Saberes tradicionais de comunidades paraenses são analisadas como importantes no combate a mudanças climáticas

Pesquisa investiga as práticas tradicionais de manejo da paisagem não reconhecidas no repertório técnico formal, mas de grande importância para uma agenda sustentável.

Quando o assunto é a Amazônia, o foco é, geralmente, a sua fauna e flora. A floresta é muito citada, afinal é de suma importância para o planeta. Mas não podemos perder de vista também outro viés, igualmente indispensável e entrelaçado: os espaços urbanos.

Essa relação entre urbano e natureza e os processos únicos das cidades da Amazônia despertaram o interesse da estudante Giuliana Lima em mergulhar no tema. 


A sua pesquisa, O trabalho intitulado Repertório da Trama dos Povos da Floresta para enfrentamento de mudanças climáticas em cidades amazônicas foi feito sob orientação da professora Ana Cláudia Duarte Cardoso (Itec/UFPA) e contou com financiamento Pibic/CNPq. O estudo foi apresentado durante o XXXIV Seminário de Iniciação Científica da UFPA, realizado pela Pró-Reitoria de Pesquisa e Pós-Graduação (Propesp), tendo sido premiado pelo Edital Pibic Verão Destaque na Iniciação Científica da UFPA (edição 2023), como representante da área de Planejamento Urbano e Regional. investiga as práticas tradicionais de manejo da paisagem não reconhecidas no repertório técnico formal, mas de grande importância para uma agenda sustentável. 

“A pesquisa se baseia em uma hipótese da professora Ana Cláudia sobre a Trama Verde e Azul dos povos da floresta, com base em uma concepção que já existe, que é a Trama Verde e Azul da França, em que eles institucionalizaram a proteção de rios e florestas. Aqui, a gente acredita que são os povos tradicionais, ribeirinhos, indígenas e quilombolas os responsáveis por essa proteção”,

explica a jovem pesquisadora.

O trabalho conta com orientação da professora Ana Cláudia Cardoso, do Instituto de Tecnologia da Universidade Federal do Pará (Itec/UFPA).

Foto: Alexandre de Moraes

A Trama Verde e Azul em Belém do Pará 

Segundo a pesquisa, apesar de a relação entre pessoas e natureza ser mais nítida quando vista nas ilhas, como é o caso da Ilha do Combu, ainda há experiências de cuidado e proteção por parte dos moradores também da cidade. A investigação considerou duas áreas: o Igarapé São Joaquim, localizado na Bacia do Una, que vai abrigar o projeto de um Parque Urbano ao longo da sua extensão; e o Igarapé Sapucajuba, pertencente à Bacia do Tucunduba e atravessa o campus da UFPA, em Belém.

O processo teve auxílio de várias frentes de trabalho, contou com a parceria da Universidade Federal do Ceará, com tecnologia de análise de escoamentos de água e também envolveu trabalhos de campo, como entrevistas com os líderes comunitários e moradores.

No caso do Sapucajuba, o estudo observou que a relação dos moradores com o rio mostrou-se mais frágil que a dos moradores de São Joaquim. A estratégia foi procurar moradores mais antigos que resgataram memórias mais afetivas. “Ouvimos moradores mais velhos, que estavam no início da ocupação e que viram o rio quando ele era cristalino. Eles falavam: ‘Ah, o rio era cristalino, a gente tomava banho, a gente pescava camarão'”, destaca Giuliana. 

Para esse caso, foi concebido um plano piloto que reúne ações de enfrentamento das mudanças climáticas. A proposta consiste em um microzoneamento da região em quatro eixos: saneamento, drenagem, fluxos e usos. Para a questão do saneamento, considerada mais urgente, foram recomendadas soluções sociotécnicas, como fossa alta comunitária e biodigestores.

Quanto ao São Joaquim, a pesquisa identificou que, mesmo com o processo de macrodrenagem que suprimiu a vegetação local, impermeabilizou o solo e deslocou parte da população, o vínculo da comunidade com o espaço ainda é forte. A mata ciliar foi replantada pelas mãos dos próprios moradores, que transformaram as margens do igarapé em seus quintais. Ali há áreas de convivência, hortas e plantio frutífero.

O trabalho conclui que a Trama Verde e Azul dos povos da floresta não está totalmente perdida dentro da área urbana da RMB e que pode, e deve, ser reativada, afinal os saberes locais e tradicionais estão carregados de soluções sustentáveis eficazes. Para a jovem pesquisadora, revelar essa relação é essencial para a agenda de sustentabilidade, por isso fomento e investimento são indispensáveis. 

Sobre a pesquisadora

Giuliana Cira Cardoso Morais Lima tem 22 anos e está no 8º período do curso de Arquitetura e Urbanismo da UFPA. É integrante do Laboratório Cidades na Amazônia (Labcam/UFPA) como bolsista de Iniciação Científica (CNPq). Também participa, como integrante e extensionista, do Grupo de Pesquisa Urbanização e Natureza na Amazônia (Urbana). Gosta de viver a cidade, andar de bicicleta, pegar um barco para as ilhas e frequentar programações culturais. Tem vontade de seguir carreira acadêmica e lecionar. “Apesar de parecer solitário o processo de pesquisa, a gente consegue se conectar com muita gente. Seja aberto para conhecer novas realidades, não tenha vergonha de falar sobre os seus interesses. Participe sempre de congressos, simpósios etc. Conheça pessoas e realidades diferentes”, aconselha a pesquisadora às meninas e mulheres que têm vontade de fazer pesquisa.  

Sobre a pesquisa

O trabalho intitulado ‘Repertório da Trama dos Povos da Floresta para enfrentamento de mudanças climáticas em cidades amazônicas’ foi feito sob orientação da professora Ana Cláudia Duarte Cardoso (Itec/UFPA) e contou com financiamento Pibic/CNPq. O estudo foi apresentado durante o XXXIV Seminário de Iniciação Científica da UFPA, realizado pela Pró-Reitoria de Pesquisa e Pós-Graduação (Propesp), tendo sido premiado pelo Edital Pibic Verão Destaque na Iniciação Científica da UFPA (edição 2023), como representante da área de Planejamento Urbano e Regional.

*O conteúdo foi originalmente publicado no Jornal Beira do Rio, da UFPA, edição 169, escrito por Julia Ladeira

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