Ex-ministro da Agricultura diz que Amazônia tem 25 milhões de pessoas passando fome

Segundo Alysson Paolinelli, a Amazônia tem 25 milhões de pessoas famintas e o mais baixo Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) do país.

Falando sobre a preservação da Amazônia e a necessidade de viabilizar o manejo florestal — prática que, aliás, já existe — Alysson Paolinelli deu uma entrevista ontem (29/11) ao jornal ‘O Estado de São Paulo’ falando um absurdo sem precedentes. Segundo ele, a Amazônia tem 25 milhões de pessoas famintas e o mais baixo IDH (Índice de Desenvolvimento Humano) do país.

Os dados do ex-ministro da Agricultura não batem. Primeiro: a Amazônia Legal tem Estados cujo IDH está pouco abaixo da média nacional e acima de boa parte dos demais Estados. Outra: a Amazônia teria 90% de sua população passando fome, se fossem considerados os números errados apresentados por Alysson.

Não se pode confundir a Amazônia — que representa mais da metade do território brasileiro — com localidades isoladas no Pará e do Maranhão (Estado do Nordeste que também compõe a Amazônia Legal) e nem acreditar que os Estados da Região Norte vivem de extrativismo e de “ajudas” do governo.

Melgaço, uma cidade de 28 mil habitantes no Arquipélago do Marajó (PA) tem o pior IDH brasileiro. Mas isso não reflete a realidade como um todo. Nem em Melgaço e nem em outro lugar do país há tanta gente miserável como nos níveis citados aleatoriamente pelo ex-ministro.

Alysson Paolinelli. Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil

Na maioria, os municípios do Norte e Centro-Oeste têm IDH alto, entre 0,700 e 0,799. Alguns polos são riquíssimos, como as regiões Tocantins, Norte do Mato Grosso e Sul de Rondônia, que estão entre os maiores produtores de soja, de algodão, de milho e de carne bovina do país; têm setores de comércio, indústria e serviços pujantes. Embora ainda enfrentem problemas de infraestrutura decorrentes da ausência do Estado.

Em Rondônia, por exemplo, apenas nove (todos pequenos) dos 52 municípios têm IDH baixo (e não muito baixo ou à margem da pobreza, como afirma erroneamente o ex-ministro). Ocupando boa posição no ranking do IDH nacional, o Estado rondoniense está bem acima (14º colocado: 0,756) de muitos outros industrializados e com apelo turístico, a exemplo da Bahia (19° lugar: 0,742). Rondônia — com apenas 40 anos como Estado autônomo — está apenas três casas abaixo de Minas Gerais (9º lugar: 0,731), com seus 301 anos. O ex-ministro Paolinelli é mineiro.

Não que seja vantagem a situação de nenhum ente federado. Afinal, todos sabem que o subdesenvolvimento não é particularidade de algum estado brasileiro. Na realidade, o Brasil é bem atrasado nos investimentos sociais que pesam na hora de medir o IDH, que compara indicadores de países em itens como expectativa de vida, alfabetização, educação, saúde, entre outros, com o intuito de avaliar o bem-estar de uma população.

O Brasil está em 84º lugar entre todos os 193 países e tem apenas três unidades federativas com IDH considerado “muito alto”: Distrito Federal, São Paulo e Santa Catarina. Nos demais, o IDH global é compatível um em relação ao outro, variando apenas de município para município. Há localidades muito ricas e muito pobres em todos as regiões brasileiras, marcadas pelas injustiças sociais, corrupção e má distribuição de renda.

Números amazonenses

A Amazônia Legal concentra nove estados do Centro-Oeste, do Norte e do Nordeste, ou seja, mais da metade (58,9%) do território nacional. A população local aumentou de 8,2 milhões em 1972 para 28,1 milhões de habitantes em 2020, o que representa 13% da população brasileira. A densidade demográfica na região é ainda baixa: 5,6 habitantes por km².

Se fosse verdade a afirmativa absurda de Alysson — publicada pelo jornal ‘O Estado de São Paulo’, que não o contestou — de que próximo da totalidade da população do Norte está passando fome, isso seria o mesmo que dizer que foi em vão e fracassou a ocupação sistemática da região sob o incentivo — inclusive — do ex-ministro. De nada teria servido a exploração da agricultura na região, além de trazer danos ao meio ambiente. Mas não é bem assim.

O contestado agronegócio na Amazônia elevou o Brasil a outro patamar na economia global, embora seja atacado pelo uso de agrotóxicos, a conversão de florestas para desmatamento e avanços sobre área de reserva legal. Seja como for, a ação política de Paolinelli não condiz com a fala de Paolinelli.

Paolinelli em Porto Velho

Nestas quarta e quinta-feira (1º e 2 de dezembro) ocorrerá em um hotel em Porto Velho, capital de Rondônia, o evento ‘Wake Up Call – Um Novo Olhar Sobre a Amazônia’, promoção do Sebrae com o apoio de entidades ligadas ao agronegócio, a exemplo da Cargill e do Sicoob.

Alysson Paolinelli estará presente. Ministro da Agricultura (1974/79) na época dos militares no poder, foi ele o grande incentivador do desenvolvimento da agricultura nas regiões de Cerrado. Sob sua gestão, houve grande fluxo migratório do Sul para no Norte do Brasil, para ocupação do Centro-Oeste e da Floresta Amazônica, em meio à qual está também o bioma de Cerrado e nascentes de alguma dos principais rios brasileiros.

Quem é

Engenheiro agrônomo, 85 anos de idade, Paolinelli foi ministro da agricultura, secretário de Estado da mesma pasta em Minas Gerais, além de ter cumprido um mandato de deputado federal constituinte (pelo antigo PFL, atual DEM). Foi, ainda, presidente do extinto BEMGE (Banco do Estado de Minas Gerais) e presidente da Confederação Nacional da Agricultura (CNA). Em 2006, Alysson ganhou o prêmio World Food Prize por sua atuação. Chegou a ser indicado ao Prêmio Nobel da Paz em 2021. 

*O conteúdo de responsabilidade do colunista  

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