Abertura de ramais na área da BR-319 cresce quase o dobro do tamanho da rodovia em 5 anos

Municípios que apresentaram a maior rede de ramais foram Canutama, Humaitá, Manicoré e Tapauá, de acordo com um levantamento realizado pelo Observatório BR-319.

Um levantamento feito pelo Observatório BR-319 identificou o aumento de 1.593 quilômetros (km) na rede de ramais localizada na área da BR-319 nos últimos cinco anos, o que corresponde à abertura de quase duas rodovias no período. Os números correspondem aos municípios de Canutama, Humaitá, Manicoré e Tapauá, no sul do Amazonas.

“Esse trabalho foi desenvolvido em um contexto de avanço do processo de licenciamento das obras no Trecho do Meio da BR-319 e de muita expectativa pela finalização destas intervenções, o que aumentou a especulação fundiária na região e intensificou atividades relacionadas à grilagem de terras, como a abertura de ramais e desmatamento em florestas públicas”, explica a coordenadora da nota técnica do OBR-319 e pesquisadora do Instituto de Conservação e Desenvolvimento Sustentável da Amazônia (Idesam), Paula Guarido.

A grande expansão de ramais na região da BR-319 entre 2016 e 2021, indica que a repavimentação da rodovia pode estar impulsionando ocupações ilegais na região: “É importante destacar que construção de estradas oficiais, como a BR-319, geralmente é acompanhada do surgimento de redes de estradas menores, que são os ramais”, explica.

BR-319 está localizada próximo a região de terras indígenas do Amazonas. Foto: Divulgação/Observatório BR-319

Os dados utilizados no mapeamento do Observatório foram gerados a partir de imagens de satélite e banco de dados do governo, e resultou na identificação de uma rede de ramais que, somados, perfazem uma extensão total de 4.752 km em Canutama, Humaitá, Manicoré e Tapauá. O ano de maior crescimento de ramais nestes municípios foi 2020, com aumento de 14% e um acréscimo de 560 km à rede.

O município que apresentou a maior rede de ramais foi Canutama, seguido por Humaitá, Manicoré e Tapauá. Humaitá foi o município que mais expandiu sua rede de ramais em quilômetros nos últimos cinco anos. Tapauá, mesmo sendo o município com a menor rede de ramais, apresentou a maior taxa de crescimento entre 2016 e 2021, com aumento de 451%. Com exceção deste município, que apresentou um maior acréscimo de ramais no ano de 2018, nos outros três a rede de ramais cresceu mais em 2020.

Entre as categorias fundiárias analisadas, Imóvel Privado foi a que concentrou a maior parte dos ramais mapeados em Canutama, Humaitá e Tapauá. Em Manicoré, os ramais estavam em maior número nas Terras Indígenas.

Dinâmica relacionada à BR-319 e pressão em Áreas Protegidas

Em relação à dinâmica de abertura de ramais diretamente relacionada à rodovia, a análise na área de 40 km para cada lado da BR-319 mostrou que, quando somados, 62% dos ramais dos quatro municípios estão na área sob influência direta da BR-319, totalizando 2.934 km. Contudo, a distribuição desses ramais por município não é homogênea: em Humaitá, 91% dos ramais estão dentro dos 40 km; em Canutama, 86%; em Tapauá, 67%; e em Manicoré, apenas 2%.

Os dados indicam, ainda, que Canutama e Humaitá, além de possuírem uma dinâmica de abertura e expansão de ramais bastante relacionada à BR-319, apresentam, também, um aumento recente da expansão deste tipo de via, já que o ano de maior crescimento de ramais nesses municípios, na área de influência direta da rodovia foi 2020.

Um fator que gera grande preocupação é que, somente em 2021, 55% dos ramais mapeados, nestes municípios, estavam dentro de Florestas Públicas Não Destinadas (FPND), totalizando 2.609 km de ramais, sendo 40% pertencente a Canutama (1.048 km), 32% a Manicoré (845 km), 25% a Humaitá (647 km) e 3% a Tapauá (70 km).

Além disso, a nota mostra que grande parte da rede de ramais nesses dois municípios está possibilitando uma forte pressão por ocupações ilegais nas Áreas Protegidas que possuem limites próximos à rodovia.
Em Canutama, é possível notar uma extensa rede de ramais próxima ao Parque Nacional (Parna) Mapinguari e à Terra Indígena (TI) Jacareúba/Katawixi, que possui 96% de seu território sobreposto a esse Parna e está sem proteção legal desde dezembro de 2021, devido ao fim da vigência e não renovação de sua Portaria de Restrição de Uso.

Da mesma forma, em Humaitá, é possível notar uma extensa rede de ramais na região do distrito de Realidade, promovendo pressão irregular da Floresta Nacional (Flona) de Balata-Tufari.

A nota técnica do OBR-319 sugere ainda sete encaminhamentos:

  • monitoramento permanente de ramais, por satélite e in loco, por parte dos órgãos de fiscalização ambiental estaduais e federais;
  • a urgente revisão e implementação do Zoneamento Ecológico Econômico (ZEE) do Purus e a elaboração do ZEE do Madeira, integrando-os à gestão desse território;
  • maior aporte de recursos financeiros e humanos pelos governos federal e estadual para garantir a gestão e implementação das Áreas Protegidas, que estão na região de influência da BR-319, além de um plano de monitoramento e proteção destas áreas; entre outros.  

A nota técnica será protocolada em órgãos ambientais e de fiscalização estaduais e federais, Ministério Público Federal e outros.

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