Na Semana Mundial do Meio Ambiente, uma homenagem a mulher que dedicou sua vida aos pássaros

Cientista Emilie era alemã e catalogou 1.117 aves da Amazônia; foi sepultada em Porto Velho.

A alemã Emilie Snethlage era conhecida entre os caboclos da Amazônia como “Doutora Senhorinha”. Junto deles, a ornitóloga protagonizou verdadeiras aventuras para elaborar suas preciosas e inéditas expedições científicas, ocorridas a partir de 1905 até sua morte, em 1929. Um dos resultados de seu trabalho foi o Catálogo das Aves Amazônicas, com 1117 registros, publicado em 1914.

Filha de pastor luterano e órfã de mãe desde os quatro anos, Emilie foi educada em casa pelo pai, trabalhou durante muito tempo como governanta e já contava 32 anos quando decidiu estudar História na Universidade de Berlim. Tornou-se uma das primeiras mulheres a concluir o doutorado em toda a Alemanha.

Emilie foi membro da Academia Brasileira de Ciências. Foto: Arquivo público de Rondônia

Foi convidada a vir para o Brasil pelo naturalista suíço-alemão Emílio Goeldi, que vivia em nosso país desde 1880; ele atuou nos museus Nacional do Rio de Janeiro e Paraense — que leva seu nome — e manifestou profundo respeito ao trabalho de Emilie, que lhe foi recomendada pelo professor Anton Reichenow.

Além dos estudos acerca das aves da América do Sul, a cientista atuou em outras áreas, como a etnografia. Em 1909, ela percorreu a pé entre os rios Xingu e Tapajós, tendo indígenas como guias. A expedição teve muita repercussão na comunidade científica europeia.

De 1914 a 1922, Emilie foi diretora do museu sediado em Belém, no Pará, e, mais uma vez pioneira, foi das primeiras servidoras públicas atuantes no Brasil, e ainda ocupando cargo diretivo. E dali do Pará conduziu várias expedições, tornando-se reconhecida internacionalmente. Percorreu estados de todas as regiões brasileiras, além do Uruguai e Argentina, imbuída de suas atividades como pesquisadora genuína.

Os espécimes coletados por ela fazem parte de acervos de diversos museus mundo afora; ela teve 40 artigos publicados em revistas científicas e foi a primeira mulher membro da Academia Brasileira de Ciências. 

O embaixador da Alemanha Georg Witsche ao lado do busto de Emilie – Foto: JotaÓ

Morte em Porto Velho 

Doutora Emilie morreu aos 61 anos, em 1929, em um hotel em Porto Velho. Foi vítima de ataque cardíaco. Não se casou e não deixou filhos. Dedicou toda sua vida à ciência que ela abraçou com desvelo e competência singulares.

A cientista foi enterrada no Cemitério dos Inocentes; infelizmente a cruz e o local exato de sua cova acabaram desaparecendo, mas ainda é tempo de que se ergam um monumento a ela no local.

Nesta Semana do Meio Ambiente lembro-me da personagem pouco citada na História de Rondônia. Não há denominação de logradouros públicos, nem biografia, nem nada que a homenageia. Nem a cruz de ferro fundido que pertenceu à sua cova foi mantida e respeitada como marco de sua passagem por Porto Velho. Mas, um pássaro da Amazônia, o Tiriba-do-Madeira, tem seu nome científico Pyrrhura snethlageae em alusão a Emilie. Acho que ela ficaria feliz com tamanha deferência.

O busto instalado no Memorial Rondon, em Porto Velho – Foto: Divulgação

Arrogância não permitiu que busto fosse colocado no lugar certo 

Eu queria ter colocado o busto que mandei fazer — às minhas custas — em homenagem a Emilie na praça em frente o Palácio Rio Madeira, sede do Governo do Estado.

Assim, o busto teria mais visibilidade e as crianças, sobretudo, poderiam ter acesso e interesse ao trabalho científico e a biografia da cientista; é importante salientar que, em pleno 2021, mulheres e ciências continuam subjugadas e menos empoderadas do que deveriam ser.

O busto teria tudo a ver até com o nome do palácio, considerando que o último trabalho da cientista na região de Porto Velho ocorreu justamente no Vale do Rio Madeira. Agregaria valor histórico-cultural à sede do governo. Mas, à época, o fogo amigo, a perseguição ao meu trabalho e a ignorância de alguns “palacianos” não permitiram a instalação do objeto, preferindo colocar no jardim uma onça de fibra de vidro e gosto duvidoso.

Tiriba-do-Madeira, seu nome científico homenageia Emilie – Foto: Valdir Hobus

Mas, instalei a imagem no espaço do Memorial Rondon, que era por mim e minha equipe dirigido. E espero que esteja sendo bem cuidado. Ao local, levei diversos historiadores, biólogos e até o embaixador da Alemanha, Georg Witsche, que, pasmem, pouco conhecia sobre sua ilustre compatriota e ficou admirado acerca de sua trajetória que caberia num bom roteiro cinematográfico. 

Às ordens em minhas redes sociais e no e-mail: julioolivar@hotmail.com // Todas às segundas-feiras no ar na Rádio CBN Amazônia, às 13h20.

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