Feliz Natal: conheça a história da cidade com origem nas festividades natalinas

O município mato-grossense ganha destaque pela sua forte ligação com a celebração do Natal. A origem peculiar do nome surgiu por conta de um riacho que transbordou durante a semana do Natal e dificultou o acesso entre as cidades do Mato Grosso.

Com a chegada do final do ano, surge o tempo de festa e confraternização entre os familiares. A celebração natalina é tradição há muitos anos e durante o festejo é comum desejar um ‘Feliz Natal’, simbolizando esperança, felicidade e amor.

Existem diversas histórias que explicam a origem dos festejos de Natal, principalmente relacionadas ao cristianismo. E dentre tantas curiosidades, existe uma inusitada: uma cidade chamada ‘Feliz Natal’, localizada no Mato Grosso, Estado que faz parte da Amazônia Legal. 

A cidade fica na área cercada pelo Rio Ferro e a origem do nome está relacionada a um riacho que transbordou durante a época natalina e acabou dificultando a locomoção entre cidades do Mato Grosso.

Para entender mais sobre a história desse município mato-grossense, o Portal Amazônia conversou com o historiador João Carlos Vicente, escritor do livro ‘Cidades do Mato Grosso – a Origem e Significados de Seus Nomes’, e com conversamos com Mauro Yamashita, filho de um dos moradores mais antigos da cidade. 

Foto: Ademir Junior/Prefeitura de Feliz Natal

O município Feliz Natal era uma região cercada por florestas e tinha como primeiros habitantes povos indígenas Xingu. No início de 1950, chegaram alguns imigrantes japoneses que se estabeleceram nos municípios de Mato Grosso em busca de terra fértil.

Por isso, os primeiros japoneses se estabeleceram nessas terras com o intuito de trabalhar com lavoura, escolhendo a região do rio Ferro, localizado nas proximidades de Feliz Natal. Os imigrantes estavam vivendo a derrota pós Segunda Guerra Mundial (1945) e em busca de uma nova vida, vieram morar no Brasil.

“A primeira leva desses imigrantes se estabeleceu através da empresa colonizadora CAPEM – Companhia Agropecuária Extrativa Mariópolis Ltda – , a partir de 1952, em área de 400 mil hectares. Apenas seis meses após estarem estabelecidos, a segunda leva de imigrantes chega em agosto de 1953, eram os colonos da Gleba Rio Ferro, que perfaziam 15 famílias. Não demorou muito e ocorreu uma terceira fase de vinda de colonos japoneses à região, desta feita na localidade de Ubiratan”, revelou o historiador João Carlos Vicente. 

Segundo o historiador, na época em que chegaram na região não existiam estradas, então utilizavam balsas para atravessar os rios e contavam com a ajuda de machados e marretas para abrirem o caminho. Eles se dedicaram à atividade agrícola e perceberam que a terra era ácida, sendo que a única semente que sobrevivia era o feijão guandu. Arroz e legumes não resistiram ao solo.

“A plantação de seringueira foi bem, mas para obter lucros com a colheita levava cerca de sete, oito anos para a primeira sangria e dez para ter retorno comercial. Experimentaram o plantio da pimenta do reino e conseguiram uma boa colheita, no entanto, devido à superprodução dos países asiáticos, ocorreu desvalorização do produto e um saco de pimenta do reino não valia mais nada. Ainda tinha o custo de levá-la até o porto de Santos, como não compensava, preferiram queimar”, comentou João.

Além de enfrentarem a distância, falta de perspectiva de desenvolvimento da região, as famílias também estavam sofrendo com a malária e alguns faleceram por conta da doença. Restaram poucos japoneses na cidade, sendo um deles Paulino Yamashita. 

Colônia japonesa em Feliz Natal. Foto: Paulino Yamashita/Cedida

Família Yamashita

A família Yamashita foi uma das pioneiras da região, acompanhada de diversos japoneses que enfrentavam o pós-guerra. Paulino Yamashita chegou em Mato Grosso em 1954, sendo um dos desbravadores a abrir as estradas e desenvolver a atividade agrícola na região antes inexplorada.

Ele vive há quase 70 anos na rodovia 225, em Rio Ferro, que passa por Feliz Natal, sendo considerado o único japonês que ainda vive lá desde a época do desbravamento das estradas com destino a Feliz Natal.

“O meu avô japonês veio para o Brasil na época da guerra e foi morar em São Paulo, um tempo depois meu pai nasceu em São Paulo. Eles tinham uma pequena área de 10 hectares. Foi quando apareceu um corretor de Cuiabá, oferecendo 100 alqueires de terra no Mato Grosso para o meu avô e alguns outros japoneses que moravam lá. Impressionado com a quantidade de terra oferecida, meu avô vendeu tudo, pegou sua família e veio para o Mato Grosso. Na época que chegaram em Mato Grosso, meu pai tinha 20 anos e estava solteiro”, relatou o filho de Paulino, Mauro Yamashita. 

