, onde o fumeiro através da fumaça leva uma película, que é da resina da madeira, e essa resina se transforma em uma película que protege essa bola do guaraná, por um tempo significativo que vai de um até três anos, uma tecnologia significativa para a época”,

explicou o historiador da Universidade Federal do Acre (Ufac).

Martins relata que ao longo de suas pesquisas foi identificado que a semente do guaraná era muito utilizada como forma de escambo, ou seja, era trocada comercialmente pelos nativos. Eles a utilizavam na produção de produtos como machados, cerâmicas, lanças, dentre outros utensílios.

“O guaraná, muito antes dos navegadores adentrarem na região por volta da segunda metade do século XVII, já estava inserido no cotidiano dessas trocas, já era um produto de comércio e também na vida cotidiana de vários grupos sociais, habitantes daquela localidade”, ressaltou.

O guaraná como ‘droga do sertão’

Com a chegada dos europeus no continente americano, muitos grupos realizaram expedições em busca de ‘drogas do sertão’, como eram conhecidas as especiarias dos biomas brasileiros da época. De acordo com o pesquisador, quando encontraram essa região, constataram que o guaraná já era uma iguaria presente no cotidiano da população e na relação comercial desses grupos originários.

Esse fenômeno, Fortunato Martins define como o “encontro acidental do ocidental com o guaraná”. Segundo ele, esse “encontro” despertou um interesse na comercialização do guaraná.

O guaraná no cotidiano mauesense

Foto: Divulgação/Amazonastur

Ainda segundo Martins, é preciso destacar a importância da presença do guaraná no cotidiano da população. O pesquisador conceitua a “festa raiz do guaraná”, que se dá através de três grupos que tem essa planta no seu dia a dia: indígenas, ribeirinhos e a população urbana de Maués:

“Os grupos nativos bebem o guaraná tal qual sua ancestralidade acreditando que, ao beber o guaraná estão ‘bebendo a sabedoria’ e ralam o guaraná em uma cuia com água e a mãe é a referente para fazer a ralação do guaraná. Nos grupos ribeirinhos, que ressignificaram essa cultura, eles ralam o guaraná também numa cuia com água e em uma língua de pirarucu e ali produzem o pó. No ato de ralar o guaraná eles têm uma inspiração de que o guaraná é a sua fonte de energia e fazem a meditação para o dia. Os grupos urbanos também acreditam que o guaraná é a sua fonte de energia”.

Festa do Guaraná

Afirmação cultural do povo mauesense, a Festa do Guaraná surge como um processo de amadurecimento de movimento culturais do município.

“Com relação à festa comercial do guaraná, ela acontece no contexto das afirmações culturais, regionais, inclusive de uma política desencadeada pelo poder central que tinha interesse nesse processo de afirmação da diversidade cultural brasileira”,

disse Martins.

Foto: Reprodução/Associação Brasileira das Indústrias de Refrigerantes e de Bebidas não Alcoólicas

Em 1973, ocorreu uma feira no espaço urbano do município, a Feira Cultural, e reuniu estudantes, artistas, instituições públicas e privadas, monumentos culturais e a população em geral. “Pedagogicamente, foi uma aproximação muito significativa e uma troca de informações e de cultura entre esses sujeitos urbanos e rurais”, completou Fortunato Martins, que afirmou ainda que foi uma referência para o surgimento da atual Festa do Guaraná, em 1979.

De acordo com o historiador, a festa tem um significado muito forte como simbolismo da cultura mauesense e também pela questão financeira. O município exporta cerca de 300 toneladas de guaraná por ano, conforme dados do Governo do Estado referentes à 2020.

A festa geralmente ocorre entre novembro e dezembro e atrações locais e nacionais se apresentam no festival. O evento não ocorreu em 2020 e 2021 devido à pandemia de Covid-19, contudo a Prefeitura do município manteve a realização do concurso que elegeu a a Rainha do Guaraná de Maués em 2021. 


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