Especialistas explicam que baixa arborização em Manaus eleva temperaturas e prejudica saúde de moradores

A baixa cobertura vegetal é um dos fatores preponderantes para que os níveis de temperaturas sentidos na cidade estejam cada vez mais altos.

Uma das problemáticas em Manaus (AM) é a baixa arborização na cidade. Tal problema, apontado por especialistas, não é apenas de ordem ambiental e urbanística, mas também tem impacto direto nas altas temperaturas registradas ao longo do ano e também influencia na saúde dos moradores da capital amazonense.

Dados do Censo 2010, realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), apontam que a capital do Amazonas é a terceira menos arborizada do país com apenas 23,90% de sua área arborizada. Apesar de antigos, são esses os parâmetros que norteiam os pesquisadores da área.

No ano que vem, o recorte deve ser atualizado com os dados do novo recenseamento, mas quem trabalha com isso sabe que, independentemente de avanços ou retrocessos nos dados, é preciso muito trabalho para que a cidade atinja níveis satisfatórios de arborização.

Foto: Eliana Nascimento/G1 AM

O engenheiro agrônomo e ex-presidente da Sociedade Brasileira de Arborização Urbana, Heitor Liberato, disse que a baixa cobertura vegetal da capital impacta diretamente na saúde das pessoas, além de ser um dos fatores preponderantes para que os níveis de temperaturas sentidos na cidade estejam cada vez mais altos.

“Temos situações em que isso interfere na saúde e na parte psicológica dos habitantes. Muitas vezes a gente pensa que a arborização está mais ligada nessa questão da parte estética, da beleza. Mas isso também tem uma interferência psicológica no munícipe. É algo que interfere diretamente na questão da saúde física e psicológica das pessoas”, explicou.

Já a questão do impacto da falta de árvores como fator crucial para as altas temperaturas na capital, desde 2008 os pesquisadores alertavam para o problema. Segundo Heitor, naquele ano, durante o 12º Congresso Brasileiro de Arborização, um trabalho mostrou a diferença entre duas importantes avenidas da capital, sendo uma arborizada e a outra não. 

“Um estudante universitário fez um levantamento da temperatura da Avenida Getúlio Vargas com arborização, e da Avenida Constantino Nery sem arborização. A diferença de temperatura no mesmo horário, desses dois ambientes, do ambiente arborizado e do não arborizado, foi de seis graus Celsius”, 

alertou.

Neste ano, Manaus chegou a registrar uma máxima de 38,2ºC. O dado é de setembro e chega perto da maior máxima dos últimos 90 anos, que é 38,6º C, registrada em 2015. Com o passar dos anos, parece que o calor só aumenta e as árvores, que ajudariam a diminuir isso, desaparecem.

Problema surge com a expansão da cidade

Segundo o engenheiro agrônomo, o problema surgiu com a expansão da cidade na década de 1960 e a proliferação de bairros sem planejamento. A falta de execução de um plano de diretor também contribuiu para o fenômeno.

“A Zona Franca trouxe um crescimento muito veloz para a cidade e inicialmente se previa um plano diretor local integrado e com isso foi criado esse plano justamente para preparar a cidade para esse crescimento. Só que esse plano ele não foi executado”, contou.

“Do final da década de 1960 até a virada do século, nós saímos de 300 habitantes para 1.000.500. Ou seja, nós crescemos 500% nesse intervalo. Uma velocidade muito grande e o planejamento urbano não acompanhou. Então, o que aconteceu foi que nós tivemos, na realidade, a criação, o surgimento de bairros sem planejamento, e de uma hora para outra, a cobertura vegetal da cidade foi retirada. E esses bairros, que são originados sem planejamento, eles também não têm passeio. Eles não têm canteiro central, ou seja, eles não têm espaço para as árvores”, afirma.


Para resolver o problema, Heitor acredita que os gestores públicos precisam tirar do papel o Plano Diretor da Cidade e darem maior atenção a uma política ambiental para garantir qualidade de vida às futuras gerações.


“Manaus tem um plano diretor de arborização urbana, mas a gente precisa fazer com que esses planos saiam do papel e sejam praticados. A gente precisa de política, responsabilidade e atuação dos municípios. Nós temos a norma, já temos as diretrizes da arborização urbana no papel. Agora a gente precisa que esse plano ele seja realmente executado”, 

disse.

Em 2016, a Prefeitura de Manaus chegou a lançar o Plano Diretor de Arborização Urbana da capital. O documento traz normas relativas, por exemplo, ao percentual permitido de espécies nativas e exóticas, padrão para abertura de covas, regras para plantio e transplante, requisitos para autorização de corte e poda, além dos cálculos de medidas compensatórias e espécies indesejáveis para a arborização.

Segundo o secretário Municipal de Meio Ambiente da capital, Antônio Stroski, a meta deste ano é produzir 100 mil mudas. No entanto, até setembro a capital só produziu 7.950 mudas e plantou 257. Outras 8.409 mudas foram doadas e 2.835 mudas foram recebidas, como uma forma de compensação ambiental.

Stroski também falou sobre a forma como o IBGE mede a arborização na capital. Segundo ele, é preciso considerar a cobertura vegetal da cidade por metro quadrado.

“Consideramos inadequado para a cidade de Manaus [o método usado pelo IBGE], porque ele considera face de quadra, e diante do processo de ocupação da área urbana de Manaus, é mais indicado adotar o método de metro quadrado de área verde por habitante. Neste quesito, o município de Manaus atende o índice mínimo estabelecido pela Organização Mundial de Saúde. Isso não quer dizer que não vamos fazer esforços para ampliar a arborização. Vamos fazer sim, nas áreas densamente ocupadas, conforme o plano estabelecido”, informou.

Medidas que ajudam a combater problema

Professora e família criaram jardim ao lado de casa no São Francisco. Foto: Matheus Castro/g1 Amazonas

Na Zona Sul de Manaus, a professora Lizane Melo e sua família resolveram, por conta própria, tentar criar um clima aconchegante no entorno da casa onde moram. Eles perceberam a falta de árvores na vizinhança e como isso impactava na saúde deles, e criaram um jardim. Além de melhorar a temperatura, o espaço também passou a ser uma espécie de terapia para a família.

“A gente começou a cultivar algumas árvores de plantas frutíferas e ornamentais, que é uma tentativa de minimizar esse clima tão quente da nossa cidade, né? Isso minimiza bastante, cria um microclima bom e facilita o nosso dia a dia, na questão da saúde também. Minha mãe é hipertensa e a gente percebe que essa alta temperatura facilita os picos de pressão, e também na questão de irritabilidade”, disse.

*Com informações da matéria escrita por Matheus Castro, do g1 Amazonas

Publicidade
Publicidade

Relacionadas:

Mais acessadas:

Estudo internacional mostra que relação da Amazônia com a seca não é uniforme

O território tem capacidade variável de resposta à crise climática e algumas regiões parecem ter chegado ao ponto de colapso ecológico.

Leia também

Publicidade