Roraima enfrenta crise hídrica após principal rio do Estado secar 28 centímetros em um mês

Companhia de Águas e Esgotos de Roraima (Caer) classificou o momento como ‘crise hídrica’ devido à situação de municípios do interior, como São Luiz, São João da Baliza e Pacaraima, que enfrentam falta de água.

O Rio Branco, principal rio de Roraima, baixou 28 centímetros em quatros dias e atingiu -30 centímetros nessa sexta-feira (15), o menor nível registrado em 2024. Com a estiagem que atinge Roraima, municípios do interior tem enfrentado falta de água e a Companhia de Águas e Esgotos de Roraima (Caer), empresa responsável pelo fornecimento, classifica a situação como “crise hídrica“.

Na capital, o Rio Branco é a principal fonte de abastecimento e atende 70% da população. Os outros 30% são de poços artesianos perfurados em vários pontos da capital. Porém, segundo James Serrador, presidente da Caer, a situação mais crítica ocorre mesmo nos municípios do interior.

Em todo Estado, a distribuição de água é feita por meio rios e de poços artesianos. Ao longo dos últimos dias, estas fontes têm registado baixas no nível de água, o que impacta a vida de moradores de cidades como Mucajaí, Pacaraima, São João da Baliza e São Luiz – as três últimas “praticamente em colapso”.

“Nós estamos numa crise hídrica porque o estado de emergência é em função da estiagem. O efeito mais visível para as pessoas […] são as queimadas. Mas o efeito mais drástico é a falta de água para as pessoas. Nós temos três municípios [Pacaraima, São Luiz e São João da Baliza] praticamente em colapso, com barragens que nunca secaram e que estão secas”, explicou o presidente.

Rio branco em março de 2024. Foto: Josivan Antelo/Rede Amazônica

Atualmente, Roraima enfrenta o período seco, que deve durar até abril. Além da falta de chuvas, incêndios florestais atingem o estado e consomem casas, animais e a vegetação. A estiagem tem sido agravada pelo fenômeno El Niño, quando ocorre o aquecimento anormal do Pacífico equatorial.

Além disso, outras cidades também enfrentam problemas de desabastecimento, como em Mucajaí, onde a população tem armazenado água em baldes para fazer tarefas do dia a dia. Em Pacaraima, moradores tem dependido de caminhões-pipa (veja relatos mais abaixo).

Por conta do cenário, nove municípios do estado estão em situação de emergência desde fevereiro. A seca no Rio Branco tem sido notada desde setembro do ano passado, com o fim do período chuvoso no Estado. Com a seca do rio, bancos de areia se formaram na Orla Taumanan principal ponto turístico de Boa Vista.

Queda de 22% no volume de distribuição de água em Boa Vista

Na avaliação da Caer, a capital ainda não corre risco de racionamento, mas o cenário pode mudar caso o Rio Branco baixe mais 60 centímetros, ou seja, se o rio atingir -70 centímetros.

Em 2016, quando o estado enfrentou uma das piores secas da história, o volume de água ficou em -59 centímetros. À época não houve racionamento de água.

No dia 12 de março houve comprometimento de 30% do abastecimento de água em Boa Vista devido aos detritos vindos do leito do Rio que atingiram uma das bombas de capacitação — situação que pode ocorrer novamente, segundo James.

De acordo com os técnicos da empresa, os tubos de concreto onde estão localizadas as bombas de captação estão apenas com 1,2 metros de água, o que compromete o bombeamento.

“Essas situações poderão se agravar à medida que o rio continua baixando. Então, aqui em Boa Vista, a gente tem um sistema de captação superficial que vai conseguindo suprir um pouco. Se a gente precisar desligar uma das bombas, que é o que pode acontecer se o rio baixar mais 40 centímetros vai ter que desligar bomba e vai ter racionamento, mas a gente espera que isso não aconteça”.

Em outubro do ano passado, a Caer havia informado que distribuía 1.800 litros de água por segundo para a população, mas com a seca o presidente estima que o volume caiu para 1.400 por segundo – uma queda de 22%.

A Caer distribui água para cerca de 115 mil unidades consumidoras na capital, mas a companhia considera toda a população de 413 mil como consumidores.

“A gente começa a ver que o Rio Branco que é um manancial que a gente imaginava seguro de capacitação já está apresentando problemas. Antes a gente tinha problemas nos poços, nas barragens em Pacaraima, São Luiz e Baliza, que secaram, mas são barragens que não são correntes, armazenaram água da chuva. Agora já temos problemas a partir do Rio Branco”, 

avaliou o presidente.

Para tentar amenizar os efeitos da escassez de água, a companhia iniciou a perfuração de poços artesianos nas cidades mais afetadas. A medida iniciou em fevereiro deste ano e na ocasião a Caer anunciou a perfuração de 50 poços.

Até o momento, sete poços foram perfurados, sendo um na capital e outros seis em municípios do interior, como São Luiz e São João da Baliza. Além disso, a companhia disponibilizou oito caminhões pipa em seis cidades, três em Pacaraima, e um em Iracema, São João da Baliza, Caracaraí, Rorainópolis e São Luiz.

A previsão é que na próxima semana mais poços sejam perfurados nos municípios do interior mais afetados. Ainda de acordo com o presidente, a Caer não enfrenta problemas operacionais, mas o problema tem se agravado por conta da forte estiagem.

“A única coisa que a gente pode fazer nesse momento fora da atividade operacional da Caer é a nossa ação humana, é você realmente economizar cada gota de água potável”, aconselhou.

“O jeito é armazenar água”

Francisco Javier busca água a pé em poço artesiano do município. Foto: Yara Ramalho/g1 Roraima

Em Mucajaí, um dos municípios que está em emergência devido à estiagem, moradores estão armazenando a água em baldes devido à instabilidade no serviço, problema que ocorre há três meses, segundo moradores. “O jeito é armazenar água. É a única forma”, desabafou um morador.

Na última semana, a situação piorou com horas seguidas sem ter sequer como fazer comida. O morador Almir Oliveira, de 67 anos, tenente que trabalha no Colégio Estadual Maria Maricelma, disse que somente nesta semana foram três dias (segunda, terça e quarta) passando pela incerteza na hora de abrir a torneira.

“Olha, a água aqui em Mucajaí tá tendo só à noite e dificilmente sobe pro chuveiro ou dá pra você usar a máquina de lavar roupa, ou lavar a louça, e até fazer comida. A gente precisa se virar para conseguir fazer as coisas do dia a dia”, afirmou.

Já em Pacaraima, os moradores estão sem água encanada e dependem de caminhão-pipa ou se deslocam até os poços artesianos da cidade com baldes. Para tirar a água do poço, as pessoas precisam levar uma mangueira de casa.

Natural de Caracas, capital da Venezuela, Francisco Javier, de 54 anos, vive sozinho em Pacaraima e precisa encher ao menos um galão de água por dia nos poços da cidade.

“Eu tenho que ficar pegando água aqui [no poço] para tomar banho, limpar o banheiro. Às vezes, para fazer a comida, tenho que comprar água mineral nos supermercados. A mangueira para tirar a água também [tem que comprar] e ficou até mais cara esses dias”, explicou.

Boa parte do Estado fica no hemisfério Norte, por isso, atualmente está na estação seca, chamada de “verão amazônico” – o período vai de outubro a março. Os meses de dezembro e janeiro são os mais secos, com registro de poucas chuvas.

*Por Samantha Rufino, do g1 Roraima

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