Submerso pela água barrenta, mistura da vazão da Bacia Amazônica com o mar, um recife se estende por cerca mil quilômetros, entre a costa do Maranhão e da Guiana Francesa. Diferente da imagem conhecida, de recifes formados por corais coloridos, na costa amazônica predominam esponjas e algas calcárias, que se adaptam melhor à falta de luz.
A descoberta foi publicada na edição de 18 de abril, da revista científica Science, por uma equipe de pesquisadores brasileiros e americanos, e é resultado de duas expedições, a primeira realizada a bordo do navio americano RV Atlantis e a segunda, já com uma equipe totalmente nacional, no navio da marinha brasileira Cruzeiro do Sul.
“O que chama a atenção nesse recife são as esponjas”, conta o principal responsável pela descoberta, o biólogo brasileiro Rodrigo Leão Moura, da Universidade Federal do Rio de Janeiro. “Não é um recife de coral, como estamos acostumados, mas é um recife diferente, com muitas esponjas e algas calcárias, porque chega pouca luz”, disse.
De acordo com ele, nesse ambiente de mais de 9 mil quilômetros quadrados, área equivalente à Grande São Paulo, é possível dar uma ideia de como o cenário de mudanças climáticas extremas pode afetar os recifes. “Os corais morrem, as esponjas se tornam mais abundantes e, principalmente, os microorganismos passam a dominar o sistemas, principalmente bactéria e arqueas”, explica.
Americanos surpresos
A descoberta surpreendeu os americanos que realizavam a primeira expedição no RV Atlantis, pois a intenção principal da viagem era estudar como os elementos carregados pelo Rio Amazonas afetavam a absorção de Dióxido de Carbono pelo mar. Moura e outros brasileiros tinham aproveitado a viagem para confirmar a existência e localizar um recife que se esperava encontrar naquela região. “A gente já vinha juntando indícios há alguns anos”, diz Rodrigo Moura. “Tinha que haver um recife grande em algum lugar. As estatísticas de pesca indicavam. Tem muita produção de lagosta no Pará, de onde vem? Tem muita produção de pargo, de onde vem?”.
A descrença inicial dos americanos foi superada graças a um artigo escrito em 1977 que demonstrava a existência de espécies típicas de recifes sendo dragadas na foz do Amazonas. Ao longo de duas semanas e meia de trajeto entre Barbados, no Caribe, e a costa amazônica, os brasileiros tinham pouco tempo, mas aproveitaram para ficar atentos ao sonar que descrevia o fundo do mar. Assim, quando teve a oportunidade, Moura sabia onde jogar a draga para confirmar a existência do Recife.
Ele lembra que foi uma grande alegria encontrar no material trazido do fundo do mar, corais, esponjas, estrelas do mar, que confirmavam a existência do ambiente. Em 2014, os brasileiros voltaram à região para mais estudos, desta vez a bordo do Cruzeiro do Sul, navio científico da Marinha.
Neste ambiente recém-revelado, a pluma do Amazonas tem um papel fundamental. Ela é formada pelo material que desce carregado pelo grande rio. Na parte sul, onde essa camada de lama cobre o fundo apenas três meses por ano, ocorre mais fotossíntese, permitindo o crescimento de corais mais coloridos. Porém, ao norte, onde a pluma do Amazonas cobre o fundo do mar por mais da metade do ano, esse recife é dominado por esponjas e criaturas carnívoras.
Novas perguntas
Para Rodrigo Moura, ainda há desafios a serem vencidos. Um deles é estudar melhor a biodiversidade e o potencial biotecnológico das espécies da região. Entretanto, mais importante é conhecer melhor o ambiente, já que a região poderá ser palco de uma futura exploração de gás e petróleo. “A gente precisa entender os detalhes da distribuição destes recifes, inclusive para evitar o conflito com a exploração da área de óleo e gás”, defende o pesquisador. “É preciso fazer um mapeamento mais detalhado, para que dutos e estrutura usados na exploração sejam colocados em local que prejudique menos o sistema.”, afirmou.