Foto: Paulino Yamashita/

Com a distância entre as cidades, o único meio de transporte da família Yamashita era a bicicleta utilizada para pescar no Rio Teles Pires, em Sinop, cidade vizinha.

“Quando a família chegou em Mato Grosso, descobriram que não tinha nem estrada. Como eles já tinham vendido tudo e vieram com a mudança, não tinha mais como voltar, então resolveram encarar, fazendo estradas e pontos com destino a Rio Ferro. A minha mãe veio em uma caravana pouco tempo depois, entre 1956, foi quando meu pai conheceu ela na estrada próxima ao Rio Ferro. Nessa época já existia uma colônia japonesa bem formada. Meu pai e minha mãe se conheceram, casaram e tiveram oito filhos”, contou Mauro Yamashita ao Portal Amazônia. 

Feliz Natal

A origem do nome ‘Feliz Natal’ surgiu de forma inusitada durante expedições em busca de madeiras e terras férteis na floresta amazônica. Apesar de existirem diversas versões que contam a história da cidade e explicam o motivo da escolha do inusitado nome, existem duas que ganham destaque.

Conforme o historiador João Carlos, com base em dados da região, foram famílias vindas da região Sul do Brasil que batizaram a cidade. Mas também existe a versão das colônias japonesas, como os Yamashitas que saíram de São Paulo em direção ao Mato Grosso. 

Uma das histórias conta que funcionários da empresa Agropecuária Consul, que chegaram em 1978, vindos da região Sul, haviam enfrentado uma tempestade e estrada precária enquanto tentavam chegar à Sinop, para participarem dos festejos natalinos que aconteciam nessa cidade vizinha.

“Depois de alguns dias na estrada, quase intransitável, com poucos víveres, se depararam com um riacho transbordando. Era o entardecer do dia 24 de dezembro. No decorrer da noite choveu mais ainda, fato que não permitiu o prosseguimento da viagem. Conformados com a situação, saudosos dos familiares, e por ser véspera de Natal, saudaram-se mutuamente: ‘Feliz Natal, feliz Natal’. Não demorou e um dos integrantes da comitiva sugeriu que o nome do riacho fosse Feliz Natal, o que foi prontamente aceito pelos demais”,

explicou o historiador João Carlos.

Foto: Ademir Junior/Prefeitura de Feliz Natal

Assim, durante a travessia entre as cidades, o riacho Feliz Natal transbordou com as fortes chuvas na época festiva e, com isso, deu origem ao nome do município. A outra versão da história, explica que o japonês Nohama é quem havia enfrentado a dificuldade de travessia.

“Havia um japonês que tinha uma área em outra localidade. Esse japonês era bem de vida, então ele sempre fazia o trajeto de uma cidade a outra e em uma das suas viagens ficou atolado. Na época, as estradas eram muito ruins. O nome desse japonês é Nohama, também conhecido como Nohama San. Esse japonês plantava pimenta do reino e quando estava indo levar mantimentos até sua propriedade acabou ficando atolado, no dia do Natal, e assim surgiu o nome Feliz Natal”, declarou Mauro Yamashita.

Riacho que transbordou. Foto: Eli Cristina/

O município foi emancipado no dia 17 de novembro e seu aniversário é comemorado nesta data. Durante a época do Natal, a cidade é repleta de celebrações e decorações em homenagem ao nome que recebeu.

O Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) constatou que em 2020 a cidade de Feliz Natal estava entre os 100 municípios mais ricos do agronegócio brasileiro. O valor da produção do município nesse período foi de R$ 953,1 milhões, figurando como 67º lugar no ranking nacional do agro.

“A tendência na área da economia para o município é de crescimento ascendente, especialmente pelos fatos positivos que estão surgindo para o setor do agronegócio capitaneado pela melhoria de transporte, tanto rodoviário, quanto ferroviário”, ressaltou o especialista. 

Foto: Ademir Junior/Prefeitura de Feliz Natal

Povos indígenas em Feliz Natal 

A cidade Feliz Natal, assim como outras cidades que fazem parte da Amazônia Legal, possui ligação com os povos indígenas. Atualmente existem 13 aldeias distribuídas próximas ao município. Em Feliz Natal existe o Parque Indígena do Xingu, área povoada pelos Ikpeng. A área também é aberta e disponibilizada para visitações turísticas.

“Em 2013, o então prefeito da cidade, José Antônio Dubiella, liderou uma audiência pública com vistas aos bons resultados de convivência e de respaldo aos povos indígenas. Participaram vereadores, secretários municipais e uma comissão formada por cinco etnias indígenas: Ikpeng, Trumai, Kamaiura, Waura e Kawaiwete (Kayabi). Esses grupos de indígenas estão distribuídos entre 13 aldeias”, completou o historiador. 

Veja alguns registros de como a cidade se preparou este ano para as celebrações:

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