Museu de Guajará-Mirim está depredado. Foto: Auxiliadora Pinto
Por Júlio Olivar – julioolivar@hotmail.com
Rondônia enfrenta um problema que reforça a fama do Brasil como um país sem memória.
Atualmente, no interior do estado, apenas um museu está aberto à visitação pública: a Casa de Rondon, em Vilhena. Esse local abrigou um posto telegráfico entre 1911 e 1969, inaugurado pela Comissão Rondon.
Na verdade, não é o país que carece de memória, pois isso é algo inerente às pessoas. Todos têm suas memórias afetivas e, no fundo, a maioria reconhece o valor da preservação da história e da identidade coletiva. A falha é institucional.
A atividade museológica é multissetorial, englobando cultura e educação, que são as bases de toda sociedade. O problema é que nem sempre os gestores públicos se preocupam com seus museus, bibliotecas, centros de documentação, pinacotecas e outros espaços semelhantes.
A falha não está na sociedade, que não deve ser rotulada como “desmemoriada”. O problema reside naqueles que têm poder decisório e não priorizam esse segmento. Por quê? Talvez pela falta de educação patrimonial, começando pelos próprios gestores. Alguns deles podem nunca ter visitado um museu.
Até seis anos atrás, quatro museus funcionavam no interior. Agora, resta apenas o de Vilhena. A maioria era mantida pelo empenho e dedicação de historiadores, servidores públicos idealistas e agentes culturais. No entanto, como esses espaços não têm cargos efetivos, há uma “dança das cadeiras” a cada mudança de prefeito. E nem sempre quem assume a área de cultura por meio de portaria tem aptidão ou reconhece a importância da preservação memorialística.
O Museu Municipal de Guajará-Mirim, na fronteira do Brasil com a Bolívia, estava abrigado em uma antiga estação da Estrada de Ferro Madeira-Mamoré. Apesar de passar por uma ampla reforma há doze anos, por falta de manutenção, o espaço está entrando em ruínas e todo o acervo foi extraviado. Além do prédio depredado, uma locomotiva ao lado, que foi revitalizada pela TV Globo para a minissérie Mad Maria, de 2005, também está abandonada, sem qualquer cuidado.
Em Presidente Médici, funcionava o Museu da Arqueologia Regional, com cerca de 300 mil peças, algumas com até 7 mil anos, sendo um exemplo de zelo. Ultimamente, encontra-se fechado, sem explicações. A antiga diretora, a historiadora Maria Coimbra, é uma referência em Rondônia na área arqueológica, tendo desenvolvido pesquisas fundamentais em dezenas de sítios arqueológicos da região.
Vizinha à cidade de Médici, Ji-Paraná é a segunda maior do estado. O núcleo urbano surgiu praticamente em torno de um velho posto telegráfico criado pela Comissão Rondon, na década de 1910. No local, funcionou o Museu das Comunicações a partir dos anos 1980, contando com um excelente acervo de peças em cerâmica e líticas, além de fotografias que narram a história da região. Foi fechado para reforma há cerca de três anos, sem previsão de reabertura.
Bons exemplos
A Casa de Rondon é, simbolicamente, o marco zero da cidade de Vilhena, com 105 mil habitantes. A casa foi fundada como parte da expansão telegráfica que integrou o antigo oeste do Mato Grosso (atual Rondônia) ao restante do país.
Tombada em 2015 pelo Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional), a Casa de Rondon dispõe de um acervo de fotografias, filmes e artefatos domésticos do imóvel original, onde vivia a Família Zonoecê, que administrou o antigo posto telegráfico de 1943 a 1969.
O ponto histórico passou por reforma em 2016, com recursos do Ministério do Turismo. Estava fechado desde 1996. Em 2024, foi reaberto graças a uma parceria entre uma cooperativa de crédito e a prefeitura.
A visitação pública ocorre diariamente, mediante agendamento na Secretaria Municipal de Indústria, Comércio e Turismo. Várias escolas frequentam a Casa de Rondon para entenderem melhor como se deu a ocupação do Planalto dos Parecis e a importância histórica das campanhas militares lideradas por Cândido Rondon no início do século passado.
Na capital, Porto Velho, funcionam importantes instituições que salvaguardam a história local: Museu do Complexo da Estrada de Ferro Madeira-Mamoré, Memorial Rondon, Memorial Governador Jorge Teixeira, Museu da Memória (antigo Palácio Presidente Vargas) e Museu Internacional do Presépio.
Sobre o autor
Júlio Olivar é jornalista e escritor, mora em Rondônia, tem livros publicados nos campos da biografia, história e poesia. É membro da Academia Rondoniense de Letras. Apaixonado pela Amazônia e pela memória nacional.
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