É possível fazer também buscas específicas pelas populações de botos existentes no continente: o boto-cor-de-rosa; o boto-tucuxi; o boto-boliviano e o boto-do-Araguaia.
Um grupo de pesquisadores de cinco países da América do Sul lançou em outubro, a plataforma Botos Amazônicos. Esta ferramenta tem o objetivo de disseminar informações sobre os “golfinhos de rio” da região amazônica – e traz diversos dados sobre as espécies como distribuição geográfica, estimativas populacionais, ameaças e barreiras naturais.
O objetivo é que a plataforma ajude nos processos de tomada de decisão e no planejamento de ações para a conservação destes mamíferos. Botos Amazônicos está disponível em inglês com acesso gratuito. Versões em português e espanhol estão sendo produzidas; e um storymap com informações resumidas em português está disponível para consulta pública.
A iniciativa é fruto do trabalho de um colegiado de cientistas chamado SARDI – South American River Dolphins Initiative, ou “Iniciativa Golfinhos de Rio da América do Sul” – que reúne pesquisadores de cinco países (Brasil, Peru, Colômbia, Bolívia e Equador) para gerar novos conhecimentos sobre esses animais. O WWF-Brasil é um dos facilitadores deste coletivo desde o seu surgimento, em 2017.
Pesquisa
Nos últimos anos, os cientistas de SARDI têm feito diversas expedições às bacias dos rios Amazonas e Tocantins-Araguaia, no Brasil; e Orinoco, na Colômbia. Eles compilaram resultados de expedições que percorreram cerca de 47 mil quilômetros de rios amazônicos, com 42 esforços de estimativas populacionais feitos em 45 rios, tributários e lagos.
Botos Amazônicos está estruturado na forma de um mapa que traz diversas camadas (layers) de informação. Assim, é possível combinar essas camadas para fazer leituras mais detalhadas dos dados constantes na plataforma.
Entre as camadas disponíveis, há uma que mostra todas as expedições feitas a campo para estudar botos na América do Sul; a localização de hidrelétricas previstas na Amazônia; a localização das Terras Indígenas dentro deste bioma; os locais onde já foram feitas colheitas de material genético dos botos; e onde esses animais têm sido contaminados com mercúrio.
É possível fazer também buscas específicas pelas populações de botos existentes no continente: o boto-cor-de-rosa (Inia geoffrensis); o boto-tucuxi (Sotalia fluviatilis); o boto-boliviano (Inia boliviensis) e o boto-do-Araguaia (Inia araguaiaensis).
Compilação
A pesquisadora do Instituto Mamirauá Miriam Marmontel estuda os mamíferos aquáticos há quase 30 anos. Ela contou que a riqueza de informação na plataforma Botos Amazônicos é o grande diferencial deste produto.
“Sob esse ponto de vista, ela é uma plataforma poderosíssima. Ela compila tudo que sabemos sobre os botos amazônicos como distribuição, amostras de material genético, os conflitos, e as interações desta espécie com a pesca. Podemos analisar de diversas formas e tomar decisões mais embasadas para buscar a conservação destes animais”, descreveu.
Miriam contou ainda que as informações disponíveis na plataforma são fruto de um sério e dedicado trabalho de pesquisa, que podem ser usadas com critério, segurança e respaldo científico: “É bacana e surpreendente que um grupo grande de cientistas tenha resolvido compartilhar seus dados, para montamos esse cenário amplo sobre a situação de conservação dos botos da América do Sul. Nosso objetivo, no final das contas, é que as pessoas entendam quais são os problemas que as espécies estão enfrentando e quais questões precisamos endereçar para garantir a conservação delas”.
Analista de conservação do WWF-Brasil, Marcelo Oliveira explicou o porquê da plataforma estar disponível inicialmente em inglês. “Nosso objetivo foi de que o maior número de pessoas, no mundo todo, pudesse ter acesso às valiosas informações que foram reunidas nesta ferramenta. Mas para não deixar o público latinoamericano sem acesso a essas informações, produzimos também o storymap”, explicou.
