Antigo prédio da Polícia Federal na Rua Joaquim Nabuco. Foto: Reprodução/Facebook-Manaus de Antigamente
Por Dudu Monteiro de Paula
Em 1969, eu era aluno finalista do Colégio Estadual do Amazonas e na época de junho estávamos comemorando a festa junina com alguns amigos. Fomos comprar catolé para estourar nas festas, como fazíamos naquela época, só que nós resolvemos inovar: pegamos aquela parte do meio do papel higiênico, colocamos 4 ou 5 bombinhas, pólvora e levamos para o banheiro superior direito do Colégio Estadual, colocamos no último banheiro e fomos jogar bola.
Enquanto estávamos jogando bola, a bomba explodiu e nós saimos comemorando como se fosse festa junina mesmo. Entretanto, a época era muito difícil, em que o controle militar sobre a população era muito grande e, imediatamente, fomos todos detidos pela Polícia Federal. A partir daí passamos a ser investigados por eles.
E nós íamos a cada duas vezes na semana, na verdade nós éramos levados por eles, até a Polícia Federal na Joaquim Nabuco (rua no Centro de Manaus), onde hoje é a UniNorte. Uma vez lá, nós íamos para uma sala escura um por um, onde o cara metia uma luz na nossa cara e começava a dizer que nós éramos revolucionários, que nós queríamos mudar o país, que era pra gente dizer o nome do grupo terrorista que a gente participava etc e tal.
E nós íamos dando as informações verdadeiras, que não tinha nada a ver com isso, mas que eles não acreditavam em nenhum momento porque o Brasil vivia um a situação muito peculiar quanto a isso.
Passado um tempo, eu fui abastecer o meu Gurgel (carro) na Joaquim Nabuco com a Ramos Ferreira, e naquele posto de gasolina encostou do meu lado o João Bosco Falabella, que tinha uma motocicleta na época, uma Vespa, e nós começamos a conversar um com o outro. E nós estávamos abastecendo e conversando um com outro.
E eu dizendo pra ele: “Rapaz, nós vamos acabar sendo expulso do Brasil. Tudo porque nós fizemos uma brincadeira e está sendo interpretado como se fosse terrorismo. Ele respondeu: “Só porque nós estávamos soltando bombinha de São João”.
Era mesmo de São João! Lógico, nós fabricamos a bombinha, compramos o material e adaptamos no papel higiênico e BUUUM! O banheiro caiu todo! Mas não tínhamos a intenção revolucionária, era São João. Naquela época, quando pegavam alguém assim, não era nem exilado ou expulso do país. O fato é que depois a conversa alongou de outros assuntos e nós fomos embora.
Na segunda-feira seguinte, quando nos apresentamos para continuar os interrogatórios, o chefe da Polícia Federal recolheu todo mundo numa mesma sala. O homem se chamava Nobre Leão e nos disse: “Vocês estão soltos, nós sabemos de vocês!”. Daí deu uma lição de moral bem grande na gente, tipo: “Vocês são uns babacas! Vocês não são a favor da revolução…”.
Disseram que nós tínhamos sido inocentados, porque descobriram que nós tínhamos feito aquilo de brincadeira, mas que aquilo não era brincadeira de homem não. Devido a situação que vivia o Brasil, que nós não devíamos brincar daquele jeito. E isso aconteceu, eu terminando o ano e no ano seguinte eu me apresentei ao Exército para trabalhar.
E o que essa história conclui é que 10 anos depois, já de alguma forma o regime um pouco mais solto e já com algumas influências, descobrimos que quem nos salvou do processo todo foi o frentista do posto que era informante da Polícia Federal. Imagina isso, vou repetir: nós fomos soltos porque o frentista do posto era informante da Polícia Federal e ele ouviu nossa conversa e comunicou.
– Óh! Os caras fizeram de brincadeira, eu ouvi aqui no posto numa converse informal deles.
Foi como nos soltaram. Porque senão talvez eu nem estivesse aqui. Talvez tivesse sido tudo diferente. O que eu estou querendo dizer é que nós vivíamos num regime de recessão tão grande que as pessoas hoje nem imaginam como existiam informantes da Polícia Federal a respeito do sistema de governo brasileiro, em todo o país.
Então você imagina como era naquela época, vivermos fiscalizados ○ tempo todo, mas um desses fiscais nos salvou ou da expulsão do Brasil ou quem sabe da prisão de inocentes, que não tinham nada a ver com isso. E isso hoje ninguém entende!
Na televisão, eu ia falar e tinha o cara que 24 horas antes recebia o que eu ia dizer. Na hora ele ficava sentado no comando. Se eu dissesse qualquer coisa fora do script, ele ‘pum!’, tirava a televisão do ar. Eu ou qualquer um que o fizesse.
Eu conto isso hoje aos estudantes e eles não entendem, eles nem acreditam porque hoje tem internet, que “não tem como controlar”, mas antes não era assim. Então essa formação, foi diferente.
Eu sou do tempo que se você quisesse comprar um livro e ele custasse R$ 5,00, se tu fosses na tua casa buscar os R$5,00 quando tu voltava já era R$5,10. E tu ias pegar os 10 centavos para completar, mas quando voltavas já era R$5,20. Porque era inflação momento a momento.
Todo mundo tinha uma maquinazinha na mão e ficava ‘rec- rec- rec- rec’, remarcando os produtos. E isso eu não quero que volte nunca mais! E está voltando! As autoridades não aprendem nem com os erros do passado. Sempre acham que são os donos da verdade… Mas isso é formação educacional! E isso se perdeu…
Por hoje é só! Semana que vem tem mais! Fuuuuuuiiiiiii!!!!!
Sobre o autor
Eduardo Monteiro de Paula é jornalista formado na Universidade Federal do Amazonas (Ufam), com pós-graduação na Universidade do Tennesse (USA)/Universidade Anchieta (SP) e Instituto Wanderley Luxemburgo (SP). É diretor da Associação Mundial de Jornalistas Esportivos (AIPS). Recebeu prêmio regional de jornalismo radiofônico pela Academia Amazonense de Artes, Ciências e Letras e Honra ao Mérito por participação em publicação internacional. Foi um dos condutores da Tocha Olímpica na Olimpíada do Rio de Janeiro, em 2016.
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