Izolena Garrido já catalogou 153 tons e agora divide a experiência com crianças da Escola Municipal Santa Rita, onde ela também trabalha
À primeira vista, a Floresta Amazônica é uma vastidão onde as únicas cores visíveis são o verde das árvores e o azul do céu. Além disso, a tonalidade das águas dos rios ajuda a compor a paleta natural do ecossistema.
Apesar disso, na Comunidade do Tumbira, que fica no Arquipélago de Anavilhanas, a 60Km de Manaus, a professora e artesã Izolena Garrido descobriu mais de 150 outras cores que a própria floresta oferece e que dão um tom especial nas biojoias que ela mesmo produz.
Resina de árvore de macucu, folhas de crajiru, argila, capim, casca de pequiá… tudo vira cor nas mãos da artesã. Atualmente, ela já catalogou 153 tons e o trabalho não para por aí. Em sua casa, que fica literalmente em cima do Rio Negro, ela se debruça por horas na produção das jóias, testando cores e buscando sempre inovar no trabalho.
“Quando você entra nesse mercado de descobertas, não é que você vicia, mas você quer descobrir tudo o que você toca, tudo o que a floresta te oferece. Então você olha a argila, a folha, a flor, as raízes, cascas, sementes, tudo vira um possibilidade de cor. E você começa a catalogar tudo o que encontra. Quando você entra na mata, é como se a própria natureza dissesse: ‘eu existo’. Aí você vai enxergando tudo o que você nunca viu antes. É um momento que você recebe o que a própria floresta pode te dar”, explicou.
Izolena trabalha há mais de cinco anos com artesanato. Com o tempo, foi adquirindo experiência e passando para outras pessoas. No entanto, as cores das peças produzidas sempre a incomodaram.
E foi aí que surgiu o interesse em procurar novos tons. Para isso, ela resgatou memórias da própria infância e usou o pai como referência.
“Eu dou cursos e orientação para pessoas que estão iniciando e nos grupos que eu passava eram sempre as mesmas cores. Isso me incomodava, porque eu olhava e via que era praticamente uma cópia dos materiais vendidos no Mercadão [Mercado Adolpho Lisboa, em Manaus]. E um dia eu olhei para uma colega minha e disse: vamos mudar? Foi então que eu comecei a pesquisar e lembrei que meu pai, quando eu era mais nova, usava a malhadeira para pescar, e pintava a rede com folha de crajiru para atrair os peixes”, contou.
Para fixar as cores, ela desenvolveu uma técnica própria de tingimento, que envolve ferver a matéria-prima em água quente com sal. Da casca de piquiá com resina de árvore de macucu, ela consegue extrair o marrom avermelhado. Já o urucum com a folha do crajiru, vermelho-laranja. Do capim, o cinza. E por aí vai.
“Comecei a tingir pequenas quantidades. Primeiro foram oito cores, depois 12, 27, 85 e agora já são 153 tons que eu já cataloguei”.
Mas a aplicação dos tons nas biojóias não é o único trabalho da artesã. Ela também é professora da Escola Municipal Santa Rita, que atende as crianças da comunidade. E além de ensinar todas as matérias da grade curricular, ela também passa às novas gerações noções de empreendedorismo ambiental.
“Trabalho com educação infantil com classes multisseriadas, ou seja, trabalho todas as disciplinas do Ensino Fundamental I. Não chega a ser desafiador, porque a gente já superou o desafio. E além disso, eu trabalho com 20 crianças a pesquisa de novas cores. Estamos parados por conta da pandemia, mas o trabalho é manual e feito em casa, de forma que eles podem encontrar as cores nas próprias plantas do quintal. Quando a gente fazia isso na escola, eles traziam e a gente já aplicava no próprio papel”, contou a professora.
Izolena também explicou que desde cedo ensina as crianças a ganhar a vida sem danificar a floresta. Para ela, isso é ser sustentável.
“Ser sustentável é olhar ao nosso redor e encontrar meios de sobreviver sem depredar a natureza. Trazer isso para a escola é um resgate cultural e uma forma de ensinar as crianças a serem empreendedoras. Não é ser um empreendedor capitalista, mas ganhar e saber manter a floresta em pé”.
*Texto por Matheus Castro, do G1 Amazonas