Enfermeiros da região amazônica investigaram relação da pandemia com condições de trabalho e adoecimento mental

  A pesquisa foi conduzida a partir da aplicação de questionários com um total de 261 enfermeiros da região amazônica do Brasil.

Enfermeiros, assim como outros profissionais de saúde, ou mesmo de outras áreas – que atuaram na linha de frente durante a pandemia de Covid-19, precisaram encarar a doença em pelo menos dois níveis, o pessoal e o profissional. Preocupados com os efeitos desse esforço em sua saúde mental, pesquisadores de diversas instituições investigaram a relação entre sintomas de sofrimento mental com o perfil social, de saúde e laboral destes dos profissionais da região amazônica, durante a pandemia de covid-19.

Eles observaram uma relação significativa entre a carga horária de trabalho, os constrangimentos sofridos no período e a existência de doenças pré-existentes com certos sintomas psicopatológicos. A pesquisa foi conduzida a partir da aplicação de questionários com um total de 261 enfermeiros da região amazônica do Brasil.

Teste do Plano Nacional de Testagem para a Covid-19. Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

Além do perfil socioeconômico, um questionário de auto-relato sobre sintomas psicopatológicos foi utilizado, visando responder sobre quatro condições: ansiedade, somatização, psicoticismo e obsessividade/compulsividade. 

“Em nossas conclusões, observamos uma associação significativa entre a carga horária de trabalho e sintomas de ansiedade; o sofrimento de constrangimentos e/ou violências durante o trabalho com sintomas de somatização; e a existências de doenças prévias com sintomas de psicoticismo”, explica um dos pesquisadores envolvidos, o professor Darci Francisco dos Santos Juntos, da Universidade Federal de Mato Grosso. 

Tensão do período potencializou problemas 

Ansiedade, como muitos já sabem, é um sentimento normal, ligado à preocupação, nervosismo e o medo, mas que pode se tornar um distúrbio quando em níveis muito elevados. A somatização, por sua vez, refere-se aos sintomas físicos que se manifestam relacionados a algum tipo de sofrimento mental, incluindo dores no corpo, alergias, entre outros. E o psicoticismo, por fim, são sintomas de hostilidade e idéias paranóides.

“Na questão da ansiedade, observamos que maiores jornadas de trabalho, com períodos prolongados de contato com os pacientes durante a pandemia, promovia maior exposição do profissional e aumento do risco e da preocupação com se infectar, o que poderia desencadear a ansiedade e o medo”.

Quanto à somatização e os constrangimentos sofridos, o pesquisador lembra que foi um período de muita tensão, com agressão verbal, física e psicológica, tanto por parte da sociedade que tentava negar a pandemia, quanto pelos pacientes.


“Neste caso, havia uma pressão por um atendimento mais rápido, mas a precariedade em que muitos trabalhavam impedia isso, fazendo com que, por vezes, os usuários agissem de forma violenta com a equipe de enfermagem. A violência gera revolta e sofrimento, sentimento de culpa, preocupação, tensão, estresse, desespero, raiva, medo, tristeza, frustração e desinteresse em atuar na área . Esses sentimentos podem, em longo prazo, gerar repercussões negativas para a saúde dos profissionais”.

Já sobre a relação entre doenças pré-existentes e o psicoticismo, o pesquisador lembra que outros estudos também apontam para prevalência de doenças crônicas não transmissíveis (diabetes, hipertensão, etc.) em profissionais da enfermagem. “Isso, somado ao cansaço e ao estresse ocupacional, promovem a falta de tempo do enfermeiro para atividades de autocuidado, o que propicia a ocorrência de adoecimento, como a síndrome de Burnout, e o aparecimento de sintomas psicopatológicos”.

A fim de combater essas situações, o professor Darci destacou ainda a importância do acolhimento psicológico e de melhores condições de trabalho.

“Eu gostaria de enfatizar que não é porque cuidamos das pessoas que estamos imunes ao sofrimento. Somos humanos, assim como você que está em casa lendo essa matéria. Somos uma profissão que trabalha muito, mas que apresenta grande desvalorização profissional”, 

concluiu.

A pesquisa foi publicada em dezembro de 2023, na Revista Brasileira de Enfermagem, com a participação de pesquisadores da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, Universidade Federal do Amapá, Universidade de São Paulo e Universidade Federal de São Carlos. 

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