Animais foram filmados em uma área ligada a um corredor ecológico. Monitoramento é feito por projeto de preservação da biodiversidade.
Uma onça-pintada – maior felino das Américas – , uma onça parda e até uma jaguatirica, animais ameaçados de extinção no Brasil, foram flagradas na floresta por uma armadilha fotográfica montada numa área de reserva legal no Sul de Roraima. Os registros raros fazem parte do projeto ‘Roraima Silvestre’, que prevê a educação ambiental e a preservação da biodiversidade na região.
O trabalho é desenvolvido por pesquisadores do campus Novo Paraíso do Instituto Federal de Roraima (IFRR) no município de Caracaraí desde outubro do ano passado. Ao todo, são 10 câmeras distribuídas por uma área de 600 metros de largura e 2 quilômetros extensão.
Além dos felinos, as câmeras instaladas já captaram outros animais que vivem na Floresta Amazônica, como anta, veado-mateiro, tatu-canastra, tamanduá-bandeira, araras, garças, tucanos e cobras.
Flagrantes
O primeiro registro fotográfico de felino silvestre foi o da onça-parda, também conhecida como puma, que “passeou” de forma rápida na frente da câmera – apenas metade dela foi flagrada, no dia 4 de abril deste ano. O animal era adulto.
O macho da onça-pintada foi o segundo a ser registrado. O vídeo flagrou o momento em que ela passou por um riacho durante o dia. Em seguida, parou em frente a uma das câmeras. Lentamente, a “rainha das Américas” vai embora. O registro foi no dia 8 de abril, quatro dias após o da onça-parda.
Já o registro da jaguatirica ocorreu durante a noite, também em abril, mas as imagens só foram divulgadas dia 16 de julho. No vídeo, o animal macho fareja as coisas ao redor e vai embora logo em seguida, sem fazer barulho.
O monitoramento do “Roraima Silvestre” tem o objetivo de promover a educação ambiental e a preservação da biodiversidade, a partir do estudo e disseminação de conhecimento sobre a fauna silvestre existente no sul do estado.
O coordenador do projeto, doutor em ciências e mestre em zootecnia, professor Rafael Teixeira de Sousa, explicou que área monitorada pelo projeto está 80% preservada, o que a torna “um importante reduto de espécies ameaças que estão em extinção no país e em outras partes do mundo”.
Ele explicou ainda que os registros da onça-pintada e da jaguatirica são considerados raros porque tratam-se de animais “cismados”, que evitam ao máximo a presença humana.
“Tanto a onça-pintada quanto a jaguatirica são animais bem cismados, evitam ao máximo a presença humana, por vários motivos, dentre eles a caça predatória. Então, alguns preferem explorar a região a noite como é o caso da jaguatirica, já a onça-pintada é mais destemida e o registro dela foi feito durante o dia bem próximo a câmera de trilha”, disse Rafael.
Mesmo ameaçados de extinção, a presença dos felinos tem sido constantemente presenciada pelos profissionais que atuam no monitoramento ambiental da região, por meio das pegadas, fezes, registros fotográficos e de vídeos e até da vocalização, como o esturro da onça-pintada.
“Originalmente a distribuição da onça-pintada ocorria desde o sudoeste dos Estados Unidos até o norte da Argentina. Atualmente ela está oficialmente extinta nos Estados Unidos, é muito rara no México, mas ainda pode ser encontrada na América Latina, incluindo o Brasil. De maneira geral, porém, suas populações vêm diminuindo onde entram em confronto com atividades humanas. No Brasil ela já praticamente desapareceu da maior parte das regiões nordeste, sudeste e sul”,
explicou Rafael.
Câmeras acopladas nas árvores
Acoplada a árvores, a “camera trap”, ou armadilha fotográfica, fica camuflada com uma lente por fora. Acionada por movimentos e com visão infravermelha, essa armadilha não captura e nem machuca os animais, mas registra fotos e vídeos tudo que eles fazem e isso ajuda a estudar os animais em seu habitat.
“Essas câmeras possuem um sensor de movimento que é acionado na presença dos animais, além de permitir a captura dos registros durante a noite, a partir do sistema infravermelho, permitindo a gravação de fotos e vídeos, sem interferir na dinâmica natural da fauna silvestre, já que deixamos esses equipamentos camuflados na mata”, ressaltou Rafael de Sousa.
A fauna silvestre tem os sentidos aguçados, principalmente o olfato e audição e, mesmo quando percebem as câmeras, os animais não ficam envergonhados. A maioria deles passa perto das armadilhas e até cheiram o equipamento.
Roraima Silvestre
O projeto foi idealizado em outubro do ano passado, quando advogada Alexssandra Alves, que também é integrante da pesquisa, convidou Rafael de Sousa e os professores Polyanni Dallara e Yunã Lurie para conhecer a área de reserva legal do sítio dela, no Sul de Roraima. A região tem 80% de área conservada.
Durante as investigações territoriais, os pesquisadores encontraram uma grande variedade de aves, como a arara-canindé, arara-vermelha e diversos primatas na copa das árvores, como o Macaco-de-cheiro. Também perceberam a presença dos felinos e de outros animais, como a anta.
Além disso, em um igarapé que banha a propriedade, encontraram arraias de água doce e outros tipos de peixes, além de jacarés e ariranhas. A ariranha é considerada a maior lontra do mundo e também está ameaçada de extinção.
“Diante desse cenário, ficamos em êxtase com tamanha diversidade da fauna e flora daquela região e surgiu a ideia da criação do ‘Roraima Silvestre'”, afirmou Rafael. O trabalho foi vinculado aos programas de pesquisa do IFRR neste ano.
Atualmente, a base de pesquisa é constituída tanto pela área de reserva legal do sítio de Alexssandra, quanto pela área do campus Novo Paraíso do IFRR, também localizado em Caracaraí, ambas conectadas a corredores ecológicos, permitindo o fluxo de animais silvestres entre diferentes áreas.
A equipe é formada por 14 profissionais das áreas de ciências agrárias, biológicas, educacionais e humanas, além de estudantes dos cursos técnicos integrados ao ensino médio e do curso superior em agronomia do Instituto.