Decisões de conservação
A doutora em Ecologia e pesquisadora do Instituto Aqualie Mariana Frias foi a responsável por compilar os dados e disponibilizá-los na plataforma. Ela contou que o trabalho envolveu muitas entrevistas com cientistas e levou cerca de seis meses.
“O primeiro aspecto interessante dessa plataforma é que ela é muito visual. Com isso esperamos que ela leve informações ao público de maneira clara, didática e objetiva”, explicou Mariana – que também é vinculada a Universidade Federal de Juiz de Fora.
Mariana declarou ainda que a quantidade de informações disponíveis em Botos Amazônicos permite que sejam tomadas decisões de conservação muito mais embasadas e consistentes do ponto de vista científico: “Conseguimos ver, por exemplo, onde estão os maiores grupos populacionais e onde estão as Unidades de Conservação. Com isso, temos uma ferramenta de manejo muito eficiente que pode servir para influenciar e pressionar autoridades”.
Diretor-executivo da Fundação Omacha, da Colômbia, Fernando Trujillo contou que os botos dependem de um ambiente equilibrado, que tenha boa qualidade de água e disponibilidade de alimento. “Garantir a qualidade das águas dos rios e o equilíbrio dos estoques pesqueiros não é vital apenas para os botos, mas também para os quase 34 milhões de habitantes da Amazônia”, disse o pesquisador.
Sobre os botos
Os botos estão presentes por toda a Amazônia, assim como em rios da Ásia. Eles estão no topo da cadeia alimentar dos ambientes em que se encontram e também são considerados precisos “bioindicadores”: ou seja, se as populações deles apresentam sinais de que são populações íntegras e saudáveis, isso significa que o ambiente ao redor – rios, lagos, encostas, florestas – também é.
Hoje as maiores ameaças a esses animais são o garimpo ilegal, que contamina os botos com mercúrio; e a pesca da piracatinga (Calophysus macropterus).
Os pescadores usam a carne dos botos como isca e por isso eles são muito caçados por toda a Amazônia. O bycatch, a pesca acidental ou incidental, feita quando o animal não é o alvo principal da pescaria, também é outro grave problema para a conservação dos botos amazônicos.
A União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN, na sigla em inglês) reconhece apenas duas espécies de botos na América do Sul: o boto-cor-de-rosa (Inia geoffrensis); e o boto-tucuxi (Sotalia fluviatilis). A iniciativa SARDI advoga pelo reconhecimento de outras duas espécies – o boto-boliviano (Inia boliviensis) e o boto-do-Araguaia (Inia araguaiaensis). Parte do trabalho do grupo é gerar informações para reforçar os argumentos em favor deste reconhecimento.
Sobre SARDI
South American River Dolphin Initiative (SARDI) é uma mobilização, criada em 2017, que reúne cientistas de vários países que desenvolvem ações de conservação em prol dos botos da América do Sul. Ela é formada por várias instituições e cientistas diferentes, que, de maneira individual ou coletiva, já trabalhavam com a conservação esta espécie.
O que SARDI propõe é unir conhecimentos, experiências e práticas desses profissionais para aperfeiçoar esses esforços de conservação e assim contribuir com a manutenção, saúde e integridade das populações dos botos sulamericanos.
Fazem parte deste grupo as seguintes organizações: Faunagua, da Bolívia; Fundación Omacha, da Colômbia; Prodelphinus e Solinia, do Peru; e Instituto Mamirauá e Instituto Aqualie, do Brasil. O WWF participa desta iniciativa por meio de seus escritórios em todos esses países. A SARDI trabalha alinhada com a River Dolphin Rivers Initiative (RDRI) da Rede WWF – um esforço global do WWF que busca a conservação de botos amazônicos e asiáticos.