A tese “Descoberta de SNP, construção de mapa genético de alta densidade e identificação de genes associados com adaptação climática e ausência da espinha intermuscular em tambaqui (Colossoma macropomum)” foi defendida no ano de 2017, sob a orientação do professor Luiz Lehmann Coutinho, do Programa de Pós-Graduação em Ciência Animal e Pastagens da Universidade de São Paulo (USP/ESALQ). Além de receberem certificado e medalha, os vencedores serão agraciados com uma bolsa de pós-doutorado. A solenidade de reconhecimento será realizada no próximo dia 13 de dezembro.
Graduado em Zootecnia e em Biotecnologia pela Ufam, o então especialista em Biotecnologia ingressou como docente em 2009. “Entre no INC somente com a graduação, concluindo a pós a distância ainda enquanto lecionava. Depois do estágio probatório, obtive licença para sair e cursar a pós-graduação. Fiz a seleção da USP e comecei o mestrado em 2013. Lá, eu percebi a possibilidade de prosseguir com o tema no doutorado”, conta o professor José Ribamar.
E o doutorado veio antes do esperado. Durante os dois anos do mestrado, em caso de excelência acadêmica – com o conceito ‘A’ em todas as disciplinas – haveria a possibilidade de uma mudança de nível. Cumulativamente, seria necessário ainda ser aprovado no exame de proficiência com aproveitamento de pelo menos 80% e apresentar uma dissertação com todas as condições de ser continuada como tese. Apenas um ano e dois meses depois de iniciar o mestrado, o professor José Ribamar submeteu a proposta ao Programa e foi aprovado como doutorando, embora com a exigência de cumprir as disciplinas remanescentes do Mestrado.
“Em 2015, eu viajei para os Estados Unidos, durante um ano, como bolsista da Capes. Antes disso, a minha pesquisa era financiada pela Fapeam [Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Amazonas]”, lembra o docente, que sequer chegou a obter o título de mestre. A tese foi concluída em 2016, tendo sido defendida e depositada no ano seguinte. Enquanto ainda cursava o doutorado, ele publicou um artigo científico numa revista Qualis A1, periódico do grupo Nature. “Essa é a mesma revista que publicou a pesquisa sobre a relação entre o Zika Vírus e a Microcefalia”, compara o docente, ao mencionar a relevância cientifica do texto.
‘Made in Brazil’
De volta ao tambaqui, a escolha da espécie partiu do pressuposto de ainda haver poucos estudos sobre o peixe, sendo esta, inclusive, a primeira descoberta de mutações da espécie em larga escala. “Na verdade, quando eu ingressei no mestrado, o meu orientador queria trabalhar com uma técnica nova de descoberta de mutações, que são alterações no genoma de animais. Mas, naquele ponto, ainda não sabíamos com o quê exatamente iríamos trabalhar. Outra certeza que eu tinha era a de estudar alguma espécie de importância regional”, afirma o autor da melhor tese avaliada pela Capes.
Segundo ele, o tambaqui é a espécie nativa mais importante na cultura brasileira, não só do Amazonas. “A tilápia também é bastante consumida, mas foi uma espécie introduzida que acaba causando problemas ambientais”, acrescenta o docente do INC, cuja proposta foi trabalhar uma espécie nativa relevante economicamente. A princípio, nós não tínhamos material para extrair DNA do tambaqui e a parceria com o Inpa [Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia] foi essencial naquele momento.
Professor apresentou artigo em Congresso Internacional de Gentética, ocorrido em Foz do Iguaçu-PR. “Partimos quase do zero e avançamos rapidamente, tendo resultados como o mapa genético e as associações econômicas e ecológicas. Significa dizer que poderá ser produzido um peixe já sem espinha, por exemplo. Além disso, num cenário de mudança global, poderíamos continuar produzindo tambaqui com qualidade, antecipando geneticamente essas transformações e selecionando indivíduos adaptáveis”, justifica o professor Ribamar Nunes.
No estudo, foram analisadas populações presentes no Amazonas, além de outras introduzidas no Nordeste e no Sudeste do País na década de 1960. Inicialmente, foram identificadas mais de 200 mil mutações que poderiam ser utilizadas. Após a filtragem inicial, restaram ainda dezenas de mutações confiáveis para subsidiar o estudo.
Em seguida, foi desenvolvida uma base, ou seja, um mapa genético responsável por identificar onde estão essas mutações especificamente considerando cada parte do genoma. Aí então foi iniciado o levantamento das mutações que estariam ocasionando a perda de espinha do tambaqui e também aquelas que o ajudariam a se adaptar às mudanças climáticas.
Peixe sem espinha
A proposta inicial foi estabelecer a relação entre mutações genéticas no tambaqui. O grupo foi se fortalecendo com o tempo e surgiu a primeira questão-problema, como explica o pesquisador: “Inicialmente, o professor Alexandre Rios, da Universidade de Mogi das Cruzes, foi comunicado sobre a descoberta, por um produtor rural, de uma população de tambaquis que não produzia a espinha do miocepto ou intermuscular. E o que é isso? É uma espinha em forma de ‘Y’ que é cortada quando o peixe é ticado, no intuito de facilitar o consumo”.
Além de ser um problema de ordem econômica, pelo fato de que muito se dispensa do pescado ao retirar essa parte do tambaqui, essa espinha é a principal responsável pelo engasgamento. “Um estudo feito nos Estados Unidos mostra que, dentre as causas do engasgamento, a espinha de peixe assume o topo da lista. Interessante que a mutação [dos peixes que já nasceram sem a espinha] ocorreu naturalmente, sem qualquer introdução transgênica, tendo apenas sido descoberta”, explica o professor da Ufam.
Com relação aos peixes sem espinha, nós descobrimos 13 genes que estão relacionados, por exemplo, à produção e modificação óssea. Esses resultados foram apresentados num congresso na Austrália, despertando bastante interesse da comunidade científica. O resultado foi uma parceria proposta por uma universidade chinesa. Com isso, tivemos a possibilidade de fazer estudos mais detalhados da genética, através de um “desligamento” de cada um dos genes no animal, como se fosse um interruptor. Estamos ainda trabalhando nisso.
Resistência ao clima hostil
Em relação às mudanças climáticas, a grande contribuição partiu da professora Vera Val, do Inpa. “Nosso objetivo foi também estudar quais tipos de mutações poderiam ajudar na adaptação do tambaqui às mudanças climáticas. O aumento da temperatura reduz a oxigenação na água, e acidifica a água”, explica o autor da tese. Assim, neste ponto, as mutações que se pretendia identificar ajudariam a compreender como o tambaqui responderia ao possível aumento da temperatura: como continuar produzindo a espécie, mesmo nesse cenário de transformação ecológica que altera o seu ambiente?
Foram estudadas as diferenças entre variáveis atmosféricas, como temperatura, pressão atmosférica, luminosidade, nebulosidade. Um dos genes identificados, por exemplo, está relacionado à resposta do peixe ao frio e ao calor.
“Assim, quanto à adaptabilidade ao ambiente mais ácido, encontramos várias mutações que estão em genes de grande importância econômica, ecológica e biológica para o tambaqui. Um deles regula a resposta da espécie numa baixa condição de oxigenação da água”, destaca o professor, ao relacionar as principais descobertas capazes de influir no melhoramento ou na seleção genética do tambaqui para uma resposta adequada às oscilações do clima global.
Confira a lista de vencedores